sexta-feira, 28 de agosto de 2009

:: one more silly love song! :D ::


"Some people wanna fill the world
With silly love songs.
What's wrong with that?
I'd like to know!

Cause here I go again..."


PAUL MCCARTNEY


Não deixar o dia partir inutilmente. Amar como se não houvesse amanhã, pois na verdade não há. Lembrar-se que desta vida não sairemos vivos. E que a vida só se dá pra quem se deu. Que o Sol vá se pôr de noite, não é razão para não curti-lo de dia - e isso, é claro, também vale para a vida e para a morte. Somos velas que a brisa do nada um dia virá apagar, mas devemos queimar intensa e incansavelmente enquanto der. Pra descansar temos a eternidade. No fear, no distractions, the ability to let all that doesn't really matter truly slide.

Tão aí algumas de minhas “pérolas” de sabedoria prediletas, que mais me iluminam os dias, e que largo aí, pelo caminho, sem outro porquê além deste: sentir que presas dentro de mim não servem para tanto quanto se estiverem aí fora, disponíveis, compartilhadas...

* * * * *

Spinoza fala, do amor, que é uma alegria que surge acompanhada da idéia de sua causa. Em outras palavras: amo aquele que reconheço como causa de minha alegria. Não é que amemos todos aqueles que nos causam alegria: há os palhaços e os piadistas que nos divertem, mas que nem por isso conquistam nosso afeto; e há os contentes que são ingratos, e contentam-se sem agradecer à fonte deste contentamento de que gozam.

Quando a fonte de nosso bem é uma outra existência, que nos é causa de alívio, doçura e alegria, e quando reconhecemos contentes a benfeitoria que nos é feita por outra criatura, isso é o que chamamos de amor. De qualquer modo, se enlaçam nesta belíssima idéia, cheia de doce sabedoria, os dedos do amor e da alegria, da gratidão e do contentamento - o que já é um avanço vastíssimo em comparação com outras concepções do amor bastante catastrofistas. Cada vez mais, sou muito mais Spinoza que Werther!

Por que não partir daí, desse tijolinho adorável e tão sólido, para construir o edifício da filosofia, o edifício da vida? Sou mais a alegria que o cogito, tio Dêcartê que me perdoe! E a alegria não tem nada de “fenômeno idealista”, "ilusão ideológica" ou "superstição religiosa", vocês hão de convir: qualquer criança nos prova sua existência, não necessitando nós, pois, de filósofos ou cientistas que nos provem que existe a alegria. Acho até que o melhor argumento contra os Schopenhauers e Mallarmés da vida, com suas sombrias teorias e poesias, continua sendo uma careta, uma cabriola, um beijo na boca... (Mas não na deles, cruz credo!)

Alegria há.

Quanto à “felicidade”, há controvérsias; talvez seja ela só um sonho que tivemos? um construto imaginário? um pretexto de marketing? um conto-de-fada para os pseudo-“amadurecidos”? Sobre ela pode-se discutir, se existe ou foi inventada, se deve-se persegui-la ou desencanar... mas sobre a existência, ainda que eventual, ainda que doloridamente efêmera, das alegrias, não há louco que negue.

Até os deprimidos reconhecem: alegria existe, e se estamos doentes é por não podermos nos nutrir dela! Quase todo mundo sabe, ainda que intuitivamente, que falta de alegria pode deixar um ser humano doente. Me surpreende, por exemplo, o fato da Psicanálise não usar quase nunca este vocabulário, o do “alegre” e do “triste”, como se considerasse isso uma pueril polarização, digna da infância teórica da humanidade, já aniquilada pelas dinâmicas tão mais complexas e dialéticas do id, do ego e do super-ego, e já superada após os combates homéricos entre os conceitos de Natureza e a Civilização, Eros e Tânatos!

Esquecem-se de deixar registrada essa banalidade, que fica implícita em quase todas as descrições de caso de psicopatologia: as pessoas ficam doentes por falta de alegria! Sei que sou um psicológo tosquérrimo, mas meu diagnóstico das neuroses com que me deparo é quase sempre o mesmo: as pessoas adoecem por não conseguirem gozar a vida, porque não acham meios para satisfazer suas libidos, porque as alegrias ficam soterradas debaixo de repressões, de culpas, de medos... Me arriscaria até a sugerir isto, misturando Reich com Spinoza: só há saúde na alegria; e só há felicidade no amor.

A queda da alegria, sendo queda da nossa potência de existir, já é uma espécie de doença que nos acomete. “Nunca” conseguir ascender às nuvens da alegria, como nos casos mais graves de melancolia crônica, de deprê absoluta, é uma situação extraordinariamente adoecente. Por isso a depressão é uma doença, e que está sempre a rondar, como um defunto insepulto, os pesadelos dos tristes. Nós odiamos a tristeza pois ela nos adoece, ainda que não chamemos seu efeito, costumeiramente, pelo devido nome. É chaga, ferida, atentado contra a vida!

