sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

:: os filmes de fevereiro ::

31. A PRIMEIRA PÁGINA (de Billy Wilder, 1975) - 7.5
32. SWEENEY TODD (de Tim Burton, 2007) - 6.4
33. PARANOID PARK (de Gus Van Sant, 2007 [HSBC]) - 7.9
34. 4 MESES, 3 SEMANAS E 2 DIAS (de Christian Mingu) - 8.5
35. ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ (dos irmãos Coen) - 6.9
36. CLICK (.... [dvd]) - 4.5
37. PSICOSE [2a] (de Alfred Hitchcock [dvd]) - 7.9
38. CARTAS DE IWO JIMA (de Clint Eastwood [dvd]) - 6.8
39. PRÍNCIPE DAS SOMBRAS (The Dark Side Of The Sun [dvd]) - 5.1
40. DIAMANTES DE SANGUE (de Edward Zwick, 2007 [dvd]) - 8.1
41. DOLÁR FURADO (western italiano velho [CinUSP]) - 6.8
42. SANGUE NEGRO (de PT Anderson) - 10.0
43. O HOMEM QUE MATOU O FACÍNORA [2a] (de John Ford) - 8.8
44. SENHORES DO CRIME (de David Cronenberg) - 8.0
45. NA NATUREZA SELVAGEM (de Sean Penn) - 9.5

pódio do mês
ouro: SANGUE NEGRO
prata: NA NATUREZA SELVAGEM
bronze: O HOMEM QUE MATOU O FACÍNORA

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

:: into the wild ::


NA NATUREZA SELVAGEM
(Into The Wild, EUA, 2007, 140min.)
de Sean Penn


"Oh, it's a mystery to me
We have a greed with which we have agreed
And you think you have to want more than you need
Until you have it all you won't be free

Society, you're a crazy breed
Hope you're not lonely without me..."

EDDIE VEDDER




"The things you own... they end up owning you", dizia um raivoso Tyler Durden no Clube da Luta, conclamando seu discípulo a abraçar uma vida mais intensa e mais genuína, distante do materialismo vulgar e do consumismo desenfreado vigente no Império Americano - e no resto do mundo atingido por seus tentáculos malignos. Acatando a sugestão, o personagem de Edward Norton irá colocar tudo o que possui dentro de seu apartamento, deixar o gás se espalhar por cada centímetro cúbico e esperar que uma faísca exploda tudo para o inferno... Tentativa desesperada de escapar de uma jaula que é feita de coisas e coisas e coisas e onde a Vida de Verdade não entra.

Semelhante, mas um pouco menos niilista, é a atitude de Chris McCandless, personagem da vida real que serviu como protagonista para o livro de Jon Krakauer que Sean Penn adaptou para o cinema com maestria neste lindíssimo e empolgante Na Natureza Selvagem. Ano passado, o filme, que conta com trilha sonora original primorosa de Eddie Vedder e atuação cheia de garra do Elime Hirsch, faturou o Prêmio do Público como o Melhor Filme na Mostra de SP (empatado com Persépolis) - façanha que não é pequena.

Com vinte e poucos anos de idade, Chris McCandless era um jovem privilegiadíssimo: um diploma universitário, a perspectiva de entrar em Harvard, uma família rica pródiga em presentes de luxo, uma poupança de mais de 25.000 dólares... Ele tinha tudo para se tornar um respeitável engravatado, desses que vemos andando por Wall Street e entrando em grifes da elite, encarnação do homem americano que nada contentemente em sua piscininha de moedas de ouro feito um Tio Patinhas...

Mas ele mandou tudo pro espaço, movido por seu próprio Tyler Durden interior. Mandou um cheque com todas as suas economias para uma instituição de caridade, rasgou suas identidades e carteirinhas, desencanou de Harvard e da vida de trabalho assalariado e caiu na estrada para uma aventura de desbravação das incríveis paisagens naturais da América Selvagem - e também de descoberta espiritual. Chris McCandless tinha se tornado Alex Supertramp, o mendigão maltrapilho, o andarilho errante, cujo único lar é a estrada e cujo maior aliado é seu polegar...

