quinta-feira, 29 de dezembro de 2005

-- meus 15 filmes de 2005 --




(Só listinha.)

15. HELTER SKELTER [Director's Cut], de John Gray (EUA)
14. MAR ADENTRO, de Alejandro Amenábar (Espanha)
13. O GUIA DOS MOCHILEIROS DA GALÁXIA, de Garth Jennings (UK)
12. QUERIDA WENDY, de Thomas Vinterberg (EUA/Dinamarca)
11. A INTÉRPRETE, de Sydney Pollack (EUA)
10. MACHUCA, de Andrés Woods (Chile)
09. MARIA CHEIA DE GRAÇA, de Joshua Marston (Colômbia/EUA)
08. LAST DAYS, de Gus Van Sant (EUA)
07. O SEGREDO DE VERA DRAKE, de Mike Leigh (UK)
06. A NOIVA CADÁVER, de Tim Burton (EUA)
05. OLDBOY, de Chanwook Park (Coréia do Sul)
04. O JARDINEIRO FIEL, de Fernando Meirelles (EUA)
03. EDUKATORS, de Hans Weingarther (Alemanha)
02. MANDERLAY, de Lars Von Trier (Dinamarca)
01. MARCAS DA VIOLÊNCIA, de David Cronenberg (EUA)

terça-feira, 27 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 1



FIONA APPLE
Extraordinary Machine (versão Jon Brion)




"Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade: é a natureza da sua origem que a julga. (...) Basta, no meu entender, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo."
RILKE, Cartas a Um Jovem Poeta.

"I'm underwater most of the time, and music is like a tube to the surface I can breathe through."
FIONA APPLE, entrevista à revista SPIN.


Não tem jeito: pra que vocês possam entender porque dei a medalha de ouro para "Extraordinary Machine", minha pepita predileta de 2005, num tem como eu fazer uma resenha "objetiva" demonstrando por A + B que esse é de fato o disco de "maior qualidade" - nem tenho essa pretensão. Uma resenha ego-tríptica se impõe (e cada vez acho mais que pra falar de música direito você tem sempre que partir mais pro subjetivo): vou ter que contar mais um pouco (já fiz isso antes...) sobre como essa garota-gênia, miss Fiona Apple, arrumou um jeito de ir se enfiando mais e mais no mais profundo do meu coraçãozinho (UI!).

Digo mesmo que a minha relação com a Fiona é muito mais do que musical: não é só somente um gosto que tenho pelas harmonias e melodias, pela qualidade e pelo timbre da voz dela, pela virtuosidade do desempenho... Tem algo mais: uma conexão mais próxima, uma identificação mais forte, uma admiração que tem muito mais a ver com a pessoa que ela é do que com a música que faz. Diria até que minha atração pela Fiona, mais do que musical, é existencial. Sinto que ela é pra mim uma espécie de SOUL SISTER. E claro que não consigo evitar, quando meu senso de ridículo está desligado, que se levantem na minha fantasia uns sonhos de amores impossíveis que é melhor nem descrever. Fiona Apple é pra mim algo como o protótipo da Garota Ideal, aquela que, bem sei, não existe - mas que minha mente insiste em fabricar... pra brincar de se decepcionar.

Gosto mais dela Fiona Apple do que de qualquer outra cantora que eu conheço. E não quero ficar erguendo meus gostos particulares ao status de dogmas ou verdades objetivas, dizendo que ela é "melhor" do que a Patti Smith, a PJ Harvey, a Billie Holliday, a Aretha Franklin, a Ella Fitzgerald, ou qualquer outra deusa... Só relato as verdades do meu coração. E lá a Fioninha reina suprema. Mais importante ainda: me identifico com tudo que ela escreve - e acho muito essencial notar que, para a Fiona Apple, o que está sendo dito parece ser muito mais revelante do que a música em si. Quem ouvir a música dela sem prestar atenção nas letras vai estar deixando escapar o fundamental.

Foram longos seis anos de sumiço desde "When The Pawn...", o segundo disco, e o trabalho de parto parece ter sido complicadíssimo. Ao contrário do que alguns poderiam esperar, Fiona Apple, que em 1996/1997 era uma das maiores pop-stars no firmamento da música pop americana, retornou sem grande espetáculo e barulho. Discreta e quietinha, lançou seu "Extraordinary Machine" sem causar grande comoção pública, até porque não há nada por aqui realmente com cara de hit. Estranho? Sim, por um lado: seria de se esperar que uma artista que já tem cerca de 5 milhões de discos vendidos no currículo fosse atacar de novo o topo das paradas, e que o disco novo fosse restituir à Fiona o papel de porta-voz de toda uma geração de adolescentes inteligentes, desajustadas e melancólicas. Não foi exatamente o que ocorreu.

Por outro lado, isso não chega a surpreender quem conhece a trajetória dela e a relação sempre problemática que ela tem com a fama. No passado, ao mesmo tempo em que era estampada na capa de quase todas as revistas de música e entretenimento dos EUA e da Inglaterra, parecia insistir num discurso que dizia que o conteúdo é mais importante do que a embalagem e as letras mais importantes do que o jogo de imagens. Desfilava nos tapetes vermelhos do show-bussiness ao lado de namorados famosos (o mágico David Blaine e o cineasta Paul Thomas Anderson), ao mesmo tempo que se mostrava bastante ofensiva, raivosa e desajeitada em relação ao mundo das celebridades e do sucesso popular.

Se desfazia em lágrimas em uma série de entrevistas, demonstrando uma certa fobia de estar ali, à mostra, sendo continuamente julgada, criticada e notada; ao invés de se fingir de perfeitinha, como fazem tantas pop-stars, demonstrava sem nenhum pudor suas neuroses, seus traumas e suas histerias, inclusive contando abertamente o caso de seu estupro aos 12 anos de idade e histórias sobre suas sessões de psicoterapia. Em 1997, quando foi receber o seu MTV Music Award, fez um discurso que alguns interpretaram até mesmo como totalmente niilista ("This world is bullshit!", cuspiu com raiva para milhões de telespectadores), quando era óbvio que ela estava reclamando não contra a vida em geral, mas contra o Mundo MTV das celebridades de plástico. Em entrevista à SPIN, chegou mesmo a prometer seu suicídio, dizendo que tinha certeza que iria morrer jovem (veja aí embaixo). Não, Fiona Apple não era só mais uma garota como qualquer outra: desde o começo, ficou claro para todos que ela era alguém ESPECIAL.



"Tidal", o disco que ela lançou em 1996 e que a tornou mundialmente famosa aos 19 aninhos de idade, me parece um disco que indica bem a ambivalência de Fiona em relação ao sucesso: por mais excelente que seja, é um álbum um tanto heterogêneo e indeciso quanto aos rumos a tomar. O pop-rock radiofônico de "Sleep To Dream" e "Criminal" parece algo feito pra fazer sucesso e tocar no rádio comercial, enquanto que as lentas e doloridas baladas jazz como "Never is a Promise", "Sullen Girl" e "Pale September", por exemplo, são coisas totalmente inadequadas à rádio FM e que apelam muito mais para fãs de Billie Holliday do que para uma audiência MTV.

Não que eu não goste do álbum - muito pelo contrário. Ouvi "Tidal" com uma obssessão maníaca, até decorar quase todas as músicas e letras, e até hoje acho difícil de acreditar que um disco desses possa ter saído da alma de uma garota tão jovem. Tudo bem, esse já se tornou um clichê sobre Fiona Apple: 90% dos textos escritos sobre ela se mostram pasmos com a qualidade da música e da poesia dessa garota prodígio que, aos 19 anos, lançou um disco que tinha uma profundidade lírica, um carregamento de sentimento, uma performance tão madura e tão complexa, que parecia realmente inacreditável que aquela garotinha magricela pudesse ter sido a criadora daquilo. "Tidal", falando sério, está entre os meus discos prediletos dos anos 90. "When The Pawn...", disco de menor impacto, mas de qualidade igualmente alta, também me ganhou inteiramente. E as palavras de Fiona... eu gostaria de pichá-las na parede do meu quarto:

"You say you'll never let me fall
from hopes so high
But 'never' is a promise
and you can't afford to lie"


Ou

"I lie in an early bed thinking late thoughts
Waiting for the black to replace my blue
I do not struggle in your web
Cause it was my aim to get caught"


Ou

"Honey, I don't feel so good, don't feel justified
Come on put a little love here in my void"


Ou

......




UMA LONGA GESTAÇÃO

Já se tinham passado uns 5 anos depois do lançamento de "When The Pawn..." quando me vi um tanto preocupado com a desaparição de Fiona: terá ela desistido da música? Entrou numa crise de inspiração incontornável? Vai parar de lançar discos? Se desiludiu com o sucesso e resolveu voltar à vida pacata? Fui buscar, como muitos outros, algumas informações sobre um provável terceiro disco que eu aguardava salivando. A internet, principalmente a partir de 2004, começou a se encher de histórias e boatos a respeito de "Extraordinary Machine": muitos garantiam que o álbum estava finalizado desde Maio de 2003, mas que a gravadora Sony havia se recusado a lançá-lo por falta de um single com potencial radiofônico, o que gerou uma onda violenta de protestos dos fãs.

Além de uma campanha internética chamada Free Fiona, que envolveu dezenas de sites e blogs, os fãs chegaram até mesmo a organizar protestos frente à sede da gravadora nos Estados Unidos exigindo que o álbum fosse posto no mercado imediatamente - o que a multinacional se recusou a fazer (pelo menos era o que se contava), aparentemente por um desejo de forçar Fiona a regravar o material ou ao menos tirar da cartola algum hit que repetisse o fenômeno "Criminal"... Todos diziam que havia ocorrido com "Extraordinary Machine" algo bastante semelhante ao que houve com outro famoso álbum recusado pelo mercado fonográfico mainstream por ser anti-comercial, o "Yankee Hotel Foxtrot" do Wilco: o material proibido vazou para a Internet.

Foi somente em 2005, às vésperas do lançamento oficial do álbum, que outra versão da história passou a circular: se dizia que, na verdade, não era só a gravadora que estava insatisfeita com o material gravado, mas a própria Fiona não havia curtido muito as gravações feitas com o produtor Jon Brion (que trabalhou, por exemplo, com Aimee Mann), contratando Mark Eliozondo para regravar "Extraordinary Machine" quase na íntegra. Que fique claro: o "Extraordinary Machine" que é, pra mim, o melhor disco desse 2005, é a "versão Internet", produzido por Jon Brion e que NÃO FOI LANÇADO OFICIALMENTE. Seria muito chato ficar aqui comparando em minúcias os dois álbuns, como fazem os fãs (na comunidade do Orkut, por exemplo); só digo que a versão Internet me pareceu imensamente superior: mais ousada, mais revolucionária, mais genuína, com uma sequência de faixas melhor pensada. Na dúvida, ouçam os dois.

Eu demorei pra me entender com "Extraordinary Machine". Minhas expectativas estavam tão altas que eu temia, antes da primeira orelhada, uma gigantesca decepção. Cheguei até mesmo a cogitar a possibilidade de não ouvir a versão do álbum que estava circulando pela Internet, que poderia ser somente um ajuntado de rascunhos e de músicas ainda não finalizadas, e esperar o lançamento oficial. Claro que a minha imensa curiosidade não me deixou levar adiante esse projeto. As primeiras audições realmente me deixaram um tanto apático e sem grandes entusiasmos: o álbum me pareceu um tanto "sem sentimento", com pouca musicalidade e muito ritmo bruto, muitas vezes pouco musical, beirando às vezes o atonal... A "dramática" Fiona Apple tinha parado de fazer drama e tinha se tornado mais amarga, mais realista, mais pé-no-chão. Cheguei mesmo a suspeitar que a Sony pudesse ter se recusado a lançar o álbum por razões diferentes das imaginadas por todos: não por se tratar de uma obra de arte grandiosa e cheia de méritos que continha o pequeno empecilho de não parecer lucrativa, mas simplesmente por ser um disco que não era bom o suficiente...

