sábado, 30 de setembro de 2006

Deix'eu dar uma de exibido e gabarola: ó eu aqui no Melhores Redações da Fuvest do ano passado... Sô fraco não! E o Fabrício, gatilho mais rápido do Oeste, já pôs na seção Memória da Dying Days o texto comemorativo aos 15 anos de Nevermind (prolixo pra caralho e q provavelmente ngm teve saco pra ler inteiro...). Próxima promessa: umas 15 páginas de pagação de pau pesada pra cima do One Beat do Sleater-Kinney, o DISCO DA DÉCADA, na série DISCOS DA MINHA VIDA. Logo logo.

terça-feira, 26 de setembro de 2006


[1]


É difícil pra mim, quase impossível, falar sobre Nevermind, Nirvana e Kurt Cobain com a tal da imparcialidade jornalística, com uma racionalidade toda fria, me atendo somente aos fatos: esse é daqueles discos com os quais muitos de nós, eu inclusive, tem uma ligação totalmente passional e fanática, um elo afetivo muito forte, que impede de saída qualquer “frieza” e que exige um texto exaltado, com o termômetro da subjetividade batendo no topo... Porque, vocês sabem, esse é daqueles discos que, para muitos e muitos, se torna muito mais do que um disco: é uma parte de nossas vidas, um xerox de nossas almas, um espelho de nossos sentimentos. Mas isso é um lance que só entende quem também é fã...

Num levo na esportiva quem se meta a falar mal do Nirvana – é o mesmo que xingar minha mãe, mexer no meu vespeiro, me cutucar com vara curta; perco a compostura, tá!? (UI!) Sou daqueles que tem vontade de tirar todos os crucifixos da parede (quem precisa de Jesus quando tem Cobain?!) e colocar no lugar um pôster enorme com aquela capa clássica, o menininho pelado, debaixo d’água, sendo fisgado por uma nota de dólar. E eu adoraria ver o hino nacional americado substituído por “Smells Like Teen Spirit”.

Em setembro de 1991, quando Nevermind saía do forno, eu estava com sete aninhos de idade recém-completados e não tinha a mínima idéia de quem era Kurt Cobain, Nirvana e Seattle. Meu “conhecimento” musical provavelmente se restringia somente àquelas trilhas sonoras toscas da infância – do Balão Mágico, do Carrossel e dos Cavaleiros do Zodíaco, provavelmente - só coisa fina. Quando comecei a ouvir Nirvana, Kurt já era pó e metade dos críticos de rock do mundo esperavam ansiosamente pela chegada de um disco ou banda de impacto semelhante. Que nunca veio. Até hoje.

15 anos atrás esse terremoto chamado Nevermind despencou nas lojas de discos fazendo um estrago extremo. Era pra ser o somente 1o álbum lançado por uma grande gravadora (a Geffen) de uma obscura banda da região de Seattle, que antes havia gravado apenas um disco (o tosco Bleach, de 1989, gravado por uma merreca e lançado pela Sub Pop sem muita repercussão). Previsão de vendas: 50 mil cópias...

Hoje já sabemos bem o tamanho do impacto que esse disco causou: o que a bomba de Hiroshima foi para o Japão e o tsunami foi para a Indonésia, Nevermind foi para a história do rock nos anos 90 e o clipe de “Smells Like Teen Spirit” foi para a MTV de 1991. Esse foi o disco que mudou tudo, que redefiniu todo o cenário, que varreu do mapa muito lixo (e nos salvou de pestes tenebrosas como Michael Jackson, Bon Jovi, Axl Rose e toda a “cena hair metal” [aquilo dava M E D O !]) e que deixou a maior das cicatrizes na carne do rock durante a década de 90... Nevermind foi uma porra dum fenômeno sociológico!

Claro, Nevermind, antes de mais nada, foi, é e sempre será um baita dum disco de punk rock, empolgante, energético, catártico, daqueles que você curte de cabo a rabo, música a música, verso a verso, cantando junto cada refrão, sentindo calafrios a cada berro... Não é à toa que o lado A inteirinho seja composto por hits que tocaram até cansar: “Smells Like Teen Spirit”, “In Bloom”, “Come As You Are”, “Lithium” e “Polly”. O “lado B”, onde se concentram as músicas que não estouraram, tem pelo menos a virtude fenomenal de manter o disco no mesmo nível de excitação e empolgação – e não são poucas as pessoas que, hoje em dia, ouvem Nevermind só a partir da faixa 7, acompanhando mais uma sequência matadora de grandes hinos grunge-punk: “Territorial Pissings”, “Drain You”, “Lounge Act”, “Stay Away”, “On A Plain e “Something In The Way”.

Desde Rocket To Russia, Nevermind The Bollocks ou Back in Black não surgia um álbum de rock tão explosivo, coeso, revolucionário e bom do começo ao fim. Era ao mesmo tempo headbangável e pogável, capaz de agradar igualmente a fãs de punk rock, heavy metal e rock alternativo, e que foi também um dos raros casos em que a crítica e o público cantaram elogios juntos. Difícil ver uma banda que, mesmo tendo vendido umas 15 milhões de cópias de seu disco mais famoso, conseguiu ainda tê-lo elegido como álbum da década (qualitativamente falando) por uma série de renomadas publicações, incluindo a Bizz brasileira e a SPIN inglesa, só pra ficar com dois pesos-pesados.

Acho exagero dizer que o grunge nunca teria existido sem Nevermind – o Pearl Jam, o Soundgarden, o Alice in Chains, o Mudhoney e o Screaming Trees eram bandas boas demais para que não tivessem conseguido se destacar e se sobressair mesmo sem a mão-na-roda que foi a explosão fenomenal do Nirvana. É quase certo que Seattle, com ou sem a fama imensa conquistada pelo segundo álbum de Kurt, Krist e Dave, teria se tornado o epicentro do mundo pop no começo dos anos 90. Com uma concentração tão densa de boas bandas, lugares bacana pra tocar e revolucionários projetos de gravadoras independentes (viva Sub Pop!), Seattle estava condenada, para o bem ou para o mal, a se tornar o foco de atenção supremo no começo dos anos 90.

Com uma série de discos clássicos saindo um depois do outro (Badmotorfinger, Facelift, Ten, Sweet Oblivion, Temple Of The Dog, Superfuzz Bigmuff...), Nevermind foi só o catalizador do processo, o grito de alerta que atravessou oceanos e puxou todos os olhares do mundo para aquela região do Noroeste americano que, de uma hora pra outra, tornou-se o canto mais cool e vigiado do planeta, enquanto o clipe de “Smells Like Teen Spirit” bombava na MTV e se tornava um dos maiores fenômenos da história da emissora. Jimi Hendrix também era um cidadão nato de Seattle, mas nunca antes na história a cidade tinha conhecido tamanha efervescência musical e tanta atenção dada a ela pela imprensa mundial – o que foi muito bem detalhado no documentário Hype!, de Doug Pray, lançado no Brasil pela Bizz.

O Nirvana certamente não era uma banda de excelentes músicos... Dave Grohl com certeza era um baterista fenomenalmente poderoso, mas Kurt e Krist Novoselic, os dois vindos da escola do punk rock e do indie tosco, tinham aprendido só o basicão do basicão e estavam cagando e andando pra papos de conservatório musical. E é claro que sempre vão existir aqueles caras chatérrimos, defensores de um rock mais progressivo e sofisticado, que descerão lenha em cima do Nirvana só porque todas as músicas são socação de power chords mergulhados em distorção máxima e porque Kurt “não sabia cantar”. Não vou ficar aqui respondendo aos críticos do Nirvana e tentando argumentar racionalmente que Nevermind, In Utero, Unplugged In New York e todo o resto prestam sim. Eu realmente preciso explicar com palavras por que esse diabo de disco é tão fudidamente bom? Não sei, mas acho que as minhas palavras seriam baboseira frente à música... Quem entende, entende. Quem sente, sente.

* * * * * * *

[2] - MEU KURT É ASSIM...

Mas quem era Kurt Cobain? Poucas coisas me deixam mais puto (e olha que eu sou um cara sussa...) do que os desafetos do Nirvana colocando qualquer rótulo fácil numa pessoa tão complexa, tão ambígua e tão difícil de entender, dizendo que o cara era só um “deprimido”, só um “junkie”, ou qualquer outra etiqueta parecida. Como se fosse possível esgotar o que foi uma vida através de uma palavra, um conceito, um estereótipo... Vale mais o esforço pra tentar conhecer o homem por trás da arte, o que não é nada fácil quando se trata de Cobain. “Mesmo aqueles que o conheciam melhor achavam que quase não o conheciam”, diz Charles Cross no Mais Pesado Que o Céu, e Kurt realmente não se esforçava muito em elucidar o mistério que muitos de nós, fãs, tentamos desvendar: mas quem é esse tal de Kurt Cobain, de verdade?

