segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

:: plano de assalto ::


"The crumbs of love that you offer me
They're the crumbs I've left behind."

LEONARD COHEN, Avalanche

Descobri bem cedo na vida, registrei no Diário como se fosse verdade absoluta, quis até patentear a Descoberta Científica: "só consegue ser infeliz quem sonha demais". Essa a velha conclusão, tão cedo tirada, pela vida tantas vezes confirmada... O amargo sabor da vida vivida em comparação com a doçura da vida sonhada - quem o conhece melhor que eu?

Minha pior mania, já me disseram, é não saber me contentar com pouco. Mas meu problema é bem mais sério do que isso! Com muito também não me contento. Não sou um caso de esfomeado que iria ao paraíso se recebesse pão com manteiga e um copo d'água. Nem um banquete de imperador romano saciaria minha fome. E é a maior das desgraças ansiar pelo infinito num mundo que é tão pão-duro.

"O grande mal do romantismo", dizia o Pessoa, "é querer a Lua como se houvesse maneira de a obter". Pobres de nós, românticos incuráveis, que desejam o Amor Absoluto ou a Felicidade Perfeita como se houvesse modo de as obter! Como se não fossem meras invenções da nossa enlouquecida e enlouquecedora imaginação - pólos magnéticos que atraem sempre à distância, mas que repelem qualquer tentativa de aproximação... Our dreams sail forever on the horizon.

Só consegue ser infeliz quem sonha demais e não encontra na vida alimento para pôr na boca esfomeada de sua maquininha produtora de sonhos, que come tanto combustível e tanta energia... Pobres de nós que temos essas fomes tremendas na alma, daquelas que esgotariam o estoque do supermercado, se existisse para as coisas que faltam dentro e não fora. O triste é que tudo o que mais importa não se pode comprar. Mas talvez mais triste seria se tudo estivesse à venda. No fundo é quase bom que dinheiro seja tão inútil.

Sou mau aluno e não aprendo, não desisto, não melhoro: teimo em pedir o impossível e fazer cara feia quando ganho pouco. Tudo bem. Acho mais bonita a insatisfação de quem quis o infinito e não conseguiu do que a satisfação dos que aceitaram viver contentes na miséria. Vejo um certo charme na melancolia de quem se debruça sobre os cadáveres de todos os seus sonhos mortos, num cemitério já superlotado, e ainda assim prossegue sonhando - e sonhando que algum sonho, pelo menos, não morra. Estou decidido a não virar mendigo de porta de padaria, vivendo de migalhas de pão e se resignando com aquilo que nem os cachorros se alegrariam de comer. Não nasci para comer migalhas.

Minha atitude frente à vida agora vai ser igual a de alguém que assalta a doceria.