É que "Extraordinary Machine" não é desses discos fáceis de gostar "de cara": seus encantos estão velados, escondidos, e exigem um "trabalho de mineração" para serem descobertos. Esse é o Kid A de Fiona Apple. É como conhecer uma garota um tanto excêntrica e esquisita, que inicialmente não nos faz sentir nenhuma ardente atração, e que depois que a vamos conhecendo e com ela nos familiarizamos, começamos a amar. E com um amor muito maior do que aquele que poderíamos oferecer a uma outra garota que, a princípio, nos deixou boquiabertos e sem fôlego, mas que depois desceu no barranco da nossa afeição.

Esse é mesmo o disco mais esquisito e fora do padrão que Fiona já lançou, e leva um certo tempo até que a familiariedade se constitua e a relação engrene. Mas quando engrena... No meu caso, eu me vi voltando e voltando e voltando à "Extraordinary Machine", tentando desvendar seus segredos, decifrar o sentido de seus versos, sacar os porquês das coisas soarem como soam... E depois de audições repetidissímas (certeza absoluta que ouvi esse disco mais que qualquer outro durante esse ano) comecei a admirar profundamente essa pérola que demorou tanto para ter seu brilho reconhecido...

Um disco um tanto amargo, sim, como amarga parece ser a vida para Fiona Apple. O refrão da primeira música já chega proibindo o sentimentalismo: "This is not about love, cause i'm not in love!", nos certifica a pequena Apple, que realmente parece se apaixonar e se desapaixonar umas cinquenta vezes ao ano: "In fact, i can't stop falling out...". A música de Fiona Apple, numa visão simplista, pode mesmo ser entendida como um reincidente protesto contra os homens e uma série de reclamos sobre a impossibilidade de um amor satisfatório. Fiona é o tipo de pessoa que poderia ter escrito frases como "É impossível amar e ser feliz ao mesmo tempo" ou "Il n'y a pas d'amour heureux". A melhor maneira para responder à questão "do que falam as canções de Fiona Apple?" é dizer: falam sobre relacionamentos humanos fracassados e das reclamações e xingamentos que Fiona cospe fora como desabafo por suas decepções...

Desde reprovações contra a imaturidade do amado ("I tought he was a man but he was just a little boy"), contra a incapacidade de resistir a certas tentações ("Oh it's evil, babe, the way you let your grace enrapture me..."), contra as provocações que tentam suscitar a ira ("You wave the red flag, baby, you make it it run... You fondle my trigger than you blame my gun!"), contra a paixão que surge por uma pessoa sem méritos ("It doesn't make sense I should fall for the kingcraft of a meritless crown"), entre muitas outras, tornam a música de Fiona Apple uma galeria de numerosas reclamações contra esses seres abomináveis e sádicos que são os homens. Eles, no fundo, não prestam; mas a desgraça é que ela vive sem eles.

A pobre Fiona não entende nada sobre diamantes e porquê os homens os compram: "o que há de tão impressionante num diamante?", canta ela em "Red Red Red", segunda música de E.M., e a gente pode sentir a evidência do desapontamento que ela sente por ser cumulada de presentes caros quando tudo o que queria, talvez, era um pouco de sentimento sincero e amor ofertado... A única coisa de impressionante que há num diamante é a mineração, "and it's dangerous work trying to get to you too / and i think that if I didn't have to kill, kill, kill, KILL MYSELF doing it / I wouldn't think so much of you"...

Também a confiança perdida no amado e confidente é lastimada: em "Not About Love", ela reclama contra uma certa pessoa que lhe retirou confidências e depois as utilizou para piadinhas, desprezo e munição para a artilharia: "It doesn't seem right to take information given at close range / For the gag, the bind and the ammunition round!".

Na belíssima balada "Oh Well", a que mais faz relembrar os tempos de "Tidal", reclama que recebe como pagamento por sua "calma afeição" um olhar que perscruta as imperfeições e julga com olhar severo: "When I was watching you with calm affection / You were searching out my imperfections...". E depois completa com um refrão ao mesmo tempo doloroso de decepção e banhado em raiva: "What wasted unconditional love / On somebody who doesn't believe in this stuff!".

O bom é que uma certa dose de bom-humor vem salvar a música de Fiona de ser piegas, sentimentalóide ou choramingas. Em "Get Him Back", por exemplo, ela narra suas desventuras com uma série de sujeitos que demole com expressões cáusticas e desdenhosas, até cometer um verso adorável, talvez o mais applesco dos versos de Fiona Apple, o que melhor define sua música e seus sentimentos: "I think he let me down when he didn't disappoint me!"...

"I'm good at being uncomfortable", canta na faixa-título, num verso ao mesmo tempo divertido e melancólico, "so I can't stop changing all the time". Fiona Apple é isso: uma garota que parece sempre insatisfeita e que, exatamente por isso, está sempre se mexendo e se transformando e tentando se auto-superar. Em "Please Please Please", canta com uma certa ironia: "Nós podemos ouvir nosso triste cérebro gritando: 'Nos dê algo familiar, algo similar ao que já conhecemos! Algo que vá nos deixar estagnados! Parados, parados, indo a lugar nenhum...". Com "Extraordinary Machine", ela não atendeu ao desejo desse "triste cérebro coletivo": nos deu um disco aventureiro, ousado, maduro, diferente de tudo o que se pode ouvir hoje em dia, inclassificável e inimitável. Eis um disco que possui uma beleza sem pompa e sem fogos de artifício, mas que acaba tendo a capacidade de durar bem mais do que as belezas de espetáculo.

A arte de Fiona Apple também tem uma característica essencial: é extremamente pessoal. O que está em jogo aqui não é uma tentativa de fazer sucesso, ganhar rios de dinheiro, agradar o público a qualquer preço: tudo o que Fiona quer é expressar tudo o que vai dentro de sua alma, como grande artista que é, inclusive (e sobretudo...) as melancolias, as frustrações, os segredos íntimos, as feridas abertas... Rilke dizia que somente uma obra de arte que nasce por NECESSIDADE VITAL é realmente boa, uma idéia com a qual eu sempre concordei. Fiona Apple me parece ser um bom exemplo: tudo que ela canta parece ser de extrema importância para ela, de modo que ela nunca solta um verso sequer que não tenha um significado pessoal ou um impacto emocional para ela. Essa música, que Fiona faz mais pra si mesma do que para os outros, parece ser mesmo como um tubo de oxigênio que ela, submersa a maior parte do tempo, usa para conseguir continuar respirando, e que nos ajuda, também, a lançar ar puro para nossos pulmões.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

LISTINHAS. Fiz uma seleção com as listinhas de melhores do ano das principais revistas musicais do mundo pra fazer um painel geral do que a crítica considerou os melhores álbuns desse 2005. Tá meio zoneado mas acho que dá pra entender:

MOJO
1 - Antony & The Johnsons, "I’m a bird now";
2 - Arcade Fire, "Funeral";
3 - Kate Bush, "Aerial";
4 - Bruce Springsteen, "Devils & dust";
5 - My Morning Jacket, "Z";
6 - Ry Cooder, "Chavez Ravine";
7 - The Magic Numbers, "The magic numbers";
8 - Malcolm Middleton, "Into the woods";
9 - Amadou & Mariam, "Dimanche à Bamako";
10 - Richard Hawley, "Coles corner";

LONDON BURNING
01. MEW - And the Glass Handed Kites;
02. SERENA MANEESH - Serena Maneesh;
03. SIGUR RÓS - Takk;
04. BRIGHT EYES - I´m Wide Awake, It´s Morning / Digital Ash...;
05. BLOC PARTY - Silent Alarm;
06. M83 - Before the Dawn Heals Us;
07. ART BRUT - Bang Bang Rock´N´Roll;
08. THE MAGIC NUMBERS - The Magic Numbers;
09. ANTONY & THE JOHNSONS - I am A Bird Now;
10. THE RAKES - Capture/Release.

PITCHFORK
01. SUFJAN STEVENS. illinois.
02. KANYE WEST. Late Registration.
03. ART BRUT. Bang Bang Rock and Roll.
04. M.I.A. Arular.
05. ANTONY AND THE JOHNSONS. I Am a Bird Now.
06. DEERHOOF. The Runners Four.
07. ANIMAL COLLECTIVE. Feels.
08. LCD SOUNDSYSTEM. Idem.
09. CAM`RON. Purple Haze.
10. WOLF PARADE. Apologies to the Queen Mary.

METACRITIC
01. SUFJAN STEVENS. Illinois.
02. MY MORNING JACKET. Z.
03. ISOLÉE. Wearemonster.
04. LIGHTNING BOLT. Hypermagic Mountain.
05. ANTONY AND THE JOHNSONS. I Am a Bird Now.
06. SLEATER-KINNEY. The Woods.
07. M.I.A. Arular.
08. CLAP YOUR HANDS SAY YEAH!. idem.
09. KRAFTWERK. Minimum-Maximum [Live].
10. THE GO! TEAM. Thunder, Lightning, Strike.

POP MATTERS
01. THE NEW PORNOGRAPHERS. Twin Cinema.
02. SUFJAN STEVENS. Illinois.
03. ANTONY AND THE JOHNSONS. I Am a Bird Now.
04. M.I.A. Arular.
05. SPOON. Gimme Fiction.
06. ANDREW BIRD. And The Misterious Production of Eggs.
07. THE HOLD STEADY. Separation Sunday.
08. SLEATER-KINNEY. The Woods.
09. OKKERVIL RIVER. Black Sheep Boy.
10. DECEMBERISTS. Picaresque.

NME (NEW MUSICAL EXPRESS)
01. "Silent Alarm", Bloc Party
02. "Funeral", The Arcade Fire
03. "You Could Have It so Much Better", Franz Ferdinand
04. "I Am a Bird Now", Antony and the Johnsons
05. "Employment", Kaiser Chiefs
06. "Get Behind Me Satan", The White Stripes
07. "Illinoise", Surfjan Stevens
08. "Late Registration", Kanye West
09. "Down in Albion", The Babyshambles
10. "Demon Days", Gorillaz

Q
01. "X & Y", Coldplay
02. "Demon Days", Gorillaz
03. "Employment", Kaiser Chiefs
04. "Don't Believe the Truth", Oasis
05. "I'm Wide Awake, It's Morning", Bright Eyes
06. "Back to Bedlam", James Blunt
07. "You Could Have It so Much Better", Franz Ferdinand
08. "Funeral", The Arcade Fire
09. "Eye to the Telescope", KT Tunstall
10. "Stars of CCTV", Hard-Fi

Uncut
01. "Funeral", The Arcade Fire
02. "Illinoise", Surfjan Stevens
03. "No Direction Home: the Soundtrack", Bob Dylan
04. "Black Mountain", Black Mountain
05. "Alligator", The National
06. "A Bigger Bang", The Rolling Stones
07. "LCD Soundsystem", LCD Soundsystem
08. "Get Behind Me Satan", The White Stripes
09. "You Could Have It so Much Better", Franz Ferdinand
10. "Want Two", Rufus Wainwright

BIG MUFF
01. SLEATER-KINNEY, "The Woods"
02. RYAN ADAMS, "Cold Roses"
03. BRIGHT EYES, "I'm Wide Awake It's Morning""
04. MY MORNIG JACKET, "Z"
05. PATO FU, "Toda Cura Para Todo Mal"


DIRTY LITTLE MUMMIE
oficialmente, foi publicado assim:

01. FIONA APPLE. Extraordinary Machine (Jon Brion).
02. JOHN FRUSCIANTE. Curtains.
03. DEVIN DAVIS. Lonely People Of The World, Unite!
04. SLEATER-KINNEY. The Woods.
05. THE WHITE STRIPES. Get Behind Me, Satan.
06. HOT HOT HEAT. Elevator.
07. JACK JOHNSON. In Between Dreams.
08. WALLFLOWERS. Rebel, Sweetheart.
09. BRENDAN BENSON. Alternative to Love.
10. FRANZ FERDINAND. You Could Have...

mas já mudei de idéia sobre várias coisas: TOP 25 atualizado AQUI.

domingo, 18 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

#2


JOHN FRUSCIANTE
Curtains


John Frusciante teve uma divina diarréia criativa em 2004 e começou a gravar discos como se fosse um coelho parindo filhotes: foram, no total, 6 álbuns... O cara, que é para quase todo mundo só o guitarrista dos Red Hot Chilli Peppers, demonstra cada vez mais que tem uma carreira-solo que parece muito mais importante para sua vida do que a música que faz com sua banda principal: é nos seus discos-solo que ele põe toda sua energia, toda sua alma, todo seu imenso talento. E segue povoando o mundo com sua arte de precipício, com sua música de dançarino de parapeitos, com sua alma esquartejada em formato de canção... Conto a vocês um segredo: Frusciante é a mais nova encarnação de Buda, é o profeta-poeta de uma nova seita de redenção do sofrimento, gênio-louco que veio para nos iluminar o caminho com sua sabedoria-demência e sua cosmo-visão!