Eu tenho um Kurt Cobain pessoal, o Kurt Cobain como eu imagino que ele foi, construído depois de todas as biografias, resenhas, matérias e entrevistas que vi - e vou tentar pintar um “retrato” aqui... Alguns podem achar que é delírio de fã ou que tô forçando a barra, mas eu confesso: me acho muito parecido com Kurt, em personalidade, em visão de mundo, em sentimentos sentidos – o que é também normal: porque a gente só se torna fã daqueles que consegue entender e se identificar.

Lembro de ter lido certas frases de Kurt, reunidas no livro Odeio-me e Quero Morrer (que foi publicado só em Portugal), e achar que eram coisas que eu gostaria de ter dito e que descreviam perfeitamente a minha própria vida. Por exemplo essa: "nas minhas composições, há sempre um profundo dualismo: na minha vida, como nas minhas canções, metade das vezes sou um incurável niilista e na outra metade reconheço-me sincero e vulnerável." E o meu Kurt é assim, meu soulbrother, oscilando entre o niilismo mais brutal (esse mundo é uma merda! Deus está morto! Viver não vale a pena! Ninguém nos ama!) e a vulnerabilidade e a honestidade mais doce e mais desarmada (como se pode ver em certos momentos do Acústico MTV, aquela paz, aquela serenidade...)

Kurt, o meu Kurt, é aquele garotinho que ficou traumatizado e ferido desde a infância porque teve que enfrentar o divórcio dos pais ainda cedo e ficou sendo passado de parente pra parente, feito batata quente, sem ser verdadeiramente querido por ninguém. O divórcio dos pais de Kurt, segundo o Mais Pesado Que o Céu, “era uma guerra, cheia do ódio, despeito e vingança”, algo muito parecido com “uma rixa sangrenta”. Esse processo, segundo Cross, equivaleu a um “holocausto emocional” para o pequeno Kurt e “nenhum outro evento isolado em sua vida teve mais efeito na conformação de sua personalidade” .

Kurt nasceu e cresceu numa cidade pequena, Aberdeen, perto de Seattle, um lugarzinho aparentemente trash, tosco e ultra-tedioso. Segundo a descrição de Cross, a população estava em declínio por causa da emigração causada pelo desemprego; as taxas de alcoolismo, violência doméstica e suicídios aumentavam vertiginosamente; pipocavam prostíbulos baratos e botecos proletários. Aberdeen, segundo uma das revistas Look de 1952, era “um dos pontos quentes na batalha americana contra o pecado” (haha!). Não exatamente o habitat mais adequado pra que florescesse uma criança sadia e feliz...

Kurt, o meu Kurt, era aquele tipo de moleque que, na escola, ficava de cabeça baixa durante todas as aulas, entediado até num poder mais, se entretendo com fantasias sangrentas onde o professor era enforcado no poste ou explodia como uma bomba relógio... Ficava só rabiscando porcaria na carteira, perfurando a borracha com a lapiseira ou fazendo desenhos macabros e bizarros nas folhas do caderno. Estudar pra quê, aliás? Pra entrar na faculdade, arranjar emprego, constituir família, ficar velho e depois morrer, todo enrugado e ressecado e de cabelos brancos? Kurt era o cara que não via sentido nisso tudo.

Era também o garotinho retraído, introspectivo, que falava pouco, que nunca ia ser a estrelinha da turma, o quarterback pra quem as cheerleaders pagavam pau, o CDF que os professores adulavam... Acostumado às sombras, não era nem admirado nem zoado, nem bonito nem feio, o tipo de pessoa que não fede nem cheira. Não era o ódio do mundo o que ele tinha que suportar: era só a indiferença. Não era de falar muito, e provavelmente olhava com raiva para todas as pessoas que tagarelavam tanto sem ter nada a dizer. Gostava de ficar sozinho no quarto, soltando sua raiva reprimida nas páginas de seu diário (“um dispositivo terapêutico obsessivo-compulsivo pelo qual ele conseguia soltar seus mais íntimos pensamentos”, segundo Cross), expressando todos os seus sentimentos vagos com seus desenhos, desabafando através da arte, destilando seus demônios....

Kurt era o cara que, sensível demais aos horrores do mundo, não podia evitar colocar em dúvida a existência de um Deus bondoso e toda a ladainha religiosa que nos enfiam cabeça a dentro. “A maioria das discussões religiosas entre os dois [Kurt e sua amiga Tracy] era sobre se Deus poderia existir num mundo cheio de tanto horror”, conta o Mais Pesado Que o Céu, “com Kurt assumindo a posição de que Satã era mais forte.”

E, claro, Kurt era o tipo de jovem que odiava tudo, principalmente a si mesmo, claro, mas toda sua vida, sua escola, sua família (ou a falta dela), o mundo em geral, e que queria enfiar em seu organismo qualquer substância química que fizesse esse ódio, essa dor e essa angústia sumirem, ao menos por um tempo. Certamente não era coisa agradável ter um relacionamento com Kurt Cobain: “manter uma relação íntima com ele significava viver em um mundo de escapismo saturado de opiatos”, sugere Charles R. Cross, referendado por seus companheiros de banda. “Ele estava realmente afim de ficar chapado: drogas, ácido, todo tipo de droga. Ele ficava chapadão na metade do dia. Era um pirado.”, disse o baixista Krist Novoselic.

E Kurt, claro, não conseguia suportar nada que se parecesse com o mundo da alta sociedade, da alta cultura, do entretenimento de massas... Vejam o que diz o biógrafo: “...nunca tinha havido um astro do rock como Kurt Cobain. Ele era mais um antiastro do que uma celebridade, recusando-se a entrar numa limusine para ir à NBC e conferindo uma sensibilidade frugal a tudo o que fazia. Apresentou-se no Saturday Night Live com as mesmas roupas que vestia nos dois dias anteriores... Nunca antes na história da televisão ao vivo um artista havia dedicado tão pouco cuidado à sua aparência ou higiene, ou assim parecia.” Ele era tipo um vira-latas pulguento que se negava a seguir à risca a postura kitsch que é exigida pela máquina da mídia – vestir-se com roupas de marca, passar duas horas no cabeleireiro, submeter-se à maquiagem, esconder todos os seus podres. Queria inserir-se no meio da assepsia reinante como um detrito sujo que não aceitava ser limpo ou empurrado pra baixo do tapete.

Kurt era também o infinitamente sarcástico, aquele que não conseguia levar a sério nada do que as pessoas sérias levam a sério, aquele que sempre acharia ridículo e absurdo vestir um terno, trabalhar num escritório e ir pro shopping center nos fins-de-semana. Queria libertar a criança idiota e perversa que tinha dentro de si – e não são poucas as idiotices, maluquices, diabruras e gracinhas de mau-gosto registradas sobre ele, sempre louco para ofender, chocar e demolir os clichês...

E Kurt, o meu Kurt, como eu o imagino, foi o garoto que viveu até o fundo o Sonho do Rock and Roll, que imaginou-se maravilhosamente vingado de todos os que o desprezaram e ignoraram, que teve inúmeras fantasias sobre a imensa felicidade que sentiria quando estivesse lá, na frente de uma platéia imensa, no topo das paradas, finalmente amado e querido pelas multidões... E que descobriu, amargamente, que nada disso curou sua angústia e sua solidão. Que descobriu que o preço a pagar por chegar no topo é a queda. Que descobriu que o mal-estar permanecia lá – e as drogas, mais necessárias e indispensáveis do que nunca. Que descobriu que a fama não salva ninguém. E talvez seus últimos dias tenham realmente sido tão desoladores quanto Gus Van Sant sugeriu em seu filme Last Days, aquele labirinto asfixiante de sofrimento silencioso...

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[3] - ME ODEIO E QUERO MORRER!


Hoje, sabendo do que sabemos sobre o final do filme da vida de Cobain, já olhamos pra Nevermind com um perpectiva diferente daquela que o mundo voltou para o disco na época de seu lançamento. Em 1991, Nevermind foi um fenômeno de vendas, um disco-maremoto, um “criador de estilo”, um dos discos de rock mais excitantes e originais a serem lançados em muitos anos - e que prometia revolucionar o rock de uma maneira que só encontra similar no Ramones ou no Nevermind The Bollocks dos Sex Pistols, dos longínquos ano de 1976/1977. Hoje já olhamos para trás sabendo da iminência do desastre, com os olhos de quem já sabe do desfecho trágico do destino de Kurt Cobain, e podemos enxergar nesse disco de rock, aparentemente tão energético e afirmativo, alguns prenúncios do que viria a acontecer em 1994. O In Utero, para muitos o melhor disco do Nirvana (não me perguntem: eu não consigo escolher!), já deixa ainda mais explícita a desagragação emocional de Kurt, a depressão, a agonia (por exemplo no niilismo sônico extremo de “Tourettes” ou “Milk It” – é como se a gente ouvisse o cara deslizando pro abismo...