Sem informar os pais ou a irmã de seu paradeiro, ele embarca numa longa aventura de dois anos, pegando carona em trens de carga, trampando em campos de milho, fazendo amizade com hippies e cantores folk, enquanto alimenta o sonho de se meter no meio do Alasca para uma temporada vivendo como um completo hermitão, na companhia dos lobos e das longas paisagens desérticas... Chris McCandless, ao se metamorfosear em Alex Supertramp, é como uma borboleta que alça vôo para longe da lama da preocupação material e, ao mesmo tempo um seguidor de Tyler Durden e dos estóicos gregos de 2.000 anos atrás, decide-se a viver com pouco, depender de quase nada e livrar-se de qualquer apego a bens materiais.

É com esse enredo que Sean Penn e companhia constroem esse poderoso filme, candidato a Novo Clássico Americano (o que Sangue Negro também parece destinado a se tornar), que questiona fundo todos os valores podres como a ganância, a competitividade e o consumismo que passaram a nortear a vida da América engolida pelo capitalismo. A América Paradisíaca que McCandless evoca é aquela do Thoreau, do Jack London e do Walt Whitman - aquela que precisa ser urgentemente ressuscitada antes que a catástrofe se consume.

Que Chris, ou Alex Supertramp, seja um herói que o filme trata de botar sobre um pedestal é inegável, mas não há excesso de idealização. Se por um lado parece óbvio que Chris está "dizendo coisas que precisam ser ditas, fazendo coisas que precisam ser feitas", fica a impressão de que sua rebeldia chega a um certo exagero e ele cai num isolamento tamanho que destrói sua sanidade e sua saúde. Fugindo completamente da "Sociedade" e da "Civilização", que ele considera (e com razão!) corrompidas pela obsessão do lucro e da posse, dominadas pela hipocrisia e pela politicagem, ele acaba caindo no meio de uma Natureza Selvagem que não tem o mínimo cuidado com suas criaturas.

Por isso, muito mais do que um filme sobre um homem que busca o reestabelecimento de uma comunhão perdida com o mundo natural, Into The Wild é também uma fábula cruel sobre os poderes cegos dessa Natureza que Camus olhava com olhos melancólicos, lamentando sobre a "terna indiferença do mundo". Neste sentido, é um filme que se irmana com o excelente O Homem Urso, do Werner Herzog, ao mostrar o quando a Natureza é uma imensa engrenagem capaz de esmagar os homens e os bichos sem a mínima misericórdia. Chris aprende, talvez um tanto tarde demais, que as praticidades da civilização são o que nos mantêm em um nível razoavelmente seguro de garantia de sobrevivência e que sem as facilidades e as conquistas da civilização caímos no nível das bestas mais selvagens. Não se trata, pois, de escolher um dos extremos, mas de encontrar algum equilíbrio possível entre as benesses da civilização e aquele contato direto com a Mãe Terra que não pode ser perdido sem que algo muito precioso se perca.

No final das contas, o espectador, que dificilmente consegue evitar se emocionar com o destino de McCandless, acaba pegando por contágio um pouco do tesão que ele tinha por se lançar no Oceano Imenso do Universo e nele se banhar. Ele é prova viva do que dizia o poeta: "Sábio é quem se contenta com o espetáculo do mundo", mesmo que esteja com os pés descalçoes e não tenha domicílio fixo - sua casa é o universo. Into the Wild é um filme que nos dá vontade de cair na estrada, com o mochilão nas costas, sem mapas, sem relógio e sem destino certo, para explorar livremente este mundo tão vasto de que conhecemos só uma minúscula lasca. Mas é também um filme excruciante ao mostrar a solidão extrema em que Alex Supertramp acaba por se meter. Pelo menos essa solidão faz com que ele compreenda aquilo que é talvez sua descoberta espiritual mais profunda: " a felicidade só é real se compartilhada".

(9.5 / 10.0)

:: Soneto Antigo ::

Esse estoque de amor que acumulei
Ninguém veio comprar a preço justo.
Preparei meu castelo para um rei
Que mal me olhou, passando, e a quanto custo.

Meu tesouro amoroso há muito as traças
Comeram, secundadas por ladrões.
A luz abandonou as ondas lassas
De refletir um sol que só se põe

Sozinho. Agora vou por meus infernos
Sem fantasma buscar entre fantasmas.
E marcho contra o vento, sobre eternos

Desertos sem retorno, onde olharás
Mas sem o ver, estrela cega, o rastro
Que até aqui deixei, seguindo um astro.

(Mário Faustino)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

:: plano de assalto ::


"The crumbs of love that you offer me
They're the crumbs I've left behind."