Ainda acho que a obra-prima é o Shadows Collide With People, ao mesmo tempo épico e trágico, dolorido e viajante, como que um Macbeth da música pop. Mas Curtains, último álbum da enxurrada, finalizado em dezembro de 2004 (e que chegou nos aparelhos de som de quase todo mundo só em 2005), é um álbum peculiar na discografia do cara e, certamente, um dos mais belos. Mais humilde e quietista, com um certo intimismo e vários silêncios eloquentes, “Curtains” é o disco em que os violões e pianos tomam o lugar das guitarras. Surge por aqui uma forma nova de melancolia, uma nova e devastadora maneira que Frusciante encontra para retirar da tristeza mais terrível a mais sublime beleza.

Essas músicas são capazes de arrancar cachoeiras dos meus olhos e arrepios da minha alma como poucos, talvez mais que qualquer outro disco da história da música pop que eu conheça: mais que o Closer ou o Unknown Pleasures, mais que o Tidal, mais que o Songs of Love and Hate, mais que o Ok Computer ou o Hail To The Thief... Sei: os que seguem a religião do prazer à qualquer preço podem argumentar que arrancar lágrimas de alguém nunca foi parâmetro pra julgar o valor de nada, muito pelo contrário: "se te faz chorar, por que seria bom?" É que me acontece às vezes o desejo estranho de ser tomado por sentimentos intensos, algo que escape desse esquema banal de diversões e futilidades... E são gostosas as purificações lacrimais: é como uma divina água que corre de dentro pra fora, levando consigo algo como demônios e pesares diluídos...

A base de Curtains é John Frusciante largado no chão de seu quarto com um violão e um gravador de quatro canais, cantando bem como nunca, sem medo de gritar sem a companhia do barulho, furando o silêncio com o punhal da sua garganta... Depois se ornamentou esse esqueleto de violão e voz com pianos, solos de guitarra, efeitos eletrônicos, o que não impede que esse seja o álbum mais despojado e acústico da carreira do cara. Seu talento como músico, que os seus dois primeiros álbuns solo colocavam em dúvida, está evidente, por exemplo, no solo de violão que termina "The Past Recedes" ou nos guitarrismos catárticos que são o clímax de "Anne". Seu talento como poeta brilha em quase todos os seus versos - que prosseguem sombrios e misteriosos.

Curtains é provavelmente o disco em que John se mostra mais sereno, mais autêntico, mais "ele mesmo", sem nenhum sinal perceptível de pose, imitação ou cinismo. Eis um cara que me ensinou algo que eu não posso deixar de considerar como uma sabedoria de vida, e que parece consistir no seguinte: ao invés da repressão das angústias e da insistência nos sorrisos fabricados, prefere expressar tudo que vai dentro do seu coração. Quando tem raiva, grita como um doido, até passar. Quando está melancólico, canta a mais melancólica das canções. Parou de lutar contra a tristeza: se satisfaz em expressá-la, e se salva dela através dessa expressão.

Lembro de ter lido em algum livro de filosofia, já não me lembro qual, a seguinte anedota: o mestre budista pergunta pra seu discípulo o que deve fazer o Iluminado quando recebe uma paulada na cabeça. O discípulo diz: “Não deve se abalar, deve suportar a dor, calar o grito que sente na garganta, se resignar ao seu destino, aceitar o sofrimento que é inerente à existência humana...”. O mestre discorda: “Mas não, ficar reprimindo a expressão do sofrimento não é aceitar o sofrimento... O Iluminado, quando recebe uma paulada, faz isso: berra de dor!” Frusciante me deu uma lição parecida: não conseguimos ser felizes, a maioria de nós, porque fingimos ser alegres o tempo inteiro; não ousamos botar pra fora todos os maus sentimentos que, por ficarem no interior, meio reprimidos e inexpressados, nos bloqueiam o caminho para uma felicidade mais verdadeira. Expressar é exteriorizar. Aquele que só exterioriza alegria e clarões, deixa dentro de si justamente aquele material que deveria ser lançado fora... Algo assim.

Frusciante espalha versos extremamente soturnos por todo o disco ("Life is soooo saaaad!", chora em “Leap Your Bar”; "I see the hope running low. We never found our way home. There is no hope, there are no dreams", canta na desolada "Hope"), mas acaba soando em estado de extrema elevação, talvez dotado de uma felicidade muito mais pura do que aquela que podem conseguir aqueles cujo único serviço na vida é fingir que são alegres o tempo inteiro. "I'm ascending endlessly and I don't even have to try", canta no refrão de "Ascension", e não se trata de simples jogo poético. Qualquer um que ouça Curtains com o coração aberto vai ficar com a impressão de que Frusciante realmente está subindo e subindo e subindo, o mais improvável dos Ícaros, montado nas asas da angústia, rumo ao céu na Terra: I-lu-mi-na-do!...

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ÚLTIMOS FILMES

(faz tempo q ñ atualizo o screening lá dentro - logo faço isso.)
(azulzinho é o que eu realmente recomendo q cês assistam.)

O OPERÁRIO (The Maquinist, de Brad Anderson) - 5.2
HELTER SKELTER [Director's Cut] (de John Gray, EUA, 2004) - 6.8
SPIDER (de David Cronenberg, 2002) - 7.3
CALAFRIOS (Shivers, de David Cronenberg, 1975) - 7.2
ESCOLA DE ROCK [2a] (School Of Rock, de Richard Linklater, 2004) - 7.5
QUANDO FALA O CORAÇÃO (Spellbound, de Alfred Hitchcock, 1945) - 4.5
BUTCH CASSIDY (de George Roy Hill, EUA, 1969) - 6.0
LAST DAYS (de Gus Van Sant, EUA, 2005) - 8.0
GUIDO DEVE MORRER (dos "Irmãos Di Giacomo", Brasil, 2005) - 7.0
QUANTO VALE OU É POR QUILO? (de Sérgio Bianchi, Brasil, 2005) - 3.5
NAKED (de Mike Leigh, Inglaterra, 1993) - 9.7
OS INCOMPREENDIDOS (The 400 Blows, de François Truffaut) - 5.8
NO DIRECTION HOME (de Martin Scorcese, EUA, 2005) - 7.7
OS SONHADORES (The Dreamers, de Bernardo Bertolucci) - 7.8
UMA LIÇÃO DE VIDA (Wit, de Mike Nichols, 2001) - 5.5
VIDEODROME (de David Cronenberg, 1982) - 8.1
MANHATTAN (de Woody Allen, 1979) - 9.1
ANOS DE REBELDIA (Out Of The Blue, Dennis Hopper, 1980) - 8.9
A PAIXÃO DE JOANA D'ARC (de Carl Th. Dreyer, 1928) - 9.5
KING KONG (de Peter Jackson, 2005) - 3.5

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Blog de férias até depois do Natal. Vou ficar totalmente longe da internet - nenhum post, e-mail, scrap, MSN ou comments por uma semana. Vamos ver se um pouco de mar, de horizonte, de vento, de pôr-do-sol e de maresia acaba por espantar esse meu climão deprê de ultimamente...

"I'll let the damn breeze dry my face..."

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Pena que disco ao vivo num pode entrar num TOP 10 de verdade, porque o "Kicking Television", disco duplo do Wilco - live in Chicago em turnê do A Ghost Is Born - é de longe um dos melhores discos do ano. Mas eu sou muito suspeito pra falar: essa é uma das cinco bandas da minha vida.

COMMENT (inédita):

Watch out for your friends
Or they may lose in the end
Sometimes a child'll make you sin
What is a man without a friend?

We all live within a game
Where one excuse has many names
When true friends really come
You can't afford to lose one.

Oh, man, we're truly brothers!
Why, then, we hurt one another?
Love and peace from ocean to ocean.
Somebody please second my emotion!

Oh, man, we're born to free, yeah!
What about you, what about me?
This world is filled with hate!
There's nothing left!

If you enslave me
You'll never rescue yourself.

Jealousy, as I recall
It's always been men's hardest fault
To conquer fear that's quite a quest
Until we do, never rest!

A child was born yesterday
Nothing but a inoccent babe
Someone spoured a bitter seed
How can it grow but a bitter weed?

So, sadie, how can you teach
If you don't practice what you preach?

If all men are truly brothers
Why then can't we love one another?
Love and peace from ocean to ocean.
Somebody please second my emmotion!

Oh, man, we're born to free, yeah!
What about you, what about me?
This world is filled with hate!
There's nothing left!

If you enslave me you'll only hurt yourself!

Hey you, i wanna know, i wanna know why man!
With all your riches and your fancy things...
How many friends can you truly say you have?

quinta-feira, 15 de dezembro de 2005

Querido Diário, a verdade é que

EU SÓ ME FÔDO.



Esse foi, de longe, um dos dias mais tristes, horríveis, insuportavelmente dolorosos da minha vida... O choque foi forte, traumático, violento, tanto que eu ainda tô aqui, deitado na lona... Vou parar com um tempo com o TOP 10 porque eu simplesmente preciso desabafar, tentar vomitar pra fora de mim todo esse mal-estar, raiva, indignação e sensação-de-ser-um-pedaço-de-merda que eu tô sentindo. Estou todo esparramado pelo chão, nocauteado, com todos os ossos quebrados, e não sei se tenho a força pra voltar a me erguer...

O que eu sei é essa quarta-feira era pra ter sido aquela da minha Libertação: seria meu último dia com os pés sobre a Unesp-Bauru, meus últimos momentos nessa penitenciária de onde, pensava eu, eu estava pronto a fugir. Imaginem a cena: o aluninho, palpitante de expectativa, chega todo orgulhoso para mostrar aos Mestres da Banca Examinadora seu Trampo de Conclusão, certo de ter realizado algo de decente, digno de um 9, quem sabe até mais. Fora o nervosismo que a gente sempre sente antes de datas importantes, eu tava extremamente confiante na qualidade do meu trabalho. Claro que ia ser aprovado. E aí veio o murro na cara que me deixou todo quebrado, até agora...