Sempre achei extremamente fascinante todo esse lance do suicídio de Kurt Cobain. Todos os suicidas, na verdade, exercem em mim um certo fascínio, despertam a minha curiosidade até o limite, até que eu fique louco pra descobrir mais sobre suas vidas, tentando elucidar o mistério: o que foi que os levou a uma atitude tão extrema, tão “foda-se tudo”? Claro: as fantasias suicidas nunca me foram estranhas e já pensei em morrer pelo menos umas 500 vezes nessa vida. E sempre achei mais fácil entender os que se matam do que aqueles que dizem que a vida é um playground todo feito de felicidade, compreensão e paz. Saber que um certo artista se matou sempre me pareceu uma ótima razão para conhecer o seu trabalho, como se isso fosse uma garantia de que a arte produzida por ela era realmente séria, verdadeira, genuína. Acho que eu nunca teria lido Sylvia Plath, Ernest Hewingway ou Virginia Woolf sem que soubesse do pequeno detalhe biográfico instigante: eram suicidas.

No caso de Kurt Cobain, ou no de Ian Curtis, saber que eles se suicidaram sempre me pareceu uma prova incontestável de que a angústia que eles sendimentaram em suas canções era genuína. Ora, Kurt Cobain se matou! Então está provado: aquela raiva que ele soltava aos berros em suas músicas, aquela angústia que saturava tudo o que ele criava, aquele mal-estar profundo que ele parecia sentir no fundo da alma, não eram fingimento... o cara era mesmo irado, era mesmo angustiado, era mesmo super-povoado de demônios que precisava exorcizar através de sua arte. Ele num tava de brincadeira.

Mas o suicídio de Kurt Cobain, dentre todos os suicídios que conheço e ouvi falar, é o que mais me fascina. Porra, esse cara tinha tudo para amar a vida que tinha conquistado! Ainda jovem, já tinha se tornado um dos maiores rock-stars do planeta, cultuado por grande parte da juventude universal, incensado pela crítica, podendo conhecer todos os seus ídolos pessoalmente, de William Burroughs aos caras do Sonic Youth... Estava casado com uma mulher que aparentemente amava, e que era fodida e anormal o bastante para entender a fodição e anormalidade dele, e que entendia bem toda a ética e todo o estilo de vida do punk rock... Tinha uma filhinha recém-nascida, uma mansão, a conta bancária recheada de dólares... E mesmo assim, estranhamente, Kurt Cobain, aos 27 anos de idade, mesma idade em que morreram Hendrix, Janis e Jim Morrison, tinha escolhido a morte. Ele parecia ter tudo, e tinha escolhido dizer aos milhões que o idolatavam que a vida não vale a pena...

Foi uma das poucas vezes em que o niilismo venceu e proclamou sua “mensagem” para as multidões. Mais Pesado Que o Céu, a excelente biografia de Charles R. Cross, jornalista da Rolling Stone, é um dos livros mais tristes, asfixiantes e trágicos que eu já li. Tem hora que parece com um tenebroso romance ao estilo de William Burroughs ou Hubert Selby Jr. (o autor de Réquiem Para Um Sonho), retratando a fatal peregrinação de um junkie terminal por um inferno na terra, entrando e saindo de clínicas de reabilitação, lidando mal com sérios problemas de saúde (principalmente estomacais), enredado uma depressão e numa falta de perspectivas completamente sem solução...

A gente pode inventar mil e uma histórias sobre esse suicídio, desde as mais maçantes e complexas averiguações sobre, sei lá, “os efeitos corruptores da Fama”, até as mais mirabolantes teorias conspiratórias imputando a terceiros, por exemplo à Courtney Love, a culpa pelo ocorrido (como fez o filme Kurt & Courtney). Mas qualquer um que vá atrás da história de vida de Kurt Cobain sabe que seu suicídio pode ter sido qualquer coisa menos uma surpresa: ele o anunciou e o ameaçou aos brados por anos e anos, repetidas vezes, disfarçadamente pedindo por ajuda, fazendo a velha chantagem emocional que fazem todos os suicidas...

Em inumeráveis entrevistas Kurt tocou no tema do suicídio e fez o elogio empolgado da auto-destruição e da morte na juventude. Kurt Cobain era o tipo de cara que poderia ter feito uma tatuagem enorme na testa com os ditos LIVE FAST, DIE YOUNG, de tão fanático que era por esse slogan. Esse é o cara que dizia, sarcástico, que “queria morrer antes de se tornar Pete Townshend”, zoando o líder do The Who por ter podido escrever em “My Generation” um verso como “I hope I die before I get old” e depois ter ousado sobreviver até a velhice... Crime imperdoável!

Esse é o cara que dizia com toda a convicção do mundo: “nunca vou chegar aos trinta. Você sabe como é a vida depois dos trinta – eu não quero isso.” Esse é o cara que pensou em entitular o álbum sucessor de Nevermind como I Hate Myself And I Want To Die, só muito depois renomeado In Utero. Esse é o cara que tinha combinado com a esposa que, caso eles perdessem a filha, iriam cometer um suicídio duplo. E, é claro, esse é o garoto que por toda a sua vida tinha tomado porres homéricos e usado todas as drogas possíveis e imagináveis, em quantias sempre exageradas, tentando esquecer do seu sofrimento na embriaguez dos tóxicos... O comportamento auto-destrutivo sempre foi um componente básico da personalidade de Kurt Cobain e o seu suicídio foi quase uma conclusão “natural” da sua vida...

Mas o triste é saber que ele berrou de dor, em público, por anos e anos, e que essa sinfonia de berros, gemidos e choros, gravado em discos que milhões possuíram, visto em clipes que milhões assistiram, não foi o bastante para salvar sua vida. É incrível: todo mundo sabia que Kurt estava triste, perdido, confuso, infeliz, magoado e com vontade de morrer. E, cacete, não havia ninguém ao redor do cara que pudesse salvá-lo?! Onde estavam as pessoas que o amavam, que se importavam com ele, que o queriam livre do seu sofrimento e do seu vício? É uma das coisas mais tristes pensar que ninguém pôde impedir que Kurt concretizasse um suicídio anunciado dúzias de vezes - talvez porque fingiram que a coisa não estava tão preta, talvez por não terem se importado, talvez pois nunca realmente o conheceram... Ou talvez por que simplesmente não sabiam o que fazer?

Depois de uma insistência maníaca e várias e várias tentativas frustradas, Kurt, naquele trágico 5 de abril de 1994, finalmente fez tudo certo para conseguir morrer. Tomou uma quantidade de heroína estupidamente alta, capaz de matá-lo de overdose, fácil fácil, e só teve alguns segundos para disparar um tiro contra a cabeça antes que a droga o fizesse capotar... Mesmo que não tivesse atirado, garantem os especialistas, teria morrido do mesmo jeito. Naquele dia, cauteloso e metódico como um assassino que não deseja falhar de modo algum em sua missão sangrenta, Kurt Cobain armou para si duas armadilhas fatais. Não, não há dúvida de que ele estava afim de ir embora e pedir demissão do mundo: naquele dia Kurt Cobain se matou duas vezes...

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[4] - ABAIXA ESSE VOLUME, MOLEQUE!

Difícil saber como terminar isso. Eu tinha guardado a frase bombástica pra fechar o texto - Enquanto existirem adolescentes vivendo em casas onde os pais ouvem Bee Gees, assistem à novela das oito e vão a missa todos os Domingos, haverá adolescentes que vão achar no Nirvana a trilha sonora ideal para dizer a eles e ao mundo um sonoro “vá tomar no cu!” Mas aí percebi o quanto ela merecia ser desenvolvida e explicada...

Os pais desse mundo, quase todos eles, são tão sem-noção, tão desconectados com as verdades dos corações de seus filhos, que quase sempre entendem a música que os adolescentes ouvem em termos de “abaixe o volume dessa porcaria!” ou “assim você vai prejudicar a audição!”. Não, amiguinhos, eles nunca vão entender a nossa relação maníaca de fanatismo e devoção com a música, nunca vão entender como pode um disco de rock, que parece ser só um amontoado de barulho e gritaria, mudar nossas vidas; nunca vão sentir os calafrios de excitação que sentimos na pele no refrão de “Smells Like Teen Spirit”, e tantas outras... Não, eles nunca vão entender... E nunca chegam a realmente prestar atenção na barulheira que escapa dos alto-falantes dos nossos quartos trancados, nem chegam nunca a suspeitar que ela possa ser um modo alternativo de expressão...

Isso eu acho pra lá de interessante: o fato de que nós ouvimos música não só para nós mesmos, e não só para “conhecer” a expressão dos outros e o que eles “têm a dizer”, mas que utilizamos a música alheia para expressar sentimentos próprios... Vocês alguma vez já se pegaram ouvindo música para os outros? Ligando o aparelho de som num volume estupidamente alto, não porque vocês achem isso super agradável e divertido, ou porque querem judiar dos tímpanos feito masoquistas, mas para que as outras pessoas ouçam vocês ouvindo? Nevermind pra mim sempre foi um dos discos que eu mais quis botar rolar pros outros me ouvirem ouvindo... Isso diz muito sobre mim, e sobre todos nós, fãs do Nirvana.

