segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

:: amazement ::


Diz o Quintana, sacaneando a arrogância dos Colombos e Cabrais desse mundo, que descobrir continentes é fácil como esbarrar num elefante. Já poeta é quem encontra uma moedinha de ouro perdida no chão, em alguma reentrância secreta da calçada, num lugar onde todos pisam, dia a dia, distraídos demais para atentar ou atentos demais ao hábito para se maravilhar.

Poeta é aquele que anda com o cabeça inclinada para o céu, espantado com o fato de existir algo ao invés de nada, e esmaga o nariz contra o poste, fazendo rir a empregadinha doméstica, que se acha muito mais esperta do que aquele avoado sonhador sem talento algum para a vida prática...

Poeta é quem descobre tesouro em algum canto não notado do mundo pisado e repisado pela multidão que sempre vai a algum lugar, que está sempre de passagem e que nunca entenderia que a viagem é que é a recompensa - e não o chegar a um lugar qualquer.

Poeta é quem acha ouro onde ninguém vê e que, como dizia o Merleau-Ponty, "fixa e torna acessível aos demais humanos o espetáculo de que participam sem saber". Poeta é quem lança um jato de luz sobre uma pérola antes invisível para quase todos, perdida no meio do chão sujo do cotidiano.

E digo mais: poeta é quem viaja pra dentro. E essa, que é ao mesmo tempo a viagem mais crucial e a que menos as pessoas encaram, é a única viagem em direção ao realmente desconhecido que nos resta além da espacial. Porque na Terra tudo já está descoberto, mapeado, catalogado, nomeado, possuído, regulamentado – tudo tem um dono; em todas as coisas do planeta os homens colocaram suas etiquetas; tudo virou coisa que tem um nome, um possuidor, um preço; não há mais continentes a descobrir nem local inabitado a ser achado. A verdadeira Atlântida náufraga está no chão do oceano de nós mesmos, só aguardando que desçamos com nossas máscaras de mergulhador e câmeras de oxigênio para explorar esses arruinados resquícios do tempo.

Poeta é aquele que, mesmo mendigo e esfarrapado, dormindo debaixo das marquises ou nos bancos de praça, sente-se mais rico que qualquer imperador. Pois sabe habitar a Mansão do Universo e, olhando para o Céu, sente-se milionário de estrelas.