Nem começo a apresentar: a Banca pede que eu saia da sala para "conversar". Volto dez minutos depois e me anunciam: a Banca recomenda que você não apresente esse trabalho...Quarenta minutos depois, após ouvir uma enxurrada de justificações para essa decisão de me reprovar sem nem mesmo me ouvir, saí daquela sala completamente arrasado, como se alguém tivesse acabado de me tacar pra dentro do poço e eu tivesse acabado de bater no fundo. Foi um dos choques mais brutais que eu já senti na vida - como se eu fosse um copo quente posto debaixo de água gelada e me desfazendo em cacos, por dentro. Perdido, totalmente perdido, e louco de indignação e de tristeza, mal conseguia reter as minhas lágrimas andando pelo câmpus. Acho que em nenhum outro momento da minha vida eu precisei correr prum banheiro público, me trancar dentro do cubículo, deixar meu corpo cair no chão e chorar, chorar, chorar... Esparramado no chão, quase que abraçado à privada, ouvindo o silêncio de Deus e o riso triunfante de Murphy, e querendo somente morrer, desaparecer, sumir, bater com a cabeça na parede até tudo se apagar...

Até agora estou tentando entender porque doeu tanto...

É um sentimento horrível esse de ter desprezado, cuspido e severamente criticado algo que é importante pra caramba pra você... Algo que você fez com gosto, com tesão, com paixão, com todo o seu corpo e toda a sua alma, ser tratado pelas pessoas como lixo, como se não valesse nada, como se fosse um pedaço de merda...

É que a Watchtower não é somente um trabalhinho acadêmico como outro qualquer... Ela foi importante demais na minha vida para que eu possa aceitar numa boa que pessoas tão "renomadas" e "conceituadas" a desprezem com tanta convicção e com tanta insensibilidade... No fim de 2002, quando ela surgiu na Internet, eu nunca havia publicado nenhum de meus textos em lugar nenhum - tudo que escrevia ficava engavetado, bem guardado, escondido pelo meu medo de que não fosse bom o bastante. A Watchtower foi o primeiro lugar onde eu comecei a publicar meus textos, onde comecei a experimentar as reações do público, onde eu comecei a ter mais coragem para exibir para os outros as minhas criações... Pode ser que para quase todo mundo a Watchtower era somente mais dentre tantos e-zines sobre cultura pop que haviam na Internet - algo que certamente não era desprezível, mas também que estava longe de ser muito importante. Mas pra mim era diferente: a Watchtower, em certo momento da minha vida, era simplesmente minha razão para viver. Aquilo que colocava um pouco de sentido e orientação na minha vida. Aquilo pelo que eu lutava. Uma obra a criar, a aperfeiçoar, a melhorar.

A versão da Watchtower que eu apresentei como T.C.C., e que continha uma dúzia de textos publicados originalmente no Dirty Little Mummie, é algo que realmente me orgulha. Há textos ali que foram escritos ao longo de todos esses quatro anos de faculdade, a maioria deles feitos com o maior cuidado, dedicação e seriedade, todos eles escritos com paixão. Está ali concentrado uma imensa quantidade de tempo que eu dediquei para tentar fazer um lance decente e digno - e certamente também o Fred, o Edison, o Alan, o Diego e todos os outros contribuidores se esforçaram pra caramba pra me mandaram textos ótimos. É triste ver todo esse trabalho ser tacado no lixo com tanta pressa e com tanta convicção...

É claro que eu tô indizivelmente arrependido por ter escolhido o Nicola para ser minha banca. Alguém me explica como eu é que eu pude cometer uma idiotice dessas? Só chamei o cara porque alguns professores me recomendaram que ele, por ser um dos poucos na Unesp de Bauru que "manja" de Internet, cibercultura, novas tecnologias e coisas afins, deveria ser selecionado. Dois semestres "tendo aulas" com o cara - quem já foi aluno vai entender bem a razão dessas aspas - me deixaram um tanto desconfiado sobre esse "manjar", mas tudo bem... alguns meses atrás, quando fui entregar meu trabalho final de Jorn Comunitário II, comentei com ele sobre o meu projeto de T.C.C., e ele se mostrou bastante entusiasmado com a idéia da criação de uma revista digital sobre arte e cultura. Eu realmente pensava que o cara seria um entusiasta do projeto, que curtiria bastante a tentativa de um aluno partir para a área da Internet, ainda hoje muito incomum no mundo dos T.C.Cs.

Eu tinha me esquecido como o cara é bitolado, cheio de manhas infantis, preocupadérrimo com uma série de detalhes insignificantes, incapaz de aceitar qualquer modelo que fuja do que ele considera o Correto... E é extremamente revoltante o fato de que ele parece somente prestar atenção naquilo que não importa: o conteúdo dos textos, a qualidade das críticas, as idéias que estão ali, isso praticamente não entrou em consideração, mas somente a porra da TÉCNICA e do VISUAL.

Para o Nicola, por exemplo, é uma verdade universal, escrita lá no Livrinho de Regras de Deus-Pai, que site num pode ter barra de rolagem. Não digo barras de rolagens grandes demais: TODA E QUALQUER BARRA DE ROLAGEM. É o absurdo dos absurdos! Um erro imperdoável! Se um dia o fosse dado o poder por Nicola legislar nesse país, ele mandava prender todo webmaster que usa barra de rolagem (o que mandaria em cana cerca de 90% deles). "Você acha que o internauta tem paciência pra ficar rolando essa barrinha pra baixo?", ele teve a coragem de me perguntar. É um "erro sério de planejamento gráfico"... Deus meu.

Para o Nicola, também, a Watchtower usa a "fonte errada". Eu realmente não estava sabendo que havia uma Legislação nesse país que nos dissesse qual é a fonte certa. A Garamond e a Tahoma, que eu usava na Watchtower, pra mim tão ótimas: são bastante legíveis e tem um belo visual. Por que seriam "fontes erradas"?

Eu, inclusive, caso vocês não saibam, sou um vergonhoso exemplo de FALTA DE ÉTICA e de APROPRIAÇÃO INDEVIDA DO TRABALHO ALHEIO, além de um INFRATOR DA LEGISLAÇÂO DE COPYRIGHT (eu juro que num tô brincando), simplesmente porque as imagens usadas na Watchtower não vinham com o nome do fotógrafo ou o site de onde foram tiradas. "Isso é crime, sabia? Isso é crime! E nós estamos na Universidade Pública, a gente não pode permitir que um TRABALHO ILEGAL, que não respeita os copyrights, seja aprovado...!"...

Além do mais, é claro que é um erro seríssimo escrever textos do tamanho daqueles que por vezes eu escrevo. O Nicola, por exemplo, pediu pra que eu rolasse meu texto sobre o Frusciante até o fim - na SATÂNICA E INADMISSÍVEL BARRA DE ROLAGEM - enquanto ralhava: "Mas olha o tamanho desse texto, rapaz! Você acha que algum internauta tem paciência pra ler tudo isso? No mundo on-line tudo é mais veloz..." É claro que tentei argumentar que, pra fazer uma boa crítica, aprofundada e contextualizada, você precisa escrever bastante. Mas não adianta: estou proibido pelas autoridades professorais de escrever textos aprofundados, sofisticados, com construções frasais um tanto complexas e palavras que acho suculentas. Não pode. Não pode MESMO. O que eu devo fazer, basicamente, segundo a recomendação não-escrita desses palhaços, é escrever textinhos minúsculos, com nenhuma "palavra difícil", que acabem logo e que não cansem o leitor - já que o assim chamado "Público" é "preguiçoso". Devo NIVELAR POR BAIXO, enfim. É o que recomendam. Escrever pensando em agradar o tipo de sujeito que entra na Internet para ver o placar dos jogos de futebol, os sites pornô e o chat romântico... Escrever para os quase-analfabetos-funcionais que não aguentam ler mais de 10 linhas na sequência na Internet. Qualquer texto que EXIJA mais do leitor, um tempinho de dedicação e atenção, um certo esforço na decifração do texto, é PROIBIDO. No livrinho de Deus-Pai deve estar escrito que texto pra Web tem necessariamente que ser pequeno, superficial e babaca. E a Watchtower, é claro, é inaceitavelmente "um site que não tem linguagem adequada para a Web"... Não fiz "algo adequado ao meio que escolhi"...

A Dalva, por sua vez, centrou seu ataque em outros "defeitos inaceitáveis" do meu trabalho. Se eu entendi bem, a Watchtower NÃO É uma boa amostra do meu aprendizado ao longo do curso. Já que o T.C.C. "tem como objetivo justamente checar se o aluno aprendeu o suficiente e está pronto para o mercado de trabalho", nele teria que constar uma boa amostra de Conhecimento Extraído do Curso. Minha Watchtower, infelizmente, não parece ser exatamente o resultado do que aprendi na Unesp de Bauru, o que eu certamente concordo, mas muito mais o resultado de um aprendizado feito junto a outras fontes e outros "mestres", por assim dizer. Por isso, segundo a mestra, o site não pode ser aceito como um Trabalho de Conclusão de Curso verdadeiro. É demasiado "extra-curricular". Não é ACADÊMICO o suficiente. Faltaram aquelas citações imensas e chatérrimas de Adorno e Marcuse e Horkheimer e Benjamin e pós-modernos e o caralho a quatro pra deixar a coisa com um porte respeitável. Se você num enfia uns 50 livros na sua bibliografia, mesmo não tendo lido nem meia-dúzia deles, os desgraçados dos professores não te levam a sério. Se você tenta fazer um relatório em tom informal, despojado, sem excessos teóricos, eles acham "muito superficial". Aliás, quem sou eu pra dizer qualquer coisa sobre a "mercantilização da cultura"? Só quem pode falar disso são as Autoridades competentes: Adorno e tal.

"Você não pode apresentar um trabalho que dê a idéia de que, para fazê-lo, você nem precisaria ter entrado na faculdade!", foi mais ou menos o que ela me disse. E eu não sabia se eu ria ou se eu chorava. Eu nunca cheguei a imaginar que um professor fosse me censurar por eu ter tentado expandir meu conhecimento e minhas áreas de interesse para além do círculo fechado desse curso de jornalismo extremamente boqueta e revoltante da Unesp. Então eu não tenho o direito de fazer um trabalho utilizando tudo o que aprendi com os artistas, os filósofos, os cineastas, os poetas, os escritores, todos os grandes mestres que tive fora das paredes da Universidade? Tenho que me limitar a somente papaguear sobre o que os professores da Unesp me ensinaram durante o curso? Se tivessem me ensinado algo... Se num fossem quase todos uns picaretas, salafrários, cafajestes, superficiais, especialistas-bitolados e filhos-da-puta! Que absurdo fazer um trabalho que demonstra Conhecimento que não foi aprendido no Curso!...

O INACEITÁVEL, também, é que eu faça um trabalho que centra sua atenção muito mais no domínio da Arte e da Cultura do que propriamente no da Comunicação, algo que não se pode tolerar num aluno de Jornalismo! Como pode, um aluno de jornalismo fazendo um trabalho sobre cinema, música, literatura, filosofia, histórias em quadrinho! É "sair de sua área"... Que absurdo! Que ultraje! Tem que ser reprovado! Não podemos permitir um crime desses!...

Que coisa mais triste ficar só recebendo chicotada por meia hora, e praticamente nenhum elogio, por um trabalho que é o resultado do ESFORÇO DA MINHA VIDA, na verdade... Então é isso, saí pensando: nada do que eu fiz com a minha vida presta para essas pessoas. Para elas não interessa saber nada sobre cinema, música ou literatura. Acham os textos muito grandes, muito chatos e inadequados ao meio. Não tem gosto ou paciência para visitar esse site. Simplificando: não gostam nenhum pouco dele.