As pessoas que nunca amaram o rock and roll, que nunca tiveram suas vidas e adolescências marcadas por ele, nunca vão entender que nossa relação com a música vai imensamente além da procura por algo que seja “agradável aos ouvidos”. Chega a ser ridículo, e eu fico até com raiva, essa gente que só sabe abordar a música em termos de ser “agradável” ou não, como se fosse uma mera questão de mecânica, de cócegas nos órgãos auditivos, algo de meramente corporal, quando para nós, nós que vivemos o rock and roll não como música mas como alimento para a vida e como estilo de vida, sabemos que a música não tem a ver somente com os ouvidos, mas com o nosso ser inteiro, nossa alma inteira...

Se me permitem uma psicologização tosca, eu chego a dizer: o nosso gosto musical está diretamente vinculado com as estratégias que usamos pra definir nossa identidade, pra descobrir e publicar quem somos, pra expressar o que se sentimos... É como se escolhéssemos pelo mundo algumas bandas e artistas que, “grudados” a nós, acoplados ao nosso eu, oferecem ao mundo uma imagem de nós mesmos que nos parece mais agradável e mais admirável. A música pode ser uma maneira de expressar para o mundo sentimentos com os quais nos identificamos, que sentimos em nós mesmos, e que já foram expressados por outras pessoas de modo muito melhor do que nós mesmos poderíamos expressar. Temos nossos CDs e nossos aparelhos de som e nossos artistas prediletos, e eles servem não só para que a gente possa “curtir um som”, mas para que eles expressem por nós, como que por procuração, aquilo que sentimos e pensamos e que, por uma razão ou outra, não podemos expressar tão bem quanto eles.

Imaginem um adolescente, incapaz de articular direito sua raiva e sua insatisfação, incapaz de dar seu grito de rebeldia, encontrando em Nevermind o maior dos aliados: basta que ele coloque aquele disco no aparelho de som, bombe o volume até o máximo e dê um PLAY, e lá está dado o grito e mandada a mensagem, pra papai e mamãe, pra toda a vizinhança, “para o mundo”... Quando não temos voz, sempre podemos recorrer ao aparelho de som, devidamente munido da possibilidade de atravessar os ares atingindo os ouvidos alheios com uma “mensagem” de nossa escolha... Pena que, na maioria das vezes, ela não seja entendida. “Abaixa esse volume, menino!”, é a única resposta que nos chega de volta dos nossos pais, tão interessados na tranquilidade do lar e na reputação que vão ganhar com os vizinhos que se desinteressam completamente daquilo que os filhos possam estar sentindo e expressando – e o que é que podemos estar tentando dizer através da música que escolhemos adorar...

Por isso que eu sempre vou achar que 15 milhões de cópias vendidas de Nevermind é muito mais que um fenômeno econômico ou uma modinha criada pela indústria de discos com interesses lucrativos. Chego a ver nisso muito mais um sintoma do estado psíquico de uma multidão de jovens ao redor do mundo, por mais pretensioso que seja fazer um “diagnóstico” desse tipo... Mas sim: Nevermind fez tanto sucesso pois reconhecíamos nele nossa alma; e nós só elevamos o Nirvana ao status de banda mais adorada de nossa geração porque a gente sentia no coração muito daquilo que Cobain conseguiu expressar: aquela raiva, aquela angústia, aquele impulso auto-destrutivo, aquele ódio por tudo que é alegrinho demais, aquele desejo de rasgar o kitsch em mil pedaços, aquele desejo de berrar, aquela vontade de morrer...

Guitarras distorcidas até às beiras da explosão dos amplificadores; gritos estridentes e rasgados de pura angústia; uma vida de excessos, abscessos e morte prematura: é nisso que milhões de jovens resolveram se espelhar. Foi esse homem – extremamente confuso, perdido, deprimido, cheio de sofrimento e aflição – que escolheram idolatrar. Eram esses sentimentos por ele expressados – a raiva, a frustração, a tristeza, o niilismo, o desespero, a angústia... – que sentiam milhões no mais secreto de seus corações...

Não, Kurt Cobain não é nada parecido como um modelo a ser seguido, uma divindade a ser cultuada, nem mesmo um artista que mereça qualquer adjetivo semelhante a “gênio”... Se ele foi tão grande, e capturou tantos seguidores, e empolgou tantos milhões de corações, foi mais por ter conseguido expressar toda a frustração, raiva e angústia de uma imensidão de jovens para quem a vida parecia não fazer muito sentido e que parecia nem valer muito a pena. Kurt Cobain pode ter recusado com veemência toda a baboseira messiânica (“não suporto ser chamado de porta-voz da minha geração, pois não tenho nada a expressar senão meu profundo mal-estar...”, disse ele uma vez), mas ele foi sim a pessoa em quem milhões se espelharam, o rock-star que milhões idolatraram, o criador desses discos sublimes que serviram para que milhões dessem também seu grito, apertando um play; foi sim, pois, quer queira quer não, o nosso porta-voz, aquele a quem emprestamos o microfone para que falasse por nós; nosso herói, nosso mártir e nosso irmão...

segunda-feira, 25 de setembro de 2006


"Meu amigo está morto. Morreu de solidão. Ontem, os que o amavam o repuseram na terra, para que ele volte a nós, como uma flor que não cessa mais de renascer.

A existência para ele havia sido generosa. Dela recebera tudo com que um homem pode sonhar. Mas ele era mais que um homem e trazia em si um sonho que era ao mesmo tempo um desejo e um abismo.

Seu desejo era o amor que o tocava sempre com sua asa, sem nunca pousar em seu coração. E ele percorria o mundo, abandonado a si mesmo, cercado de tantos e tantos estranhos, nenhum dos quais chegava a compreender, muito menos a estancar a sua sede de amor. Peregrino desta imensa terra vazia e enganadora, vivia no deserto criado pelo amor impossível. A travessia dolorosa e exasperante levava-o, no maior segredo, à morte.

Esta não era para ele mais que uma face: a face da solidão inesgotável. Aonde quer que ele fosse, ela o perseguia; o que quer que fizesse, ela o cobria com seu amargor; ela fazia de seus mais belos sonhos, pesadelos monstruosos. Seu coração agitava-se até se quebrar, porque todo amor se tornava malogro. É por isso que seu sorriso tão belo era apenas o véu que ocultava suas lágrimas e a nudez de seu coração. Encerrado no lençol brilhante de sua alma eternamente ferida, ele morreu de ter querido amar e não ter podido amar.

Cansado de sua interminável peregrinação, que ia do vazio ao vazio, ele tocou o limite dessa noite por demais pesada. E quando ela chegou a seu negrume mais denso, ele se encerrou nela, para que nunca mais um sol nascente pudesse reconduzi-lo de volta à dor..."

* * * * *

ENCLAUSURADOS DO SER-SÓ

“A solidão é uma violência; por isso resistimos constantemente a ela, em uma luta desigual que costumamos perder. Mesmo assim continuamos a lutar. Mesmo enterrados na mais negra solidão, procuramos e esperamos um raio de luz. Mas a solidão é obstinada – tanto quanto o nosso desejo de amor e a nossa esperança no encontro; por vezes a solidão é até mais obstinada.

Enclausurados no ser-só, debatemo-nos para chegar a ser-juntos. Trancafiados que estamos entre as muralhas do isolamento, aspiramos à fuga. Feridos que estamos, queremos sarar a qualquer preço. E em que pese as derrotas que se multiplicam, não renunciamos à vitória que nos haveria de restituir alegria, paz, integridade, plenitude. Quando a nossa alma experimenta um novo cerco e se sente, uma vez mais, ameaçada, não obstante tudo, parte de novo em busca deste outro que viria acabar com a sua tortura indizível.

Mas eis que, pouco a pouco, sobrevém um desgaste da alma, o qual nos reduz do inatingível amor à condição de simples mendigos do amor impossível de se encontrar.”


(CHARBONNEAU, Crônica da Solidão)

Um dos livros mais tristes que eu já li. Mas também um dos mais bonitos.

segunda-feira, 18 de setembro de 2006

POEIRA CÓSMICA

Ah, a tristeza do mundo...

6 bilhões de pessoas neste planeta,
e é difícil encontrar 5 ou 6 criaturas
que se importam se você está vivo ou morto.

E na maioria das noites
Tantas delas de insônia
E na maioria dos dias
Tantos deles de angústia
Não há ninguém lá pra te provar que você não é inútil.

Ah, a tristeza do mundo...
E esse hábito de sofrer, que tanto me diverte...
E essa mania de me lembrar, feito masoquista,
Que não passo de um grão de poeira cósmica,
Esperando pra ser varrido pra dentro do nada,
Inútil.
Completamente inútil.

Trilhões e trilhões de rochas e estrelas,
rodando e correndo e brilhando nesse universo
(e que serve pra quê? por que ele ao invés de nada?),
E esse tal de planeta Terra fica aí,
girando feito pião, feito barata tonta,
besta que só ele...
Não entendo porquê.