LEONARD COHEN, Avalanche

Descobri bem cedo na vida, registrei no Diário como se fosse verdade absoluta, quis até patentear a Descoberta Científica: "só consegue ser infeliz quem sonha demais". Essa a velha conclusão, tão cedo tirada, pela vida tantas vezes confirmada... O amargo sabor da vida vivida em comparação com a doçura da vida sonhada - quem o conhece melhor que eu?

Minha pior mania, já me disseram, é não saber me contentar com pouco. Mas meu problema é bem mais sério do que isso! Com muito também não me contento. Não sou um caso de esfomeado que iria ao paraíso se recebesse pão com manteiga e um copo d'água. Nem um banquete de imperador romano saciaria minha fome. E é a maior das desgraças ansiar pelo infinito num mundo que é tão pão-duro.

"O grande mal do romantismo", dizia o Pessoa, "é querer a Lua como se houvesse maneira de a obter". Pobres de nós, românticos incuráveis, que desejam o Amor Absoluto ou a Felicidade Perfeita como se houvesse modo de as obter! Como se não fossem meras invenções da nossa enlouquecida e enlouquecedora imaginação - pólos magnéticos que atraem sempre à distância, mas que repelem qualquer tentativa de aproximação... Our dreams sail forever on the horizon.

Só consegue ser infeliz quem sonha demais e não encontra na vida alimento para pôr na boca esfomeada de sua maquininha produtora de sonhos, que come tanto combustível e tanta energia... Pobres de nós que temos essas fomes tremendas na alma, daquelas que esgotariam o estoque do supermercado, se existisse para as coisas que faltam dentro e não fora. O triste é que tudo o que mais importa não se pode comprar. Mas talvez mais triste seria se tudo estivesse à venda. No fundo é quase bom que dinheiro seja tão inútil.

Sou mau aluno e não aprendo, não desisto, não melhoro: teimo em pedir o impossível e fazer cara feia quando ganho pouco. Tudo bem. Acho mais bonita a insatisfação de quem quis o infinito e não conseguiu do que a satisfação dos que aceitaram viver contentes na miséria. Vejo um certo charme na melancolia de quem se debruça sobre os cadáveres de todos os seus sonhos mortos, num cemitério já superlotado, e ainda assim prossegue sonhando - e sonhando que algum sonho, pelo menos, não morra. Estou decidido a não virar mendigo de porta de padaria, vivendo de migalhas de pão e se resignando com aquilo que nem os cachorros se alegrariam de comer. Não nasci para comer migalhas.

Minha atitude frente à vida agora vai ser igual a de alguém que assalta a doceria.

:: boa pergunta ::

"...e qual foi a última vez que você fez
alguma coisa pela primeira vez?"

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

:: outra leitura das férias... um dos livros mais divertidos e pirados que já li! ::

TOM WOLFE
"O Teste do Ácido do Refresco Elétrico"

(The Electric Kool-Aid Acid Test,
trad Rubens Figueiredo, ed Rocco, RJ, 1993)

“Você não vê a coisa se aproximando?

Dez mil jovens das flores, do ácido e da maconha,
anfetamina, cabeleira, coração que sonha,
Dez mil hippies, beats, cabeludos, doidões, todo o bando,
descendo a Haight Street em festa, cantando,
Tilintando os sininhos, colares, mandalas, badalação,
botas de duendes, barafunda, prostrado no chão
Diante do Profeta que retornou para os seus adoradores.
Tudo ao som da ladainha psicodélfica, polifônica gemeção,
Da banda musical dos Festivos Gozadores!”

Ah, os loucos anos 60! A mais pirada, a mais festiva e a mais invejada das décadas! E um de seus principais personagens, que bem merecia uma Respeitável Biografia escrita em estilo Adequadamente Doidão, é aquele nosso velho conhecido que se escondia nas iniciais de “Lucy in the Sky with Diamonds” (e quem sabe até mesmo em Louvado Seja Deus... ho ho ho!)... Pois os anos 60 não teriam sido assim tão loucos nem assim tão legais sem a Ação Tutelar realizada pelo ácido lisérgico, aquela mágica Substância Potencializadora de Percepções Alternativas da Realidade que acabou por se tornar uma febre incontrolável e marcar para sempre o panorama social, cultural e musical daquela década...