Uma pergunta: a Banca julga o aluno, mas quem é que julga a Banca? Se o aluno discorda dos métodos de avaliação da Banca, se pensa que a Banca está sendo idiota e retardada, se tem a sensação de que a Banca nem se deu ao trabalho de ler 30% do Trabalho feito, com quem o aluno deve reclamar? Se o aluno acha que foi julgado por uma pessoa que hiper-valorizou o menos importante (o projeto gráfico) e praticamente ignorou o que eu considero o essencial (o conteúdo, é claro), que tem que fazer? Ou tem que ficar quieto e respeitar as Autoridades Constituídas?

Eu nem queria colocar a Watchtower de volta no ar, até porque a maioria dos textos dela está aqui no Dirty Little Mummie, mas depois dessa reprovação, que eu num posso deixar de considerar injusta e revoltante, vou colocá-la de volta na rede como prova do meu orgulho por esse trampo. Fiz o que tinha que fazer. Agora vou pagar pela vista-curta e incompetência desses palhaços que nós chamamos de professores...

Bauru, 2006, aí vou eu!

E está comprovada mais uma: "Nada é tão ruim que não possa piorar".

Esse, amigos, é o site que PROVA que eu sou ANTI-ÉTICO e INFRATOR DE COPYRIGHTS, que NÃO APRENDI O SUFICIENTE NO CURSO DE JORNALISMO, que SOU INCAPAZ DE SINTETIZAR IDÉIAS e, finalmente, que sou INAPTO PARA O MERCADO DE TRABALHO... Um trabalho TÃO RUIM, mas TÃÃÃO RUIM, que nem chegou a merecer o direito de ser apresentado. Um indício sério de que eu não passo de um Pedacinho de Cocô. Eis aí: The Watchtower - versão TCC.

Por que tudo tem que ser tão difícil?

É o gene da loseridade no meu DNA, só pode ser.

A ditadura cósmica de Deus-Murphy, esse Grande Sarcástico...

Oh, yeah, baby: i was born to lose.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

#3


DEVIN DAVIS
Lonely People Of The World, Unite!


Devin Davis gravou este seu primeiro disco praticamente sozinho em seu estúdio caseiro, onde trabalhou por quase dois anos polindo e aperfeiçoando o que viria a se tornar uma obra-prima do power-pop contemporâneo. É incrível que um cara que... 1) tocou guitarra, violão, bateria e baixo; 2) fez os vocais principais e os de apoio; 3) escreveu todas as letras e melodias; 4) produziu e mixou o álbum... não tenha se perdido no meio de tantas tarefas acumuladas. Dá até pra xingar: "que sujeitinho mais individualista! Deve ter algum defeito de caráter, alguma fobia social, que o impede de conviver com uma banda..." Mas o resultado desse esforço pessoal nos faz questionar se é verdade que 4 ou 5 cabeças pensam mesmo melhor do que uma só. Nenhum disco de Rock nesse ano me empolgou mais do que essa pérola saída da mente de um garoto obscuro e nerdão de Chicago que traz em si o talento de uma banda inteira. Apesar da solidão que caracterizou o processo de composição e gravação, e que está explícita no título e em várias letras do álbum, não é esse o sentimento que domina o ouvinte de Lonely People Of The World, Unite!: eis um disco extremamente jovial, cheio de entusiasmo e juventude, que está muito mais provido de bom-humor e ânimo do que de melancolia. Esse é daqueles álbuns que são propositalmente curtos e concisos (35 minutos no total) para que não haja nenhuma possibilidade do ouvinte se entediar. Como no Pinkerton do Weezer ou no In Reverie do Saves The Day, dois discos que eu adoro, aqui dá pra curtir todas as músicas, de cabo a rabo, sem um único bocejo ou momento de aborrecimento. As próprias influências onde ele foi se alimentar parecem ser as bandas de rock cru e direto dos anos 60 e 70 que iam sempre direto ao essencial - os Kinks, os Beatles, os Sonics, o Big Star, os Zombies, um pouco de "punk alegre" (tipo um Undertones e Buzzcocks). Pra mim, o cara acaba soando mesmo como um Richard Hell com phD em rock sessentista. Devin Davis compõe o que os gringos chamam de "catchy songs": power pops melodiosos e dinâmicos, que ora caem mais por território do hard rock ("Moon Over Shark City"), ora mais pro indie. E as letras, extremamente espertas e divertidas, resvalando direto pro bizarro e pro nonsense, lembram um pouco Elvis Costello no passado, Rivers Cuomo na fase áurea ou Richard Hell no começo. Nerdismo genial de primeira. Tipo ISSO (da deliciosa "Paratrooper With Amnesia"):

"My legs are like two lamp-posts in an earthquake
Whenever i get within a few feet from you
And I'm a paratrooper with amnesia
Falling like an anchor through the sky..."


Trimmassa é a palavra.

Esses 35 minutos de música são o bastante para colocar Devin Davis direto na companhia dos maiores compositores de power pop que conhecemos nas últimas décadas (Alex Chilton, Chris Bell, Norman Blake, Mathew Sweet, Brendan Benson...). Assino embaixo do veredito da AMG: "There are few guitar pop records of the last 20 years that are as exciting, well-constructed, and memorable as this."

terça-feira, 13 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

#4


SLEATER-KINNEY
The Woods


O Sleater-Kinney, na hierarquia musical do meu coração, está muito perto do topo... uma banda tão fácil de amar! Quase todas as outras bandas que eu curto tem alguma característica, alguma fase da carreira, alguma música mais chinfrim, que num me deixam dar uma aprovação absoluta. Tem bandas que eu preciso PARAR PRA PENSAR pra decidir se são boas ou não - e essas não são realmente boas. Nunca tive que parar pra pensar se eu curto ou não o Sleater-Kinney: eu SENTIA, na hora, imediatamente, que estava frente a UMA DAS BANDAS DA MINHA VIDA. O que reprovar nas Sleaters? Não encontro nada pra falar de mal de uma banda que reúne tudo o que o rock tem de melhor: excitação, energia, vitalidade, explosão, grito, eletricidade bruta, sentimento em erupção, ritmo pulsante, sentimentalidade e visceralidade em doses certas... Em The Woods, sétimo álbum de estúdio do trio americano, o Sleater-Kinney mostra-se investindo cada vez mais no seu lado "épico". A banda deixou de ser um coletivo essencialmente ramônico ou riot girrrl, como era no início bikini-killesco da carreira, passando a ser um power trio de hard-rock apunkalado e de certo modo "virtuose". "The Woods" é mais um ponto de mutação na carreira de uma banda que percorreu um puta dum caminho evolutivo, partindo de um riot girl mal gravado e tosqueira(Call The Doctor), chegando à maestria do punk-ramônico bubblegum (Dig Me Out), flertando com uma new wave deliciosamente sentimental (The Hot Rock), até atingirem o estado de hard rock vulcânico, aventureiro e complexo de One Beat e The Woods. Agora rola até música de 10 minutos de duração ("Let's Call It Love"), com uns explosivos guitarrismos improvisados e hendrixianos - que não chegam nunca a soar como punheta. As músicas, cada vez mais complexas, com várias diferentes seções e andamentos, não caem nunca no prog: apesar de tudo, o Sleater-Kinney permanece punkish. E é difícil pensar numa música que consiga soar ao mesmo tempo imensamente irônica/satírica e totalmente sincera, como "Modern Girl", a primeira Balada com B Maiúsculo da carreira do trio. A Corin Tucker, talvez a minha vocalista de rock predileta em todos os tempos, tá cantando com aquela tradicional excitação e punch que me arrepiam os ossos e me dão os calafrios na carne e me deixam dizendo "uuuuuuuuuuaaaaaaauuu!". E prosseguem os duelos vocais e guitarrais entre ela e a Carrie Brownstein (a mina mais guitar-hero desse mundo). The Woods prova que o Sleater-Kinney continua em plena forma, conseguindo compor um sucessor à altura do excelente One Beat, de 2002 (disco que eu cultuo de joelhos todas as noites e que tá, por enquanto, no meu TOP 5 da década). Se elas lançarem mais uns dois álbuns do mesmo nível no futuro próximo, tem tudo para se tornarem a melhor banda desta década. Pelo menos pra mim...

domingo, 11 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 5


WHITE STRIPES
Get Behind Me, Satan

Foi um baita dum susto o que eu levei quando ouvi o Get Behind Me, Satan pela primeira vez, até porque estava esperando que depois do Elephant os White Stripes fossem se tornar mais “comerciais” e “radiáveis”. Aquela guitarra saturada de efeitos deixou “Blue Orchid” com uma cara meio “glam industrial” (?), o que me assustou: o som do instrumento de Jack White sempre teve um som mais vintage, mais tradicionalista, e essa modernização deixou o som muito “artificial” – e foi algo que eu não curti, a princípio. “The Nurse”, a segunda música, era de longe a coisa mais esquisita que os Stripes já haviam gravado: uma balada bizarra levada toda no xilofone (!), no chocalho (!!) e numa louca estouração de pratos (!!!). Fontes seguras me garantiram que Meggie White, nessa música, espanca a prataria de sua batera naquele esquema tão sem-noção porque viu uma video-aula clandestina chamada DADAISTIC TECNIQUE FOR DRUM PLAYING. Depois seguia “My Doorbell”, quase um country-rock à la Hank Williams, música que não tinha absolutamente nada a ver com as duas anteriores... Parecia que os White Stripes tinham se esquecido completamente o que significa “homogeneidade musical” e estavam atirando pra tudo quanto é lado: hard rock glam, “dada-xilofone-ballad”, country-folk, modern-blues... Fiquei com medo de que o disco fosse uma merda. Aos poucos, ouvindo o resto do disco, e curtindo a maioria das canções do miolo e do final, a surpresa foi cedendo lugar à familiaridade e eu fui devargarzinho começando a sacar. E aí “bateu”. E foi EUREKA: Mas isso tudo é genial!

O quinto álbum dos Stripes é de longe o mais experimental da carreira deles e o que mais se distancia da fórmula consagrada - guitarra distorcida e bateria. Só três canções são efetivamente levadas pelas distorsões das seis cordas ("Blue Orchid", "Instinct Blues" e "Red Rain"); as restantes são conduzidas no piano, no violão ou no xilofone, inserindo uma variedade de sonoridades bem maior do que nos discos anteriores. Jack White, com sua voz de Robert Plant indie e “crianção” (no bom sentido), tá cantando como nunca e escrevendo suas sempre simpáticas letras de nerd-romântico-sincero, e se firma como um dos caras mais interessantes do rock atual. Não que eles estejam realmente tentando ser iguais a outras bandas de hoje: o White Stripes, de certo modo, sempre esteve com o rosto voltado mais para o passado do que para o presente. Afundado no mundo da música americana de raiz, Jack White tirou inspiração muito mais de anciões da história do blues, do folk e do rock and roll (como Robert Johnson, Son House, os Blind Willies, Muddy Waters, Hank Williams, Led Zeppelin...) do que qualquer de seus contemporâneos. O primeiro disco já deixava claro que o negócio dos Stripes sempre foi uma espécie de garage-blues minimalista que presta tributo à música feita uns 50 anos atrás. Get Behind Me, Satan é um disco para consolidar de vez os White Stripes como um dos grupos que, reprocessando toneladas de música tradicional americana, acaba por se tornar uma das mais peculiares, pessoais e originais bandas da atualidade.