Se por uma "tragédia inominável"
essa nossa morada planetária se explodisse,
Quantas lágrimas seriam derrubadas?
Quantos suspiros de saudade se ouviriam através das galáxias?
Quantos belos funerais os ETs consagrariam à nossa memória?
Quantos sóis se vestiriam com ternos negros, de luto?
Quantos oceanos os deuses chorariam?

Ou seria só o silêncio?

Acho que seria só o silêncio...
Aquele horroroso "silêncio dos espaços infinitos"
que deixava Pascal horrorizado e atordoado,
e que nós tantos nos esforçamos para não ouvir
com nosso barulho e nossa bagunça,
E nossas festas e nossa música...

Somos tão pequenos que Deus só nos consegue ver no microscópio.
Aquele ali, empoeirado num canto, mergulhado em teias de aranha,
e que o Cara não usa faz alguns milênios...

Às vezes gosto de pensar em possibilidades sobre Deus:

1) Ele tá tirando uma soneca, nos últimos milênios, cansado daquela monotonia toda que era aquelas bolas girando e girando por aí, no vazio, tontas que só elas. Convenhamos que é um espetáculo de dar sono em qualquer um.

2) Ele é cego, surdo e mudo; tanto que não chegou a ouvir os pedidos de ajuda dos 6 milhões de judeus que, indo pras câmaras de gás e fornos crematórios, voltavam inutilmente suas súplicas para um céu que não ofereceu jamais uma resposta... Vou parar de falar essas coisas. Também não vou falar na África. Ainda tem gente que deseja ter fé e que acredita num Deus bondoso e onipotente, que ama suas crianças, inclusive aquelas da Somália e da Etiópia, que morrem com três meses de idade.

3) Ele não se importa. Como nós não nos importamos com as formiguinhas que esmagamos debaixo dos pés sem nem lembrar que acabamos de cometer um assassinato. Somos ninharia.

4) Talvez a felicidade humana não tenha entrado no Plano da Criação... Pra quê criar bichinhos que seriam felizes o tempo todo? Bem mais divertido para Ele ficar lá em cima assistindo,
com pipoca no colo e um baldão de coca-cola, esse "filme humano" grotesco, repleto de contorções e suspiros, cheio de som e fúria - e significando nada.

Existe também a possibilidade de que estejamos sozinhos no universo.
Num me olhem com essa cara... Que culpa tenho eu?!

E esse Sol aí, que é só um dos inúmeros sóis que existem
(e que brilham por quê? e que se acenderam como?),
como é que pode ele não virar cinzas e pó?

Tudo que eu conheço, quando pega fogo,
se consome, se evapora, se liquefaz.
As chamas sempre devoram o que as faz viver
e deixam atrás de si um rastro de destruição.

E como pode essa imensa bola de fogo,
queimando e queimando e queimando,
sem nunca se consumir?

Pra quê tanta teimosia, Sol?
O Sol, para quem sempre é dia,
para quem não existe noite,
e que se tornaria muito cansativo
se nós aqui na Terra não lhe dêssemos as costas,
vez ou outra, pra escapar de tanta luz...

Pra quê tanto brilho, Sol, se no fundo continuamos sempre no escuro?
Pra quê tanto calor, se é só nossa pele que você atinge?
Pra quê tanto raio, se eles num passam pela carne pra ir calcinar,
lá no fundo, as angústias, a vontade de morrer, o Nojo?

E esse negócio aí de Big Bang, como é que pode?
Como assim, antes não existia nem tempo nem espaço?
Como assim, toda a matéria do universo concentrada num único ponto?
Como assim, "explodiu"?
Assim "do nada"?!
Quem foi que banhou tudo em querosene e acendeu o fósforo?




Tanta coisa que eu não entendo...

Mas vamos, esqueça esse papo de "tristeza do mundo".
Pára de drama.
Num fica vestindo a máscara de cachorro abandonado.
É patético.

Existe o riso e o prazer, as boas piadas e os bons amigos,
e existem os chocolates, os strogonoffs, os discos dos Ramones,
e existem as alegrias que se vendem em garrafa
e os porres que te fazem gargalhar de qualquer idiotice
e as festas que não são menos boas pelo fato de acabarem.

E existe o amor.
Pelo menos é o que dizem.
Pelo menos dizem que ele salva.
Pelo menos há essa esperança, ainda.

Existe também a música,
e existe também o mar,
e existe também esse Sol, inútil e maravilhoso
e existem estrelas inúteis
que são úteis pra olhar e perguntar:
"Pra que existe isso?"

E existe tudo aquilo que não faz nenhum sentido
mas que é gostoso assim mesmo.

Que importa ter sentido? Basta que seja gostoso.

Existe o espetáculo do mundo, essa louca aventura de viver,
e depois a promessa de descanso angelical,
o doce doce sono da morte.

Vamos... não é tão mau assim!


* * * * *

Tente ser otimista, amiguinho...

Pense, por exemplo, nas vantagens imensas
de ter glândulas lacrimais tão workaholics...
No caso de um colapso ambiental,
aliás altamente provável e previsto,
que torne inencontrável toda a água potável no planeta,
você, amiguinho, vai sobreviver mais que o resto,
Anos e anos e anos mais que o resto,
Só bebendo tuas próprias lágrimas.

Quem precisa de água quando tem tanta lágrima?
Uma fonte jorrante colada ao seu rosto,
Um hidrante nos teus olhos...
Você vai ser rico.
Vão te procurar como se você fosse um Messias!

Vai viver até os 90.
Pra quê, não sei; mas vai.
Os tristes serão os últimos a morrer.
Vai ser bonito.

Curta esse seu imenso talento para enxergar a tristeza do mundo...
Não é todo mundo que tem esse dom.
Há quem ande por aí com camisetas onde se lê: "LIFE IS A PARTY"...
Há pessoas que parecem estar mergulhadas até a cabeça num oceano de amor...
Há aqueles para quem a vida é a maior das delícias...
Pena que...

Pena.

Agora cala a boca e chora mais um pouco,
Que é só pra isso mesmo que você serve.

Logo isso passa.

Tudo passa.

domingo, 17 de setembro de 2006

Pus mais uma música minha lá no meu Toscódromo Musical Oficial na Trama, "Fear Of Pain".

FEAR OF PAIN

A E F#m D2

there are many here among us
who are so afraid to get hurt
they think life's so dangerous,
it's an horrible, dirty swamp
for the sake of protection
they go and lock themselves down
fill theirs cages with distractions
& paint rainbows on the walls!

they sit tight...
they watch life flowing by
they let it slide...
saying, "oh, well, nevermind..."

i know some whose fear of love
is the size of an universe
they run away from all people
that could make theirs hearts burst.
they don't want any strings attached
to people they might love
cause the close connections
are really painful to tear apart.

Fear of pain makes us remain
behind our barricades
But these walls we made they keep away
both ennemies and friends
We must shed our skin and let love in,
before it gets too late
Before we turn into nothing more
than dead men walking.

So that's what I say:

there are no better teachers than your mistakes.
there's a lesson hidden in each wrong road you take.
pain leads to knowledge, tears are a path to truth.
the worst regret's the one for all things you didn't do.
fear is a great conselour for what needs to be done.
it points to you the obstacles you have to overcome.

so don't sit tight.
and watch life flowing by.
don't let it slide
saying, "oh, well, nevermind"...

Fear of pain makes us remain
behind these walls we make
But these barricades they keep away
both pleasure and peain.
We must shed our skin and let love in,
before it gets too late
Before we turn into nothing more
than dead men walking.

Don't throw your life away for fear of pain...
Don't throw your life away cause you're afraid to make mistakes...

To be afraid to make mistakes
is already a big mistake
.

segunda-feira, 11 de setembro de 2006


VÔO 93
(United 93)
de Paul Greengrass


Só vai se decepcionar quem for ao cinema esperando encontrar algo que Vôo 93 não se propõe a ser. Então é bom começar destacando tudo o que esse filme NÃO é: não é um hollywoodiano blockbuster que usaria um evento histórico só como pretexto para um filme catástrofe arrasa-quarteirão; não é um "filme político" que tem qualquer coisa a dizer sobre a questão do Oriente Médio, do Taleban, do islamismo no século 21 ou do "choque de civilizações"; não é um filme que "coloque em questão" as ações americanas no terceiro mundo, o combate pelo petróleo e a política externa da administração Bush (que não é citado uma única vez em todo o filme); não é uma "peça ideológica" falando em favor ou contra nada...

"Vôo 93" é o primeiro dos muitos e muitos filmes que certamente virão para retratar, mutilar e explorar os atentados mais famosos da recente história da humanidade (Oliver Stone já está chegando com o seu World Trade Center)... Nele o diretor inglês Paul Greengrass, em seu quarto longa (assistam também o The Theory Of Flight, é um filmaço!), segue na mesma linha que adotou no ótimo Domingo Sangrento e faz um retrato semi-documental e ultra-realista de um evento histórico marcante, com uma "pureza" de julgamentos exemplar. Esse filme não está aí nem pra ficar pintando retratos demoníacos dos terroristas ("ai, como são malvados! matando gente inocente!"), nem pra condenar as autoridades americanas, nem para fabricar heróis patrióticos, nem mesmo para somente "entreter" a audiência com um bom filme de "suspense" (tarefa não muito fácil, já que a imensa maioria dos espectadores já sabe muito bem o desfecho da história quando entra no cinema).