Não digo que não possamos aprender nada das lágrimas! Pelo contrário: são professoras que respeito, e mais que muitas outras, nesta insana escola da vida (que é tão avara das soluções de seus enigmas!). Muita crosta sobre os olhos, barrando a vista das retinas, desfaz-se liquidada pelo líquido dos tristes. Talvez toque-se mais de perto na pele quente da vida, quando se chora: pele que pulsa, pele que treme.

“Os dias que me vejo só são dias que me encontro mais”, canta o Amarante, ecoando muitos sábios e místicos orientais que rimavam solidão com auto-conhecimento... Creio, sim, que isso seja possível: um “isolamento” que seja “frutífero”, que seja uma jornada de introspecção realizada com ousadia e aventurosidade, que seja amadurecimento e treinamento antes das grandes batalhas... Como Zaratustra na montanha, Cristo no deserto, Buda debaixo da árvore, Gramsci no cativeiro, e Leary e Kesey na floresta do ácido...

(Cê vê que BATEU quando o nêgo, que vinha falando de Spinoza, todo chicoso, descamba pra falar sobre a “floresta do ácido”... ----- WHAT-DA-FUCK?!)

A alegria existe. E existem seres humanos capazes de nos alegrarem. E somos (alguns de nós, ao menos) capazes de reconhecer fora de nós a fonte deste bem. Portanto, o amor existe, se o fizermos existir, e o fato disso ser simples e trivial não faz com que seja menos verdadeiro. O amor é um vôo possível; nada o impossibilita, de modo absoluto; todas as pedras, obstáculos e muros, todos os nossos egoísmos, couraças, neuroses e automatismos, são contrários a ele - mas nada disso é intransponível. Ao contrário! Como canta Eddie Vedder, numa das músicas do Pearl Jam de letra mais sábia dentre todas por eles já compostas, “once you hold the hand of love it's all surmountable” (“Love Boat Captain”).

* * * *

Sim, e toda essa abstração seria lixo se eu me esquecesse do mais importante, do mais valioso, do mais precioso de tudo: que não é o “amor”, se com isso penso num conceito, mas sim a pessoa que nos abre a porta para que reine esta realidade. O amor é um enigma que só pode ser solucionado a dois. Por isso sempre desconfio do que dizem sobre o amor (isso quando dizem algo...), os grandes filósofos solitários, os zaratustras e eremitas do espírito! Se alguém lhes disser que apreendeu a “essência do amor” estudando sozinho em seu escritório, ou lendo solitário pelas madrugadas, desconfiem que é lorota. Descobrir a essência do amor na solidão é tão absurdo quanto achar Marte indo na direção do Sol...

Procurar a felicidade na solidão é como tatear no escuro por uma chave que nem está no quarto. Se há felicidade, só pode existir como felicidade compartilhada. É o grande “lema” que se marcou em mim do Na Natureza Selvagem, filminho que mon petit pauvre coeur sentiu como tão inspirador e revigorante: “HAPPINESS IS ONLY TRUE WHEN SHARED.” É aí que os dois grandes mistérios mostram-se conexos e inseparáveis: o amor e a felicidade. Como viver um sem o outro? Como ascender às sonhadas nuvens da felicidade se não for pelas asas do amor? Que outra escada, meus caros? Que outra escada?!

O dinheiro? O poder? A fama? O pensamento? A criação? Mas tudo que um ser humano pode fazer só é capaz de adquirir valor numa esfera humana. Só é possível valer em outro coração. O amor é a única fonte de valor em todo o Universo.

A Monalisa não vale nada para os macacos, e os cachorros mijariam sem pudor por toda a Capela Sistina. Toquem a Nova Sinfonia para um gato, e ele fará cara de quem não liga a mínima pr'esse tal de Beethoven. O planeta Terra jamais aplaudiu e ovacionou qualquer das civilizações que surgiram sobre o seu lombo, nem jamais derrubou lágrima ou suspiro de alívio ao ver um grande Império cair em ruínas ou uma grande revolução pondo do avesso um regime ultrapassado. E leiam vocês para os céus as poesias belíssimas que já escreveram os humanos sobre o pôr-do-Sol e as estrelas, e verão que nada perturba o infinito silêncio das esferas...

O único sentido da vida, o único remédio contra a mais absoluta absurdidade, está no amor que nutrimos e que nos nutre pelos outros precários vivos com quem viajamos juntos neste louco, louco palco rodopiante!...