sábado, 10 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

#6


HOT HOT HEAT
Elevator

Steven Bays, vocalista e tecladista do Hot Hot Heat, dialoga com o elevador no refrão da faixa-título: “Don’t take me uuuuupppp, i’ll only fall down just again...”, reclamando contra o Elevador Da Vida que sempre nos leva até a cobertura só pra depois nos lançar de volta pro subsolo... O disco que o Hot Hot Heat fez, ao contrário, é um elevador que nos leva em alta velocidade até a cobertura dum apê high-class, onde tá rolando uma puta duma festa pop-punk/new-wave cheia de confete, rock and roll e gente alucinada que dança e bate a cabeça contra a parede - e tudo isso dura o disco todo, sem nenhum momento boring. E, puta que o pariu, esse disco tem refrões. REFRÕÕÕES de sobra. Todas as músicas – absolutamente todas – tem um refrão que enfia o gancho na tua mandíbula e te faz querer cantar junto, várias vezes, doidamente. E depois, à noite, eles – os refrões - voltam para assombrar tuas noites de insônia. “You Owe Me An Iou”, “Running Out Of Time”, “Middle of Nowhere”, “Shame On You”... todas elas grudaram na minha memória de tal forma que eu posso tocá-los perfeitamente dentro da minha cabeça como se eu fosse um aparelho de som. E a voz desse Steven Bays, o jeitinho dele cantar, ao mesmo tempo desencanado e virtuoso, punk e soul, Richard Hell e Prince, me deixa doido de admiração e de euforia. Acho mesmo que ele é um dos melhores vocalistas que surgiram nos últimos tempos: uma puta duma energia, um puta dum feeling, como se o cara tivesse trabalhando sob o efeito de umas quinze Duracells. “Elevator”, um dos grandes discos de straigh-ahead modern-rock-and-roll (não sei como dizer a coisa em português), é o tipo de música festeira e alto-astral que me dá vontade de ficar pulando em cima do meu colchão com a air guitar em punhos e loucos sonhos adolescentes a respeito do rock-stardom. Foda que o meu estrado já tá bem massacrado (e juro que não é por isso... nem por aquilo!). Ah, um dia eu ainda vou comprar um colchão d’água e aí vão ser umas private parties que nem conto...!

sexta-feira, 9 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 7


JACK JOHNSON
In Between Dreams

Alguns chamam de “música de surfista”, mas não tem nada por aqui que lembre o surf rock de Dick Dale, Ventures, Man Or AstroMan e coisas parecidas – nem mesmo guitarras. O rótulo só se aplica se for literal: Jack Johnson, antes de virar compositor, foi surfista profissional de primeiro porte, com patrocínio da Quiksilver e tudo, se destacando na cena de seu Hawai natal. Outros chamam de “música de maconheiro”, e aí a definição já cola melhor, apesar de eu não ter certeza se a cannabis está entre as “musas inspiradoras” de Jack. Eu gosto mesmo de chamar de folk-rock introspectivo e cool, algo como um Neil Young rejuvenescido e aéreo. Jack Johnson me parece mais próximo também dum Iron & Wine (se bem que mais extrovertido) ou de um Nick Drake (um tanto menos tristonho) do que de qualquer banda de rock-pop ensolarado. Cantando baixinho, aos sussurros, quase à maneira de um lullaby, o cara transmite uma tranquilidade singela às suas canções essencialmente acústicas e pacíficas. Nada por aqui é extremamente festeiro e brilhante: a música de Jack Johnson, se tem algo a ver com praia, é mais com aqueles momentos no fim da tarde, quando o Sol está se pondo no horizonte e tingindo o céu com uma bela escuridão, quando uma maresia mais gelada começa a arrepiar as peles, enquanto um luauzinho rola na areia... algo assim. Violõezinhos mansos, vocais serenos, letrinhas trimmassa, mensagem de hedonismo leve e sem grandes transes. Eis um disco que me deixa na paz. Se os ditadores e senhores da guerra desse mundo fossem fãs de Jack Johnson, com certeza um número muito menor de guerras seriam travadas. O cara merece por isso não somente o título de um grande compositor e cantor: merece o de MESTRE ZEN. (!!!!)

quinta-feira, 8 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 8


THE WALLFLOWERS
Rebel, Sweetheart


Apesar da carreira longa, sólida e coerente, que já ultrapassa uma década de duração, os Wallflowers ainda são reconhecidos pelo público em geral somente por duas coisas: "One Headlight", o mega-hit que catapultou o segundo álbum dos caras (Bringing Down The Horse, de 1996) para o topo das paradas americanas, e o fato de que o vocalista Jakob Dylan é filho de um mito de primeira grandeza. Jakob parece não ter herdado de Papai Bob o vocal anasalado de Pato Donald - sua voz soa mais próxima daquela dum Bruce Springsteen ou dum Eddie Vedder. Suas letras, porém, são bem acima da média, como se o gene da poesia tivesse se transmitido por hereditariedade – e, como o pai, ele gosta de brincar com referências bíblicas (por exemplo nos versos "when Adam took the apple i was not involved / i'm not responsible for how lost we are", na ótima “The Passenger”). A música que os Wallflowers fazem também não contêm muitos dylanismos explícitos: é um rock clássicão, meio anos 70, que parece beber na fonte sagrada do folk-rock dazantiga; um tanto de Neil Young & Crazy Horse, um tanto de Tom Petty & The Heartbreakers, e um monte de Springsteen da fase áurea. Rebel, Sweetheart, talvez o mais coeso e vigoroso dos álbuns da banda, alterna baladonas folk que parecem saídas do Nebraska do Bruce ("From The Bottom Of My Heart" e "God Says Nothing Back") e alguns rockões setentistas, mantendo o nível alto em tempo integral e conseguindo empolgar constantemente. Originalidade não é o forte da banda, com certeza: os Wallflowers só reciclam um formato - o rock tradicional americano - já estabelecido décadas atrás. Mas num tem como reclamar da falta de ousadia frente a um disco que desce tão redondo e que é composto e tocado com tanta competência e perfeccionismo. Os Wallflowers são uma banda que não tem nada de espalhafatosa ou espetacular, o que talvez seja a causa para a falta de sucesso popular dos últimos álbuns - eles agora parecem restituídos ao mundo "alternativo". Não importa: eles nunca soaram melhor e nunca estiveram tão maduros e confiantes. Rebel, Sweetheart, melhor disco de rock clássico do ano, é o tipo de coisa que bandas veteranas como o Pearl Jam, o R.E.M. ou o U2 deveriam estar lançando hoje em dia se não tivessem parado de lançar discões perfeitos no passado já um tanto distante.

terça-feira, 6 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 9


BRENDAN BENSON
The Alternative To Love

Tudo o que eu esperava do disco novo do Teenage Fanclub, e que eles falharam em entregar com o fraquinho e brochante Man Made, o Brendan Benson concretizou neste seu Alternative To Love. Este guri de Detroit, que é chamado por muitos de “o Matthew Sweet desta década” (mas que chega até a merecer o título de “o Paul McCartney do indie 00”), cometeu um disco difícil de não gostar - e de não viciar. Três anos após arrancar elogios de grande parte da crítica com o disco anterior (Lapalco, de 2002), Brendan Benson chegou às beiras da perfeição na arte de compôr pérolas de power-pop sensível e bunitinho que parecem saídas de um coração eternamente romântico – se bem que, por vezes, melancólico e amargo. Poucos discos dos últimos anos conseguiram chegar perto de ser uma obra-prima que se equipare ao Grand Prix do Teenage, o maior clássico noventista do que eu gosto de chamar de “candy-rock” – o rock com gosto de marshmallow. Sim, Brendan Benson ama melodias adocicadas, cantorias “certinhas” e um tanto tímidas, refrões colantes – o que o coloca ali no mesmo grupo do Big Star, dos Kinks, dos Beatles... O disco começa acelerado e barulhento, com uma sequência matadora de quatro canções perfeitas - “Cold Hands, Warm Heart” e “Alternative To Love” , em particular, são divinas... Depois a coisa se tranquiliza e Brendan arrisca umas baladonas climáticas muito boas, só pra depois retornar ao power-pop mais vigoroso, cometendo pelo menos mais uma música impecável: “Last Man Standing”. Obra de perfeccionismo, “Alternative To Love” é inteirinho o resultado do esforço de um homem só; fora alguma ajuda na percussão e alguns backing vocals femininos, Brendan Benson tocou todos os intrumentos, escreveu todas as letras e ainda por cima produziu o álbum. Devin Davis, que fez um disco no mesmo esquema, é prova que 2005 foi mesmo o ano para bandas-de-um-homem-só marcarem a história do power-pop com discos memoráveis. E o futuro promete: Jack White, o líder dos White Stripes, é amigo íntimo de Brendan Benson (os dois moram a poucas quadras de distância em Detroit) e gravaram juntos um disco, a ser lançado em 2006, e que é desde já uma das grandes promessas para o ano que se aproxima. Sem nenhuma humildade hipócrita, Benson declarou ao New Music Express todo seu orgulho pelo material gravado: "É um disco assustadoramente brilhante. É muito, muito bom. Algumas pessoas que já o ouviram estão babando por ele. Estão todos falando que se compara ao Nevermind. Sinceramente, eu acho melhor." (!!!!) A julgar pela qualidade estonteante de Get Behind Me, Satan e Alternative To Love, não dá nem pra duvidar...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2005

-- MEUS 10 DISCOS DE 2005 --

# 10


FRANZ FERDINAND
You Could Have It So Much Better With...

O segundo disco do quarteto escocês mais badalado do Velho Continente, a verdadeira resposta do Reino Unido aos Strokes (agora que os Libertines já foram pro saco), segue aquela regra do "não concerte o que não está quebrado" e "não mexa em time que tá ganhando", adotada também pelos "rivais" de Nova Yorke com o Room on Fire. Até isso o Franz Ferdinand copia dos Strokes!? (Só zoando...) O fato é que num há nada de realmente novo ou surpreendente em You Could Have It So Much Better... - se há um disco que merece o título de Mais Radical Modificação de Sonoridade neste ano é o Howl do Black Rebel Motorcycle Club. O Franz Ferdinand, ao contrário, somente repetiu a fórmula que deu certo no passado, tentando consolidar-se na cena com um monte de mais do mesmo. Eis um disco que parece feito por caras que não quiseram trabalhar com a mínima possibilidade de desagradar: deram aos fãs o que os fãs estavam querendo, e, no processo, devem conquistar ainda mais fãs para seu crescente clube de seguidores. Aliás, o rock do Franz Ferdinand, se me permitem dizer uma idiotice, está cada vez mais pop: totalmente radio friendly. É um disco de uma banda que parece desejar o ROCK-STARDOM, a alta rotação na MTV, os shows em estádios lotados, as capas dos NMEs e Rolling Stones da vida... Disco de quem quer vender milhões. Não há uma música sequer em You Could Have It... que não seja um hit potencial - apesar de nenhuma chegar a ser tão cativante e grudenta quanto "Take Me Out", carro-chefe do disco anterior. Tudo aqui é altamente dançável e cantarolável, pura party music for the modern age, mó alto-astral. "Do You Want To", por exemplo, com seus "dú-dú dú-ru-ru-ru-rus", é de uma alegria tão ingênua e tão kitsch que chega até a me irritar um pouco. É que sempre curti umas melancolias, e quando dou de frente com um troço tão franguinho chego ao ponto de pedir: "ei, Franz Ferdinandos, será que vocês não podiam ser um pouco mais tristes e miseráveis e deprês de vez em quando, só pra variar?" Certas baladinhas meigas, ausentes no disco de estréia, ajudam a dar um pause na rockeria - mas "Fade Together" e "Eleanor Put Your Boots On", as duas canções quietinhas do disco, só parecem servir mesmo pra isso: pra descanso. Mas quando os caras descem a mão no rock and roll, fazem a coisa bem como poucos - e são uma fábrica de hits. "Fallen" e "Evil and Heathen", por exemplo, entram fácil na lista das melhores músicas do ano. Essa saudável disputa entre Franz Ferdinand e Strokes, com um oceano Atlântico inteiro entre elas, promete nos dar ainda muitos rounds massa de ver - mas se me perguntarem com quem eu fico, num tem jeito: eu ainda sou mais Strokes. E suspeito que vou ser ainda mais quando ouvir First Impressions Of Earth, terceiro disco da banda, que PROMETE. Afinal de contas, "You Could Have It...." é um disco agradável e energético do começo ao fim, mas que somente oferece mais do mesmo e sugere que o Franz Ferdinand possa não ter a originalidade suficiente para percorrer outros caminhos no futuro. Se o próximo disco vier na mesma linha, eles correm o risco de perder crédito: terão caído na mesmice.

domingo, 4 de dezembro de 2005

Vou adiar o especial Lars Von Trier para 2006, até porque preciso reassistir o "Manderlay" pra tirar alguns grilos da cabeça, e vou usar esse Dezembro pra fazer um TOP 10 MUSICAL decente, o que não faço desde 2002. Esse 2005 foi um ano em que, graças ao Speedy, ao Soulseek e às dicas da Pitchfork, do Gordurama e do Metacritic, eu pude acompanhar bem os lançamentos. Vale a pena aquelas baboseiras preliminares para evitar briga: num é um OS MELHORES DISCOS DO ANO, mas um MEUS DISCOS PREDILETOS NESTE ANO, o que já indica bem que o lance todo é subjetivo. De três em três dias, mais ou menos, uma resenha nova surge por aqui. Lá pelo Natal a medalha de ouro deve estar entregue e eu posso ir tirar umas férias.