É um filme sobre o 11 de Setembro em geral, muito mais do que somente sobre um dos vôos sequestrados naquele dia: sobre o imenso pasmo das autoridades frente a um acontecimento absolutamente imprevisto numa terça-feira que tinha tudo para ser absolutamente "normal"; sobre as reações emocionais de pessoas subitamente postas em perigo de morte (mas sem exageros melodramáticos, sem choradeiras, sem apelação para "cenas de pânico"); sobre a frenética e infrutífera Torre de Babel que se instalou em terras americanas na tentativa frustrada de impedir os desastres...

A câmera de Greengrass passa muito mais tempo em terra, retratando o trabalho nos aeroportos, centros de comando e nas bases militares, do que dentro do avião que dá nome a seu filme. E a decisão de utilizar como "atores" muitas da pessoas reais que participaram dos eventos contribui para o clima de verdade. "Vôo 93" acaba sendo um retrato fílmico competente, direto e acreditável de uma das manhãs mais caóticas que as autoridades americanas já tiveram que enfrentar, dando conta de mostrar bem a simultaneirade de acontecimentos, a corrida contra o tempo e o (compreensível) despreparo de todos frente a um ataque tão inusitado, original e bem-orquestrado. Todos nós já sabíamos dos "fatos" e já tínhamos ouvido todas as histórias; mas o filme faz desfilar frente aos nossos olhos, em seus rápidos 93 minutos, um espetáculo que deixa marcado ainda mais forte na memória a maneira como, naquele dia maldito, a mais poderosa nação do planeta ficou completamente paralisada, pasma e chocada enquanto assistia o WTC e o Pentágono sendo atacados, assim "do nada", or um inimigo então desconhecido...

"Vôo 93", com seu andamento veloz e tenso, consegue ser homogêneo e sem grandes "rupturas" narrativas - o filme só se torna realmente frenético e caótico nos (ótimos) 15 minutos finais, que são daqueles que o público assiste eletrizado e quase sem parar pra respirar. Com certeza críticos mais cricos vão dizer que a edição muito entrecortada, as câmeras excessivamente móveis (seguradas sempre na mão) e o ritmo muito acelerado impedem um "julgamento mais crítico". Mas a verdade é que não há muito pra pensar e pra julgar, aqui. "Vôo 93" não é um filme que exija muito esforço intelectual do espectador: se contenta em contar uma boa história, e do jeito mais atraente e verossímil possível. Um filme com ambições modestas, na verdade, e que exige que o espectador vá ao cinema sem expectativas exageradas.

De qualquer modo, fica comprovado mais uma vez o imenso talento de Greengrass e de sua equipe de câmeras e de editores na criação de um ambiente completamente tomável pela realidade. Mesmo em meio ao imenso caos fílmico que vemos nos minutos finais, com aquelas câmeras frenéticas e alucinadas tentando capturar o levante dos passageiros, em momento algum a gente sente a presença do câmera, o que estragaria o "efeito de realidade". Me explico: Vejam em Irreversível, por exemplo, como o câmera parece um menininho exibido que quer toda atenção só pra si e fica ali meio que gritando: "ei, eu estou aqui! estou girando de ponta cabeça! estou tremendo! estou fazendo maluquices!"... Em "Vôo 93" acontece o raro: mesmo nos momentos em que a câmera está alucinadamente em movimento, ela continua "esquecida" e você não se diz: "olha, há uma câmera ali filmando...". Esquece. E o cinema-verdade precisa disso mais que tudo: que o espectador esqueça que exista uma câmera e acredite estar olhando direto na cara da "verdade"...

Felizmente, também, o filme de Greengrass não é um altar para a consagração de um "herói" americano na luta contra o Eixo do Mal... os atos dos passageiros do United 93 nada têm de "altruísmo" ou "patriotismo". "Especialmente recomendável é a forma como o filme não aceita a interpretação ufanista muito popularmente defendida nos EUA de que o avião teria caído pelo fervor patriótico das vítimas que, como Rambos da classe turística, teriam decidido impedir que o vôo 93 chegasse ao seu alvo", escreveu bem o Kleber Mendonça Filho em sua resenha no Cinemascópio. De fato, ninguém ali dentro fala uma frase ridícula como "Ai coitada da Casa Branca e do Capitólio! Vamos salvar esses símbolos da América, amigos!", o que, eu suspeito, transformaria "Vôo 93" numa das melhores comédias do ano... É óbvio que cada um dos passageiros, naquele momento, não estava nem aí para o "destino da nação". Aquilo é só uma louca anarquia onde cada homem luta desesperadamente para arrumar um jeito de escapar da morte e o filme faz bem ao não ficar fingindo que qualquer um dos passageiros estava heroicamente "lutando por uma causa"...

Se há algo a criticar, é justamente essa pretensão de estar contando a verdade... O preocupante é que o filme, sendo assim tão realista, verossímil e convincente, periga conseguir justamente o que parece ser seu objetivo: nos convencer de que as coisas se passaram exatamente como nos são mostradas. E não vão ser poucas as pessoas que vão sair por aí dizendo "Você já viu aquele documentário, o "Vôo 93"?" E vale a pena exercitar o ceticismo e dizer: nenhum de nós é capaz de saber exatamente o que se passou dentro daquele avião! O filme de Greengrass, apesar de tão convincente, é um exercício de imaginação, de preenchimento de lacunas, de "fictização"...

Pode até ter sido "baseado em fatos reais" (ligações feitas pelos passageiros para familiares e amigos, informações de caixa preta, detalhes fornecidos pelas autoridades...), mas não deixa de ser, nunca, uma construção fictícia querendo ser tomada pela realidade. E conseguindo! Algum problema? Sim, porque não existe unanimidade sobre o que aconteceu com o Vôo 93: a versão oficial reza que os passageiros heroicamente se insurgiram contra os terroristas, impedindo que o avião atingisse o seu alvo, mas há rumores circulando na imprensa alternativa de que o avião foi de fato abatido - leiam, por exemplo, esse review xingando o filme de ser uma mentira travestida de cinema verité...

De qualquer modo, posta de lado a discussão "é verdade ou não é?", "Vôo 93" é sem dúvida um thriller curtível: competente, envolvente e com um final digno do adjetivo "ELETRIZANTE" (que os marketeiros adoram jogar em péssimos filmes de ação... felizmente não é o caso aqui!). E vale a pena ser visto, mesmo que for só pra instigar uma discussão sobre o realismo no cinema e sobre a representação supostamente "fidedigna" de acontecimentos históricos.

CAMINHOS ALTERNATIVOS
* Cinema Em Cena

domingo, 10 de setembro de 2006



Chiquérrimo. Parece até que eu sou alguém!

Então, vou colocar umas gravações caseironas, toscas e constrangedoras de músicas minhas lá na Trama, apesar da minha vergonha. Aí aqueles dentre vocês que não tem medo de indie-rock low-fi sentimentalóide e mau-cantado poderão "se deliciar" com minhas criações... Gostaria muito de ouvir a opinião de vocês, 2 ou 3 leitores desse blogue, sobre esses pequenos desastres... Agora dá licença que eu vou tentar compor algo em português... se o resultado num sair ridículo demais, até mostro... mas preciso de encorajamento, que eu sou um puto muito inseguro... :)

sábado, 9 de setembro de 2006


Deix'eu voltar a falar um pouco de cinema por aqui, senão nunca vou conseguir me eleger pra Super Liga dos Brógues Cinematográficos... Então, screening-log foi atualizado, agora com uma novidade: quando o filme em questão é de um diretor que eu conheço razoavelmente bem, rola um TOP com os filmes do cara que assisti, logo na sequência à entrada com o último filme dele que foi visto. Tops por enquanto:

[[[. TOP MIKE LEIGH
1. naked
2. segredos e mentiras
3. agora ou nunca
4. life is sweet
5. carreer girls
6. o segredo de vera drake
7. topsy-turvy

[[[. TOP LINKLATER
1. antes do pôr-do-sol
2. antes do amanhecer
3. waking life
4. escola de rock
5. tape
6. slacker
7. dazed and confused

[[[. TOP DAVID LYNCH
1. cidade dos sonhos
2. coração selvagem
3. o homem elefante
4. eraserhead
5. twin peaks, os últimos dias de laura palmer
6. estrada perdida
7. the straight story
8. veludo azul
9. duna

[[[. TOP LARS VON TRIER
1. dogville
2. dançando no escuro
3. manderlay
4. ondas do destino
5. europa
6. as cinco obstruções
7. the element of crime
8. os idiotas