O negócio é que o LSD foi um fenômeno sociológico e cultural que não deve ser subestimado. O LSD causou altos debates sociais: foi esmiuçado em longas e polêmicas grandes reportagens na imprensa (capa da Life Magazine em abril de 1966, por exemplo), utilizado em experimentos acadêmicos em psicoterapêutica, explorado em detalhes num excelente documentário da BBC (LSD - The Beyond Within) - enfim, deu uma polêmica braba e foi demonizado e idolatrado com igual fervor pelos dois lados, o dos curtidores e dos caretas (estes, em sua maioria, falando mal sem nunca ter usado, claro)... E dizer Fenômeno Sociológico não é exagero, pois bem sabemos que o LSD foi a substância química de escolha de multidões de jovens que achavam que “sem droga a vida era uma droga” e que tinham como lema “transcender toda essa bosta”... Sem falar que também se tornou Musa Inspiradora para artistas de peso, como é bem sabido, e hoje devemos dizer “obrigado!” a ele tanto quanto a Lennon, McCartney, Wilson e Barrett por existirem maravilhas como Sgt Peppers Lenely Hearts Club Band, Pet Sounds e The Piper at The Gates Of Dawn. O LSD foi até considerado pelos mais messiânicos como um Auxílio Químico Formidável para a conquista da União Mística e possível fundamento de uma Nova Religião Ocidental (!!!).

Correm até boatos que a própria CIA fez experimentos com LSD para verificar se ele era uma boa ferramenta para arrancar informação de prisioneiros durante a Guerra Fria e que foi por essa via (via CIA!) que o treco adentrou nos EUA e depois se disseminou fora de controle. Pode ser lorota, mas que lorota legal! Enfim: não há História dos Anos 60 possível sem a participação do LSD. E Tom Wolfe, renomado autor americano famoso por seu A Fogueira das Vaidades, embarca numa insana viagem de gonzo jornalismo para contar direitinho como é que Ken Kesey e sua gangue, os Merry Pranksters (ou Festivos Gozadoers), praticamente começaram a Mega Orgia do Ácido dos Loucos Sixties...

Ken Kesey, junto com Timothy Leary, foi um dos maiores gurus do ácido naquela década. O cara tinha lançado seu primeiro romance em 1962, o clássico Um Estranho no Ninho, livro que havia sido muito bem recebido pela crítica e que seria adaptado depois para o cinema por Milos Forman, com Jack Nicholson no papel principal, e paparia os mais importantes Oscar de seu ano, se tornando um Grande Clássico Americano. Kesey poderia ter seguido carreira literária e ter virado um beatnik tão respeitado quanto Jack Kerouac, ou um Poderoso Autor Americano como Philip Roth ou Paul Auster, mas preferiu embarcar numa outra viagem – e essa, da mais pura Piração...

* * * * *

2. UMA CHÁCARA E UMA VIAGEM DE BUSÃO

Começou mais ou menos assim:

Ken Kesey um dia ficou sabendo que um Hospital Psiquiátrico pagava 75 dólares por dia para voluntários que quisessem servir de cobaias num experimento com drogas que supostamente produziam um estado de psicose temporária. Ken Kesey, que era um cara durão e temerário, achou este um “bico” interessante e topou. Foi aí que, aparentemente, ele teve as primeiras experiências legais de sentir “um orgasmo atrás da retina”, de ter “cinco bilhões de pensamento por segundo” e de “tornar-se uma bola de ping-pong numa enxurrada de estímulos sensoriais” (pgs. 47-48), entre outras coisas que... eram o maior barato, meu.

A droga ministrada, na verdade, era LSD. E Ken Kesey, sentindo-se o filho-da-puta mais sortudo do universo, estava sendo pago para usá-lo, enquanto “os médicos entravam com batas brancas, pranchetas, tiravam a pressão, auscultavam o coração, pegavam amostras de urina e pediam aos voluntários para tentar solucionar uns probleminhas simples de lógica e matemática” (pg. 50). Tudo isso aconteceu antes do LSD virar manchete nos jornais quando Timothy Leary, o ph.D. de Harvard, estava supostamente “fritando cérebros” de seus alunos ao ministrar-lhes ácido, o que deu toda aquela polêmica e acabou com o afastamento dele da Universidade....