E agora tem até PROMOÇÃO: dou cinco CDs originais - Slayer, Sentenced, Sepultura, Testament e Riistetyt - pra quem conseguir acertar os três do pódio. Tô falando sério. Metau num é mais a minha.

terça-feira, 29 de novembro de 2005

essa é a cara da prova de física da fuvest:




Foi um semi-desastre minha tentativa de enfrentar o monstro mítico chamado FUVEST depois de quatro anos sem estudar nada de física, biologia, química e matemática. Os dois meses que eu "dediquei" pra tentar dar uma refrescada na memória num serviram pra muito - até porque eu muitas vezes lançava os livros contra a parede e ia fazer algo de mais legal. Aconteceu o que eu suspeitava: fui massacrado em quase todas as provas de Exatas. Chutei a torto e a direito, endoidecidamente, bem no estilão aleatório, entrega-a-deus-e-vê-no-que-dá. Acho que umas 22 ou 23 questões de exatas foram todas no chute - a maioria tudo pra fora. Essas provas de Química e Física da Fuvest sempre me deixam com a sensação de que eu sou um completo idiota. Na maioria das questões, num sei nem por onde começar. Tava com todas as formuletas decoradas, mas é claro que isso num adianta nada. É ilusão pensar que os putos vão te dar o V, o Vo, o tempo e pedir a Aceleração. Ou imaginar que vão te dar um gerador, uma ddp, uma força eletromotriz, uma resistência e pedir uma corrente. Ou achar que saber a diferença entre uma ligação iônica (que é caridade) e uma covalente (que é comunismo) vai servir pra algo. Essas coisas basiconas que eu sabia foram completamente inúteis. Fui achando que fazer metade das questões de cada uma delas já tava de bom tamanho. Nem isso eu consegui. Só 4 de física, 4 de Química e 4 de Biologia. Matemática consegui ir melhor (6 das 12), mas com uma perda de tempo absurda - o fim da prova chegou antes que eu conseguisse sequer LER umas cinco ou seis questões de Química. E, além do mais, num sei como é que esses caras pensam que é possível ficar fazendo uma prova desse tipo durante 5 horas - num tem jeito. Num tem cabeça que aguente. Entrando na quarta hora de prova, minha mente já tava num cansaço tão ferrado, e meu raciocínio tava tão lesado, que eu ficava uns quinze segundos tentando descobrir quanto é 7 vezes 8. "Será que é 63? Ou será que é 72?"... ;-)

No saldo total, fiz um magrinho 53 pontos (de 100 possíveis), o que seria insuficiente pra praticamente todos os cursos - e eu nem tenho ENEM pra dar um empurrãozinho. Mas pra Filosofia a pedreira é menor. Ano passado a nota de corte foi 52, o que ainda me permite um fiapo de esperança. Se bem que vivemos num mundo regido por Murphy...

Algumas dos Constatações Sagradas da Tábua das Verdades Universais de Murphy, página 19.032.023 do Guia dos Mochileiros da Galáxia, verbete Vestibular:

- Se sua performance na Fuvest foi de X pontos, a nota de corte será sempre de X + 1.

- Se você chegar à segunda fase, vai ter um ataque de diarréia no dia da prova e não poderá comparecer. Ou então vai passar duas horas da prova sentado na privada.

- Quando você passa em primeiro lugar na Fuvest, você morre atropelado no dia em que vai se matricular. E o desgraçado que te matou foge. E na semana seguinte ganha na Sena. E vive até os 110 anos. Em Paris.

- Se você consegue entrar na USP e fazer o curso inteiro, morre atropelado no dia da formatura.

- Se você consegue entrar na USP, fazer o curso, se formar, arranjar emprego, ficar rico, constituir família, ter filhos, comprar casa no litoral e atingir a felicidade - enfim, fazer todas essas coisas que a maioria das pessoas deseja fazer com suas vidas -, um dia acontece isso: seu corpo dá tilt, pára de funcionar, começa a apodrecer e, finalmente, você é enfiado numa caixa de madeira e posto debaixo da terra, e dentro de poucos anos é completamente esquecido por todas as criaturas do planeta.

Sei, sei, já me disseram: sou um cara "muito pessimista"... Mas é minha culpa? Fui eu que criei a vida desse jeito?

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Tem coisas novas no armazém do DLMSONGS, um dos maiores QGs de Comunismo Musical do Brasil (www.gmail.com - dlmsongs - queromp3). Duas coletâneas, inencontráveis em qualquer loja de discos dessa galáxia, tão disponíveis: A REVOLTA DAS CALCINHAS, uma coleta que eu fiz com algumas das melhores músicas de r&r e punk com vocais femininos (Bikini Kill, Le Tigre, Sleater-Kinney, Elastica, Bellrays, Detroit Cobras, entre outros), e o 31 SONGS, que contêm todas as músicas que o Nick Hornby, autor de "Alta Fidelidade", considera como suas prediletas - o livro 31 Canções, aliás, já foi lançado no Brasil, mas vem sem CD. Ainda tem o "Yoko" do Beulah, um dos meus discos prediletos dos últimos anos, já resenhado um tempo atrás por aqui, e já tá chegando o disco de estréia do Distillers, outra banda do coração, responsável por algum do melhor punk rock gravado nessa década - e em qualquer outra. O Gúgou não contava com essa: acho q eles nunca imaginariam que alguém iria utilizar nem 10% do espaço do Gmail. Eu já tô chegando no primeiro giga. E o segundo tá a caminho.

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Num tem jeito: o cara num erra a mão. Pago um pau descarado: pra mim Lars Von Trier é Gênio. Comecei a escrever algo sobre o "Manderlay", um puta dum filme (apesar do impacto ter sido, pra mim, um pouco menor em comparação com "Dogville" ou "Dançando no Escuro") - mas tô meio perdido no meio de tanta coisa que eu quero dizer. Porque pra falar sobre "Manderlay" é preciso falar também sobre "Dogville", filme que eu devia ter resenhado antes mas não fiz - por preguiça, por insegurança, por desânimo frente ao tamanho imenso da tarefa. Pra falar sobre o estilão minimalista, despojado, teatro-filmado dos dois, também é bom falar sobre o Dogma 95, sua estética e intenções, o que são outros quinhentos. E pra tratar da Grace, personagem ultra-complexa e uma dos mais instigantes da história do cinema, é interessante compará-la com as outras mulheres protagonistas dos filmes anteriores do Von Trier, o que me leva a ter que tecer considerações alongadas sobre "Ondas do Destino" e "Dançando no Escuro". Então o que era pra ser uma resenha sobre "Manderlay" tá virando quase que um livro sobre a obra de Von Trier e minhas filosofagens em cima dela. Então 'tejam preparados que em algumas semanas vou começar a lotar esse blog com dezenas de kbytes dedicados a esse grande gênio da sétima arte, Lars Von Trier, o Terrível.

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últimos filmes:

REBECCA (do Hitchcock, 1940) - 8.5
FEBRE DO LOCO (de Andrès Woods, Chile, 2001) - 3.0
O QUE FAZER EM CASO DE INCÊNDIO? (Alemanha, 2002) - 4.0
O CLOSET (Le Placard, de Francis Veber, França, 2001) - 7.8
A FESTA DE BABETTE (de Gabriel Axel, 1987) - 4.6
AMOR À FLOR DA PELE (de Wong Kar Wai, 2000) - 8.6
BALZAC E A COSTUREIRINHA CHINESA (de Dai Sijie, China, 2004) - 4.5
NICOTINA (de Hugo Rodriguez, México, 2005) - 5.0
O HOMEM ELEFANTE (de David Lynch, 1980) - 8.0
O PÂNTANO (de Lucrecia Martel, Argentina, 2000) - 5.9
A MARCA DA MALDADE (Touch of Evil, de Orson Welles, 1958) - 7.9
O ESPELHO (Zerkalo, de Andrei Tarkovski, 1974) - ?realmente não sei.?
21 GRAMAS [2a] (de Alejandro González Iñarritu) - 9.1
O GUIA DOS MOCHILEIROS DA GALÁXIA (de Garth Jennings, 2005) - 7.2
TUDO ACONTECE EM ELIZABETHTOWN (de Cameron Crowe, 2005) - 4.5
RAINHA MARGOT (de Patrice Chéreau, França, 1994) - 8.4
MARCAS DA VIOLÊNCIA (do D Cronenberg, 2005) - 9.0
OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA [4a?] (do Spielberg, 1981) - 7.5
PATTON (de Franklin J. Schaffner, EUA, 1971) - 7.8
O INDOMADO (Hud, de Martin Ritt, EUA, 1963) - 8.6
CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS (de Marcelo Gomes, Brasil, 2005) - 4.1
A ILHA (The Island, de Michael Bay, EUA, 2005) - 6.0
GOSTO DE SANGUE (Blood Simple, dos Irmãos Cohen, EUA, 1984) - 6.5
A VIDA MARINHA COM STEVE ZISSOU (de Wes Anderson, 2005) - 3.5
MANDERLAY (de Lars Von Trier, 2005) - 8.8

( ) no 1 - juro que eu não entendo o que as pessoas enxergam nesse Wes Anderson. Acho os filmes dele tão meia-boca, tão artificiais, tão cheios de piadinhas fracassadas, tão sem sentimento... O Tennenbauns e o Steve Zissou em nem aguentei até o final, de tão chato que tavam.

( ) no 2 - o Guia dos Mochiileiros ficou com cara de Monthy Phyton.

( ) no 3 - o 21 Gramas é um dos melhores e mais devastadores FILMES DE DOR do mundo: pra ver e sofrer junto, berrando de agonia, com as lágrimas caindo em cachoeiras. E que elenco foda, meu. Naomi Watts, Sean Penn e Benicio Del Toro juntos, todos inspirados, sob o comando de um dos melhores diretores surgidos nos últimos anos. Esse Iñarritu é bão mesmo...

( ) no 4 - Agora o México também tem o cara que xeroca Tarantino: esse Hugo Rodriguez, do "Nicotina". Como se não bastasse o Guy Ritchie...