[[[. TOP DAVID FINCHER
1. clube da luta
2. seven
3. alien III
4. vidas em jogo
5. o quarto do pânico

[[[. TOP FRANK CAPRA
01. a felicidade não se compra
02. aconteceu naquela noite
03. o galante mr. deeds
04. meu adorável vagabundo
05. horizonte perdido
06. este mundo é um hospício
07. a mulher faz o homem
08. deste mundo nada se leva

[[[[. TOP WOODY ALLEN
01. crimes e pecados
02. zelig
03. maridos e esposas
04. manhattan
05. hannah e suas irmãs
06. match point
07. annie hall
08. a rosa púrpura do cairo
09. melinda e melinda
10. dirigindo no escuro
11. desconstruindo harry
12. tiros na broadway
13. interiores
14. poderosa afrodite
15. um misterioso assassinato em manhattan
16. a era do rádio
17. a outra
18. sonhos eróticos de uma noite de verão
19. tudo o que você sempre quis saber sobre sexo...
20. igual a tudo na vida
21. celebridades
22. dorminhoco
23. trapaceiros

[[[. TOP MARTIN RITT
01. ver-te-ei no inferno (the molly maguires)
02. norma rae
03. hud, o indomado
04. the long, hot summer
05. the great white hope
06. sounder

[[[. TOP CRONENBERG:
1. marcas da violência
2. eXistenZ
3. videodrome
4. the dead zone
5. spider
6. dead ringers - gêmeos, mórbida semelhança
7. shivers - calafrios
8. crash, estranhos prazeres

* * * * *

últimos filmes:

195. SOUNDER (de Martin Ritt, EUA, 1972 [divx]) - 7.9
196. REGARDE LA MER (de François Ozon, França, 1997 [divx]) - 8.0
197. A CORRIDA DO OURO (The Gold Rush, de Charlie Chaplin, 1925 [divx]) - 7.5
198. A PERVERTIDA (Transgressing. de Tinto Brass, Itália [dvd]) - 3.8
199. ADEUS AO SUL (de Hou Hsiao Hsien, Taiwan, 1996 [cinUSP]) - 2.0
200. PECADOS DE GUERRA (Casualties Of War, de Brian de Palma, 1989) - 9.1
201. FINAIS FELIZES (Happy Endings, de Dan Roos, EUA, 2002 [dvd]) - 7.3
202. DIÁRIO DE UMA PAIXÃO (The Notebook, de Nick Cassavetes, 2004) - 8.3
203. ALTA FIDELIDADE [2a vez] (High Fidelity, de Stephen Frears) - 7.1
204. O REVERSO DA FORTUNA ( de Barbet Schroeder, 1989 [dvd]) - 6.3
205. O DESTINO BATE À TUA PORTA (The Postman Always Rings Twice,) - 6.4
206. FRANKIE & JOHNNY (de Gary Marshall, EUA, 1991 [dvd]) - 9.0
207. HARRY & SALLY (de Rob Reiner, EUA, 1991 [dvd]) - 7.1
208. EXOTICA (de Atom Egoyan, Canadá, 1994 [divx]) - 8.9
209. LADRÃO DE ALCOVA (Trouble in Paradise, de E Lubitsch, 1932 [divx]) - 6.9
210. RICHARD III - UM ENSAIO (de Al Pacino, EUA, 1996 [dvd]) - 8.7
211. DE-LOVELY - VIDA E AMORES DE COLE PORTER (de Irwin Wrangler) - 5.1
212. 1969 - O ANO QUE MUDOU NOSSA VIDAS (..... [dvd]) - 5.8
213. VERDADE NUA (Where The Truth Lies, de Atom Egoyan, 2005 [divx]) - 8.1
214. THE BLUES I - FEEL LIKE GOING HOME (de Martin Scorcese) - 6.9
215. 1991, THE YEAR PUNK BROKE (de Dave Markey, EUA, 1992 [divx]) - 7.1
216. ORGULHO E PRECONCEITO (de Jon Wright, 2005 [dvd]) - 6.9
217. UM TIRO NA NOITE (Blowout, de Brian de Palma [dvd]) - 6.7
218. HYPE! (de Doug Pray[dvd]) - 8.5
219. JEJUM DE AMOR (His Girl Friday, de Howard Hawks, EUA, 1940 [divx]) - 6.8
220. THE PROPOSITION (de John Hillcoat/Nick Cave, 2006 [divx]) - 8.4
221. BETTER LUCK TOMORROW (de Justin Lin, EUA, 2004 [divx]) - 5.1
222. OS DESAJUSTADOS (Withnail and I, de Bruce Robinson, [divx]) - 8.0
223. NOITE E NÉVOA (Nuit et Bruillard, de Alain Resnais, França [divx]) - 9.0
224. BUKOWSKI: BORN INTO THIS (de John Dullaghan, EUA, 2002 [divx]) - 8.1
225. O TEMPO QUE RESTA ( de François Ozon, 2006 [divx]) - 7.1
226. THE HEART IS DECEITFUL ABOVE ALL THINGS (Asia Argento, 2002) - 6.7
227. CASA DE AREIA (de Andrucha Waddington, Brasil, 2005 [divx]) - 8.0
228. GÊMEAS (de Andrucha Waddington, Brasil, 200x [dvd]) - 7.9
229. A ZONA MORTA (The Dead Zone, de David Cronenberg, 1983 [divx]) - 8.1

terça-feira, 5 de setembro de 2006


!!!DICA!!! Tá nas bancas de jornal, dando bobeira, o imperdível documentário HYPE! , um filmaço esperto, veloz e divertido que retrata a ascensão e queda do GRUNJÃO e as consequências disso para a Seattle do começo dos anos 90. Inclui entrevistas com estrelas (Eddie Vedder...), gente importante na consolidação da cena (Jack Endino, os caras da Sub Pop...) e várias bandas underground da época e região, dando depoimento e tocando. Valeu à BIZZ por esse imenso favor de lançar por aqui um filme tão fundamental pra quem curte rock and roll nos anos 90! O mesmo diretor, chamado Doug Pray, tem também o ótimo SCRATCH, que conta detalhadamente a história do surgimento da música eletrônica, dos DJs e do hip hop. Dois documentários musicais fudidos de bons! Corram atrás...

Ah, e terminei de mapear meus discos prediletos dos anos 90, ano a ano (ê falta do que fazer no feriadão...). Agora vou tentar fazer um TOP 50 da década como um todo, mas vai ser dureza. E, promessa, tô me preparando pra finalmente escrever um texto em tributo ao Nevermind - que tá completando 15 aninhos de idade e merece uma devida homenagem... Logo logo por aqui.

1990 - 1991 - 1992 - 1993 - 1994 - 1995 - 1996 - 1997 - 1998 - 1999.

sexta-feira, 1 de setembro de 2006

da série: QUERIDO DIÁRIO em ARTERÍSTICOS
(um post desencanado...)

* Ando cometendo altas HERESIAS contra a minha religião (o Rock and Roll)! Vejam só: dia desses fui no SAMBA. Sem zueira. "Quem te viu, quem te vê..."Algum tempo atrás eu, que sou cheio de preconceitos, que escarro em Carnaval e que quero cortar em pedaços a Mulata Globeleza sempre que ela aparece na telinha, nunca aceitaria ir num barzinho onde uma roda de samba tava tocando.... Queria ser reconhecido como um cara estritamente rock and roll, fanático até num poder mais. Hoje não tenho nenhuma vontade de ser ortodoxo desse jeito - me orgulho de ser um indie eclético! :)...

O lugar é um muquifinho trimmassa na Eiras Garcia, a uma quadra aqui de casa, perto do P3 da USP, chamado Jardim Elétrico. Recomendado - eu, que nem curto samba, curti à beça o lugar e o som. Paga nada pra entrar e o som é samba antigão de primeira, nada a ver com aquelas pagodeiras nojentas que a gente ouve por aí. E esse barzinho, segundo o A., é altamente frequentado pelo pessoalzinho legal da FFLCH.

Obviamente, meus talentos para o samba são nulos (de 0 a 10, ganho um -1) - nunca aprendi (nem quis) e num tenho, infelizmente, nem uma gota de sangue mulato. Branquelo cadavérico quinêm sou, num tenho nem coragem pra tentar sambar: sei que eu iria ficar parecendo uma coisa ultra-ridícula, um palhaço involuntário, algo como uma salsicha humana, pálida e desengonçada, se rebolando toda... Vou poupar o mundo desse espetáculo grotesco. E ainda morro de medo do ridículo, é claro, e nem um monte de brejas me deixaram bebum o bastante pra "soltar a franga"... O mundo agradece.

Eu tenho umas TRAVAS MENTAIS malditas que num me deixam livre pra ser idiota. E, como diz o Lars Von Trier, num conselho de vida excelente, "FREE YOUR INNER IDIOT!"

O Funkadelic tb dizia bem...: FREE YOUR MIND AND YOU ASS WILL FOLLOW...

Além disso, finalmente conheci o Milo, um dos barzinhos indie mais legais de São Paulo - lembrou o Audiogalaxy de Bauru, mas umas 10 vezes melhor. Ambiente bacana, com fumaceira pesada no ar, vários indies paulistanos cool e várias long-necks Xingu bebidas até tudo começar a girar. E só bons sons - no dia, rolou Arcade Fire, Pavement, Pixies, Belle & Sebastian, Dinosaur Jr., Gang Of Four, Flaming Lips, entre muitas outras coisas... Recomendo também. De quarta-feira a entrada é liberada (nos outros dias são 10 paus...) e costuma bombar bem.

* Qto à facul, é aquela coisa... só tenho aulas 3 noites por semana (e muitas vezes dou o fora no intervalo ou bem antes do fim...), ainda acordo à uma da tarde, como bom vagabundo, e ainda me sinto quase de férias - filmes e séries até não poder mais (tô completamente fascinado e viciado em A Sete Palmos...), violãozinho por horas e horas (nova banda nascendo...), vários discos ouvidos na sequência... Ainda bandejo (do verbo BANDEJAR) duas vezes ao dia (por Rs1,90 vale muito a pena), durmo no meu fenomenal quarto TRIANGULAR (lata de sardinha pura), e ando bebendo bem mais do que o recomendável (e cantando com Wander: "Sou quase um alcóolatra, eu sou!").

Continuo o mesmo vagal que sempre fui - e sempre seguindo a lei do mínimo esforço possível. Quatro anos de Unesp me deixaram desacostumado... Eu nunca fui de prestar muita atenção em aula, quase nunca: ficava só lendo meus livrinhos na cara dos professores (preferia me divertir com as putarias do Henry Miller e do Nabokov ao invés de ouvir a bobajada dos 'fessores...), ou divagando muito longe da sala de aula (só o corpo presente...), ou rabiscando/desenhando/poetando no caderno, só esperando o sinal bater - e não é agora que eu vou mudar. Num presto atenção nas aulas - só muito raramente. A Marilena falando sobre Matrix e zoando o P.C.C. foi uma exceção ("P.c.c. é tudo lambari, tudo pé-de-chinelo!!! Crime organizado é Israel!!!", disse a fessora...). Poucas coisas que foram mais legais nessa facul, até agora, do que ver a Marilena Chauí, aquela senhora anãzinha, levantando a voz, toda revoltada, gritando como se tivesse no palanque, e descendo lenha nos EUA. Trimmassa...

Mas paciência para as aulas tenho muito pouca. E o desencanto já tomou conta... Não é que esse curso de filosofia USPiano esteja ruim, nem que os professores sejam desastrosos, nem que a chatice seja insuportável, nem que os assuntos sejam completamente irrelevantes, mas é que... sei lá. Acho que eu fui ingênuo demais achando que essa faculdade de filosofia seria uma excitante e fascinante jornada em busca do Sentido da Vida e da Morte, que iria me mostrar o Caminho para a Felicidade, que seria uma Escola de Sabedoria... Idiota fui eu, pensando que tava entrando num Curso de Auto-Ajuda! :)

A gente acha que vai achar as Respostas Supremas - e ninguém nem coloca as perguntas... Esse curso de filosofia aqui, já deu pra perceber, não foi feito para nos tornar mais sábios e felizes - mais felizes pois mais sábios... Quer só formar BONS LEITORES, capazes de decifrar aqueles textos obscuros e rebuscados que eu, sinceramente, tenho muito pouco prazer lendo. Hoje em dia, curto bem mais ler um Hermann Hesse, um Walt Whitman ou um Rubem Alves do que esses chatões tipo Kant, Montesquieu e Hegel. Talvez eu seja muito superficial... ;)

Estou com fome de vida, fome de amor, fome de emoção, e sem vontade nenhuma de pensamentos difíceis, raciocínios complicados, textos indecifráveis... Pra quê tudo isso??!! Pra quê complicar a vida desse jeito? Concordo com o Rubel Alves: "O mundo acadêmico é algo aterrorizador... todos tratam de se proteger, pelo estilo rebuscado e excessivamente técnico, na esperança de que os leitores tomem águas barrentas por águas profundas."

* Outra coisa: alguns acham que o objetivo da filosofia é nos colocar inteiramente sob o domínio da razão, vencendo a "tirania das paixões"... Eu não sei se quero isso pra mim... Quero me tornar tão ressecado, frio e insensível quanto essas pessoas ultra-racionais que vejo por aí? Pra ser um bom filósofo é preciso amordaçar o coração e castrar todas as emoções? Silenciar o desejo, o amor, o medo, a angústia, a vontade de berrar e de chorar? Eu sei que eu não consigo.

Não sei se algum dia eu vou conseguir ser tão friamente racional quanto alguns julgam ser necessário pra ser um "bom filósofo". Talvez eu devesse desencanar de ambições com a filosofia e, mais humildemente, fazer o que eu me sinto capaz de fazer: falar de mim mesmo (a única coisa que eu penso conhecer razoavelmente bem), sem nenhuma pretensão à objetividade e à imparcialidade. A minha verdade - a única coisa que eu me sinto minimamente capaz de descrever.

E o que há de errado com os sentimentos, pô? Eu sei o que quero: quero sentir, e conservar sempre a capacidade de sentir, de chorar ouvindo uma música, de me emocionar bestamente com certs filmes, de demonstrar afeto e entusiasmo... Passei muito tempo morto por dentro pra querer usar a filosofia pra matar ainda mais minhas emoções. E eu realmente acho que muito filósofo por aí é pior que muito padre e muito asceta nesse lance de reprimir o instinto e idolatrar a racionalidade descarnada e fria. Nesse ponto, continuo nietzschiano, até o fim. Quero que se exalte em mim a força vital, que pegue fogo minha energia pra viver e sentir! Quem disse que é a Razão quem tem razão?

E é engraçado que a palavra Sabedoria seja pronunciada tão poucas vezes dentro daquela sala de aula... Como se a filosofia não tivesse nada a ver com ela, como se essa tal de sabedoria fosse um conceito morto, antiquado e que nem merece crédito... como se não tivesse importância nenhuma... Quando pra mim sempre foi óbvio que a filosofia é só um meio, um instrumento, uma ponte: se não nos leva a viver melhor, com mais alegria, mais serenidade, mais paz de espírito, mais sabedoria, não vale nada. A filosofia como terapêutica...


* Preciso urgentemente achar um livro, um manual de intruções, um tutorial ou um conselho da sabedoria popular pra ACABAR COM O MEU MALDITO SOLUÇO. Eu não aguento mais essa praga. Em Bauru eu já era zoadíssimo porque, nas ocasiões em que eu começava a soluçar, não conseguia parar por nada nesse mundo: engolir saliva, segurar a respiração, dar soco no meu tórax, beber litros de água, nada funcionava. Só mesmo o Ronnie e o Porra tinha um tática conjunta boa pra arrancar do meu corpo essa possessão. Mas sozinho eu não consigo. Esse meu soluço impassável me valeu, a mim outrora conhecido como Lúcio, o apelido carinhoso de SOLÚCIO. :) Mas porra, eu nunca consigo tomar um susto quando eu QUERO tomar um susto... Ah, essa vida é dura demais, num vale a pena...


* !!!PROCURAMOS BAIXISTA!!!!
Tamos pensando em fazer som próprio, com letras em português, influenciado por coisas como Jeff Buckley, Radiohead, John Frusciante, Chris Cornell solo, Muse etc... Aquela coisa: rock alternativo sentimental. Qualquer coisa, me dêem um toque.


* LISTINHA:

5 DISCOS FESTEIROS/ALEGRES/EUFÓRICOS pra espantar qualquer depressão:

- FUNKADELIC, "One Nation Under a Groove" + "Maggot Brain"
- SLY AND THE FAMILY STONE, "Greatest Hits"
- AVALANCHES, "Since I Left You"
- SAVE FERRIS, "It Means Everything"
- DJ SHADOW AND CUT CHEMIST, "Brainfreeze"


* AMANHÃ...



Os dias que eu me vejo só
São dias que eu me encontro mais
E mesmo assim eu sei tão bem
Que existe alguém pra me libertar...


SET LIST DOS SONHOS:

- Todo Carnaval Tem Seu Fim
- Cara Estranho
- Quem Sabe?
- Último Romance
- Além do Que Se Vê
- Fingi Na Hora Rir
- O Vencedor
- O Vento
- Descoberta
- Conversa de Botas Batidas
- Tá Bom
- Casa Pré-Fabricada
- Sentimental
- Dois Barcos
- Pois É
- Retrato Pra Iaiá
- Deixa Estar

BIS
- A Flor
- Condicional
- Primavera

Mas o dia insiste em nascer...
Pra ver deitar o novo...


Ah, vai ser foda. E quarta já tem Campari. Esse mês vai ser foda.


* Caraca, olha esse toró que tá caindo em Sampa agora... Esse Pró Aluno nunca pareceu tão aconchegante...