Digamos o previsível clichê: Ken Kesey nunca mais foi o mesmo homem! Ele havia experimentado o que o bom Aldous Huxley tinha chamado de “a abertura das portas da percepção”; tinha descoberto uma entrada para o Éden da União Total com o Todo; tinha experimentado os efeitos de um brinquedinho psíquico que, no mínimo, era bem divertido. Kesey gostou tanto do barato que espalhou a boa nova para seus amigos e eles formaram uma espécie de Gangue de Curtidores de Ácido. Numa chácara em La Honda, Califórnia, se juntaram numa espécie de mega-república onde havia, além de muito LSD e maconha, um bom tanto de privacidade e paz e pureza pastoril e florestas de sequóia e muitos alto-falantes vomitando jazz e rock and roll o tempo todo. O que eles faziam ali? Ora, curtiam o Momento... Pois tudo o que existe é o agora, cara... Antene tua percepção e pouse no Presente Eternamente Presentificado e aí você vai ver o que é Curtição... e você tem que deixar-se fluir pra fora, irmão, e fazer tudo abertamente, tudo com espontaneidade, cada um respeitando a viagem do outro, por mais sem noção que pareça...

E os Festivos, conta-se, ficavam papeandos suas “conversas de livre associação, como uma conversa em forma de jazz...” (68) E Os Festivos se juntavam ali e “deitavam todos no chão e começavam a falar o que viesse à cabeça” - tudo sendo registrado para a posteridade pelos gravadores... E os Festivos, sob a influência de gente da psicanálise gestaltista como Fritz Perls, pai da “Viagem do Agora”, “faziam e diziam tudo abertamente, sem esconder nada atrás dos gestos habituais, declarando aquilo que realmente sentiam – gritos, acusações, abraços, lágrimas – uma perfeita delícia, é claro...” (129). Isso porque “qualquer tentativa de planejar, compor, orquestrar, escrever um roteiro, só servia pra trancar a gente do lado de fora do momento, confinados no mundo do condicionamento e adestramento no qual o cérebro era apenas uma válvula de escape...” (66-67)

E depois decidiram que podia ser legal pôr o pé na estrada e viajar doidões pela América inteira, escandalizando os caretas e convidando mais companheiros a embarcarem nas asas do LSD. Os Merry Pranksters, ou Festivos Gozadores, conseguem um busão escolar modelo de 1939, decorado com “todos os tons pastéis fluorescentes imagináveis em milhares de formas e desenhos”, “como se alguém tivesse dado 50 baldes de tinta luminosa a Hironymous Bosch e o mandasse atacar.” (20) E pé na estrada. Neal Cassady, o sujeito que serviu de inspiração para o personagem de Kerouac que estrela On The Road, era o motorista. E Ken Kesey era o mentor, o guia, o carismático líder dos doidões. E lá se foram eles, explorando as estradas da América, mijando em mil postos de gasolina e horrorizando mil Cidades de Gente de Bem por onde passavam - mas que podiam fazer os tiras e as autoridades civis e militares se não era proibido pela constituição agir de modo absolutamente insano e sem-pé-nem-cabeça?

A nave intergalática dos Merry Pranksters “possuía beliches e assentos e geladeira e uma pia para lavar pratos e armários e prateleiras e um monte de outros detalhes úteis para viver na estrada. Kesey comprou-o por 1.500 dólares – em nome de Viagens Intrépidas, Associados.” (76) Ah, claro: “o ácido tava em um suco de laranja na geladeira - você tomava um copo de papel cheio do suco e ficava a mil” (78). E o mais legal: a viagem estava sendo registrada em Audio Visual e ia iria virar um Filme Muito Louco, a vanguarda das vanguardas...

Alguém pode se levantar para dizer: “ora, mas alguém – e alguém Muito Importante! - já teve essa idéia antes!” Mas não – foi Kesey e sua trupe que tiveram a idéia primeiro e os 4 garotos de Liverpool, anos depois, fizeram algo parecido com uma Surrupiação Completa da Idéia Alheia. A fantasia dos Pranksters tinha se tornado a “fantasia do momento” para os Fab Four – e...


“no inicío de 1967, os Beatles tiveram uma idéia fabulosa. Compraram um grande ônibus escolar, enfiaram 39 amigos dentro dele e saíram sacolejando pelos campos da Inglaterra, a cabeça estourando de ácido. Eles iam fazer um... filme. Não um filme comum, mas um filme inteiramente espontâneo, utilizando câmeras de mão, captando a experiência no momento mesmo em que as coisas ocorressem – tudo o que viesse à cabeça – dar pinotes, tagarelar, curtir o lance do momento, o caos visionário – sonhar acordado! Magia negra! Caos!”

Isso é o que hoje conhecemos como Magical Mystery Tour.

E anos antes do Tour Mágico Místico Chapadaço dos Beatles, os Festivos Gozadores de Ken Kesey já estavam inaugurando uma Nova Era e se sentiam muito mais avançados que qualquer outra “sociedade secreta” americana. Mesmo quando chegam a Nova York, percebem que estão, eles do Oeste, bem à frente de todo o resto. Porque “em julho de 1964, nem mesmo o mundo da vanguarda de Nova York estava pronto para o fenômeno de um bando de gente cruzando o continente americano num ônibus coberto de mandalas fosforecentes, brandindo câmeras de filmar e microfones para tudo que parecesse interessante nessa terra tão interessante, enquanto Neal Cassady dirigia o ônibus em curvas fechadas como o Super Hud e a nação americana deslizava pelo pára-brisa que nem uma dessas malditas paisagens filmadas em Cinemascope... como se as coisas estivessem caindo do Cosmos, das maquininhas de vender chicletes do deus dos Festivos...” (113)

* * * * *

3. ESPALHANDO A BOA NOVA

Kesey dizia, bancando o Profeta Ultra Generoso: “Quando a gente consegue uma coisa como isso que a gente conseguiu, não dá para ficar só sentado nos louros da glória. Tem que manter a coisa em movimento. Não é pra ficar parado, segurando a coisa na mão. Tem que fazer a coisa se mexer e passar para os outros. Só vai funcionar se a gente puser os outros na jogada”. (206)

Pois então: a boa-nova precisa ser espalhada. Não basta manter o Barato preso dentro de um ônibus maluco. A humanidade precisa gozar da nova maravilha. “Kesey compreende que eles, os Festivos, já possuem a perícia técnica e o equipamento necessário para criar um estado de exaltação mental como o mundo jamais viu, alvoroço total, ligação total, amplificado e... controlado – além do instrumento mais eficiente jamais sonhado para abrir as portas da mente do mundo: qual seja, o LSD de Owsley.” (245)

Então os Pranksters começam a espalhar o ácido por aí – e logo ele estaria impregnando o Ar Dos Tempos. Os tais dos Testes do Ácido eram grandes festas multimídia lotadas de projeções de vídeos, estroboscópios, música ao vivo e gente muito louca pirando com ácido. O “refresco” servido aos convidados estava devidamente “turbinado” para fazer bem mais do que refrescar: te deixava elétrico.

Foi o Festival de Viagens e Testes do Ácido que “fez decolar rapidamente e com toda a força o barato psicodélico, que explodiu para fora da esfera subterrânea de um modo que ninguém podia imaginar. Leary e Alpert e suas experiências obtiveram muita publicidade, mas parecia algo bastante isolado, que dizia respeito apenas a dois médicos de Harvard, com suas caras muito solenes e esotéricas, no final das contas. Essa novidade de San Francisco, Los Angeles e LSD, com jovens pirados e rock'n'roll delirante, dava a impressão de que a peste do LSD tinha se disseminado como uma infecção entre a juventude – o que, de fato, era verdade. Muito poucos compreenderam que tudo havia emanado de uma única fonte elétrica: Kesey e os Festivos Gozadores.” (301)

Não demoraria até que “milhares de garotos se mudassem para San Francisco em busca de uma vida baseada no LSD e na coisa psicodélica.” Quando as autoridades finalmente se preocupam, já é um tanto tarde demais. No dia em que o ácido é proibido por lei na Califórnia, há uma baita duma festa que levanta um dedo médio enorme para o que acaba de ser decretado: “e milhares vieram correndo se amontoar ali, vestidos a caráter, tilintando sininhos, entoando cânticos, dançando em êxtase, jogando a cabeça para um lado e para outro e acenando para os guardas com seus gestos satíricos favoritos, jogando flores sobre eles, sepultando aqueles filhos da mãe sob tenras e sumarentas pétalas de amor. Ah, Jesus, a coisa foi fantástica, mil cabeças num mesmo barato, milhares de cabeludos pregando o amor e deixando confusas as mentes dos guardas e de todo mundo com aquela celebração de amor e euforia.” (18)

E aí, vocês sabem... “...nada no mundo é capaz de deter essa coisa. É como um pedregulho rolando morro abaixo – a gente pode olhar, falar do assunto, gritar e dizer “Merda!”, mas não pode fazer parar.”

* * * * * *

4. UMA RELIGIