PEQUENO INVENTÁRIO DE NOSTALGIAS (PARTE II)
CAVALEIROS DO ZODÍACO. Clichê pacas, eu sei, mas não fui mesmo uma criança muito original! Eu fazia o que todos faziam: adorava Chaves e Chapolim, sabia cantarolar todos os hits do Skank e entrei em todas as modinhas escolares da época, do iôiô da Coca Cola ao mini-game (só não entrei na onda dos tamagochis – achava muito “feminil”). Pois houve uma época em que as nossas vidas pirralhas orbitavam totalmente ao redor dos Cavaleiros do Zodíaco. Todo santo dia, estávamos lá, olhos grudados na TV, canal 9, sintonizados na defunta Manchete, acompanhando a saga de Seya e companhia.....
Hoje em dia a criançada, pelo que sei, fica grudada nos Cartoon Network e Fox Kids da vida (pelo menos as "pequeno-burguesas"!), mas na minha época (mas que expressão de tiozão...) a Manchete era mesmo o canal mais “animal” (para usar gíria daqueles tempos idos...) em termos de programação infantil. A Globo tinha a TV Colosso, a Escolinha do Professor Raimundo e as louras gostosas todas (mas eu nunca fui muito de assistir Xuxa e Angélica); o SBT tinha Chaves e Chapolin, Topa Tudo Por Dinheiro (eu era bem mais isso aos Domingos que o Faustão) e o começo do Programa do Ratinho (era o maior escracho que eu já tinha visto). Mas a Manchete superava todos os outros canais, de acordo com o meu gosto: tinha toda uma procissão de programas geniais e irresistíveis, apesar da tosquidão extrema de todos eles, a maioria deles importados do Japão, que eu devorava em muitas manhãs passadas na frente da telinha, esperando o almoço ficar pronto e a perua buzinar na rua, me chamando pra escola. A Manchete tinha Changeman, tinha Jiraya, tinha Jaspion, tinha Cyber Cops... Tinha até a única novela da tv brasileira em que dava pra ver mulher pelada!
Mas a grande atração do falecido canal 9 era mesmo o Cavaleiros do Zodíaco, que bombava nas audiências. Eu tinha tudo: tinha o álbum de figurinhas, inclusive com aquele imenso bolo de repetidas enroladas em elásticos – e que nostalgia daquela ânsia furiosa de ser o primeiro da turma a completá-lo! Tinha o CD original com as músicas do desenho cantadas em português - e ia ao delírio cantando junto no chuveiro. E, claro, tive também os ultra-desejados bonecos (Comandos em Ação era para os fracos!), que vinham com a armadura em pedaços para ser devidamente montada no cavaleiro. Tinha uma época que eu aguardava com ansiedade extrema a chegada do próximo Aniversário ou Natal para que pudesse pedir ao bom velhinho um novo boneco dos Cavaleiros – não existia sonho de consumo que chegasse aos pés. Cheguei a ter só uns três, se me lembro bem, todos de armadura de ouro, pois não era a coisa mais barata do mundo, na época. Comprei fitas VHS com episódios. Gravava uns também, para reassistir depois. Achei o máximo quando fizeram o longa-metragem.
Na escola, no recreio, os papos constantemente revolviam ao redor do desenho – virou lugar-comum dizer que o Iki era viadinho, com aquela roupinha cor-de-rosa dele; que a Atena era muito gatinha e ia acabar namorando o Seya, no fim do seriado; e havia controvérsias sobre quem era o mais machão, se o Shiriu ou se o Fênix; eu, metido a diferente, dizia pra todo mundo que o meu cavaleiro predileto era mesmo o Iago, o do gelo.
Hoje, quando penso nas minhas lembranças dos Cavaleiros do Zodíaco, fico achando que o troço era bem mais violento do que o resto dos programas infantis da época. Os japas, em geral, tinham gosto por pancadaria, kung fu, karate, judô, essa coisa toda. Eram fãs de genocídios: todo episódio tinha um monte de bonecos mascarados sendo dizimados como formigas pelos honrosos heróis do Bem. Depois o Power Rangers copiou a mesma fórmula, mó sacanagem.
As longuíssimas batalhas dos cavaleiros nas 12 casas do Zodíaco, que foi o clímax do desenho, eram um negócio dolorido de ver. Eu sofria junto com os coitados. Me compadecia dos tormentos extremos que os pobrezinhos eram obrigados a passar. Pois a estética Cavaleiros sempre deu muito destaque para o martírio: o Seya, por exemplo, que era todo esquelético, que parecia um fracotão, quase sempre tomava uma sova daquelas de seu inimigo. Apanhava até não poder mais. Ficava como um boxista, todo estropiado, todo pintado de sangue, com as pernas bambas, quase indo a nocaute. E aí, no momento mais crítico do mundo, às beiras da morte, quando um piparote parecia ser o suficiente para fazê-lo ir de vez pras cucuias, ele virava o jogo. Acho que era quase sempre assim: os cavaleiros costumavam ganhar de virada. No momento de fudição extrema, era só o Seya pensar na Atena e evocar as forças do cosmos, que, de repente, na maior marmelada, ele sentia aquela super energia fodona dele crescendo e se tornava incandescente, como se tivesse sendo cozinhado por aquele fogo azul ultra-legal, e aí não havia inimigo que não fosse à lona com o meteoro de Pegásus... Era emocionante.
Nos outros seriados também tinham esses momentos de ápice, como quando os cinco heróis (acho que era no Changeman) juntavam suas armas para construir uma imensa bazuca que soltava um arco-íris cilindroso que dizimava qualquer monstro. Ou quando (acho que no Jaspion) o herói entrava no robozão, maior que qualquer arranha-céu, e ia ter o combate contra o monstro apocalíptico (tudo isso num cenário que parecia feito de isopor e com os efeitos especiais mais toscos, primários e amadorísticos do mundo). Era fódimais. Mas os clímaxes no Cavaleiros eram insuperáveis. E a imitação deles era uma das minhas maiores diversões infantis. Perguntem aos meus vizinhos, biógrafos do futuro, e eles provavelmente dirão que me ouviam brincar no quintal da casa no Rudge, dando soquinhos alternados no ar e berrando contra um inimigo imaginário, um sonoro “meteoro de pegasúúúúúúú!!!!!!”
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