( ) no 5 - A Ilha é meu GUILTY PLEASURE do ano. Nem achei tão ruim quanto andam dizendo.

sábado, 26 de novembro de 2005

ALGUNS FAVORITOS.

INSCRIÇÃO PARA UMA LAREIRA

A vida é um incêndio: nela
dançamos, salamandras mágicas.
Que importa restarem cinzas
se a chama foi bela e alta?
Em meio aos toros que desabam,
cantemos a canção das chamas!

Cantemos a canção da vida,
na própria luz consumida...

(MÁRIO QUINTANA)

* * * * *

"Ever tried? Ever failed? No matter.
Try again. Fail again. Fail better."
(SAMUEL BECKETT)


"There's a time when
the 'maybe later' becomes 'too late'..."
(do filme DREAM FOR AN INSOMNIAC)


“Life, as it is called, is for most of us
one long postponement.”
(HENRY MILLER)

segunda-feira, 21 de novembro de 2005

MARCAS DA VIOLÊNCIA
(A History Of Violence, de David Cronenberg, 2005)

"We may be through with the past,
but the past ain't through with us."

de MAGNOLIA, de P.T. Anderson

"People you've been before
You don't want around anymore."

de ELLIOTT SMITH, em "Between Bars"


"Marcas da Violência", novo filme do cada-vez-melhor David Cronenberg (de "Spider", "A Mosca", "Crash - Estranhos Prazeres", "Gêmeos - Mórbida Semelhança", entre outros), não é um espécime do típico gênero americano de filmes sanguinolentos e brutais que glamourizam a violência e idealizam a brutalidade. As cenas fortes e sangrentas estão lá, mas nunca são diversão ou estilização (não estamos frente a um irmão de "Kill Bill" ou "Sin City"); a violência aqui é terror, não entretenimento. Algumas sinopses escritas para tentar atrair multidões para os cinemas vão dizer que se trata de um suspense a respeito de bandidões que passam a perseguir uma pobre família que, antes vivendo dentro do Sonho Americano, tem sua vida transtornada pela explosão da violência. Vão dizer que é um thriller sangrento sobre a vingança que os Caras do Mau vão tentar perpetrar contra o Cara do Bem pelos erros deste último no passado distante. Vão dizer que é uma reflexão sobre a violência na América. Vejo nele algo de diferente.

Prefiro ver o filme de Cronenberg, adaptado de uma novela gráfica de John Wagner e Vince Locke, como uma cuidadosa análise psicológica de um personagem em conflito com os demônios interiores - que ele pensou ter subjugado, mas que voltam a bater à sua porta. Mais ou menos à maneira do "Clube da Luta" e do "Psicopata Americano", "Marcas da Violência" faz um estudo cuidadoso de uma personalidade rachada. Dentro do mesmo homem, nos três casos, convivem duas personas: uma delas, reprimida e empurrada para o inconsciente, representa o lado violento, brutal, sedento por destruição; e a outra, que se exibe publicamente, pretende se adequar à normalidade e à moral social estabelecida. É claro que a repressão não funciona com perfeição e, vez ou outra, surge das profundezas desses homens aparentemente pacatos, ordeiros e sociáveis (Tom Stall, Patrick Bateman e o narrador do Clube...) um monstro de ódio e violência. Eles não são assim tão diferentes de todos nós, digamos a verdade. Quem de nós não sente se erguer das profundezas de nossos corações, vez ou outra, alguma fantasia sanguinária, algum desejo de destruição, algum ódio mortal contra alguém? E quem não se esforça por reprimir essas iras e manter-se sob controle? Confesso que eu, pessoalmente, muitas vezes não consegui resistir à tentação de decapitar, esfaquear e arracar fora as tripas de muito professor - mentalmente, é claro. Num curto muito a raça... ;-)

O personagem Tom Spall (interpretado por um ótimo Viggo Morttensen), atormentado por remorsos a respeito de seu obscuro passado, é um homem que, como tantos, veste uma máscara para fingir ser absolutamente pacífico e imune à crueldade. Quer dizer, talvez dizer "fingimento" ou "hipocrisia" seja exagerar: até daria para falar em uma "obstinada tentativa de auto-transformação". O fato é que ele se esforça para reprimir sua personalidade violenta por tantos anos seguidos, com um esforço tão constante, que a máscara da normalidade acaba por se colar ao rosto. Joey Cusack, sua versão particular de Tyler Durden ou do Psicopata Americano, parece estar definitivamente morto. E ninguém, nem sua esposa, nem seus filhos, nem seus colegas de trabalho, chega a suspeitar que, por trás da aparência amável e pacífica, pode haver nas profundezas daquele homem alguma besta adormecida. E é essa besta que será despertada na ocasião do assalto de que ele é vítima e que vai transtornar toda a vida de Tom, sua esposa e seus filhos.

Por isso é que prefiro ver o filme não tanto como um "thriller" ou um "policial", mas muito mais como um drama familiar centrado num problema muito comum: o mútuo desconhecimento enfim tornado evidente. Penso assim: não importa que as pessoas compartilhem a mesma casa, a mesma mesa, a mesma cama, por anos e anos a fio; elas ainda assim parecem não conseguir ler umas às outras como livros abertos. A surpresa com que a esposa (Maria Bello) recebe a verdade sobre o passado de seu marido é um bom indicativo de quão superficialmente aqueles dois se conheciam. Atormentados pela morte de suas ilusões, a esposa e o filho modificam de modo radical o modo com que tratam o papai, antes considerado como "o melhor homem do mundo", agora enfiado na imagem de um serial killer. Cronenberg sublinha o contraste com força: no inicío do filme, o tom excessivamente adocicado e idealista da descrição feita da família nos indica que há algo de errado ali; as coisas funcionam tão bem que não dá pra evitar pensar: "é bom demais pra ser verdade". A gente sabe que algo vai vir pra fazer a terra tremer debaixo dos pés desse casal tão impossivelmente perfeitinho.

Pouco a pouco Cronenberg vai nos conduzindo em direção aos mistérios de Tom Stall e cada vez se evidencia mais que seu passado está recheado de atos sanguinários que ele desejou esquecer e apagar. Os mafiosos chefiados por Fogarty (Ed Harris, sempre competente), e que vêm para atormentar a vida de Tom, aparentemente o confundindo com um certo Joey Cusack, são o fator que vai fazer com que a família, pela primeira vez, se choque com o dilema: será que nós realmente nos conhecemos? Estamos realmente conscientes de quem é o nosso papai em suas profundezas mais insondáveis?

O mistério sobre a vida pregressa do personagem principal vai lentamente começando a instigar o espectador, num processo que me lembrou um pouco aquele de "Paris, Texas", de Win Wenders, que só com muita lentidão nos explica as causas do silêncio pesado e da tristeza desolada do protagonista. Tom Stall, em "Marcas da Violência", é um mistério parecido. Tanto que, o principal suspense que Cronenberg cria por aqui nem é tanto um "será que eles vão conseguir se safar?", mas um "quem diabos é esse cara, na verdade?" A certo ponto, todos ao redor de Tom - o policial, a esposa, o filho, seu irmão, seus perseguidores - pedem que ele embarque numa "viagem no trilho da memória" e retorne ao passado - para concertá-lo, para revelá-lo, ou mesmo para redimi-lo, pagando por seus crimes. Uma viagem na qual ele não deseja embarcar, é claro, já que esteve, por tantos anos, engajado na tarefa de se auto-modificar. Ele está querendo deixar o passado para trás, mas o passado não vai deixar-se cair inerte na passividade. A pessoa que ele foi no passado, e que não quer mais ser, será novamente chamada a erguer-se por esses espectros do passado.

"Marcas da Violência", talvez o mais maduro e profundo dos filmes da carreira de Cronenberg, acaba por ser uma fábula de redenção que fotografa a obstinada tentativa de transformação e auto-superação de um homem que, cansado de seus vícios e de seu ódio, parte num combate contra si mesmo. Um processo de auto-pacificação, auto-controle, auto-domesticação. Envergonhado por seu passado pouco elogiável, esconde de todas as pessoas ao seu redor seu lado mais sombrio e suas escorregadas mais graves, até que um dia o esconderijo é quebrado e as verdades obscuras saem à luz do dia. Um filme sobre como escondemos uns dos outros nossos sentimentos menos nobres, por medo de que não gostem de nós se souberem que os sentimos, e sobre como, mais cedo ou mais tarde, os demônios interiores acham um meio de se manifestarem no mundo exterior. Que nos resta? A compreensão, a admissão, o auto e o mútuo conhecimento.

Na belíssima cena final, inteirinha silenciosa, o diretor não dá nenhuma pista mais explícita sobre qual será o futuro dessa família após ser chaqualhada por essa onda de derramamento de sangue. Mas eu fico com a impressão de que, afinal de contas, o que está em jogo ali é o reacolhimento do papai, uma espécie de reconciliação feita toda através de pequenos atos e olhares, um certo perdão terno e compreensivo. Admitido de volta, aceito no ninho mesmo com seu passado sombrio e seus abundantes erros cometidos, Tom, enfim desmascarado, é recebido de braços abertos. A família, após fazer o sepultamento das ilusões que tinha sobre aquele homem, novamente o aceita, o acolhe, o admite. As lágrimas são inevitáveis, como também o é o clima melancólico, que contrasta de forma radical com o ambiente American Dream do inicío da história. É que todos estão de luto após o funeral das ilusões. E agora poderão reiniciar a batalha de cara limpa: dessa vez, as máscaras estão todas largadas pelo chão.

quinta-feira, 17 de novembro de 2005



# and the wheel keeps on turning....

Minha Lei de Murphy predileta, dentre tantas que eu admiro (são expressões da mais pura sabedoria de vida!), ainda continua a ser aquela: "Se você está se sentindo bem, não se preocupe: isso passa." É uma frase tão irretocável, tão perfeita, tão infalível, que eu poderia tatuá-la no meu peito sem medo de que algum dia ela viesse a se tornar mentirosa. Tudo muda a não ser a mudança... O velho George Harrison já cantava: "All things must pass" ("Isn't it a pity? Isn't it a shame?"...). E o velho Huxley já comentava: "Vai passar", a única expressão que vale para toda e qualquer situação humana, boa ou má. E ainda o grande Montaigne: Todo contentamento dos mortais é mortal. Mas não sou tão pessimista quanto pode parecer. Sei que a roda, se gira, não é sempre para nos fazer mergulhar no abismo: às vezes nos leva pra cima. Sim, é claro que teremos que cair de novo, mas por que não? Que prazer na ascensão sem a memória da queda?

"Tudo flui", uma das mais lapidares das constatações filosóficas em todos os tempos, não é necessariamente nem uma boa nem uma má coisa. Que nada seja permanente é ao mesmo tempo terrível e maravilhoso. "E a vida, nossa única benção e nossa única maldição...". Tudo flui, e é terrível: pois o fogo da paixão nunca se sustenta, pois a chama da vida nunca queima por muito tempo, pois nunca se pode enjaular o pássaro fujão da alegria... ele sempre escapole! Tudo flui, e é maravilhoso, também: pois nenhum tormento é capaz de durar eternamente, pois todo o sofrimento tem um fim, pois, estando todos nós prometidos ao nada, não há nenhum Inferno Permanente, somente os infernos provisórios que todos conhecemos e que são menos infernais pelo fato de que acabarão. Sim, Montaigne estava certo ao dizer o que dizia, e é uma das frases que eu mais adoro dentre todas que conheço, mas gosto de dizer o contrário também: "Todo descontentamento dos mortais é mortal...". Tudo muda, tudo passa, tudo escoa! Que terror! Mas que alívio!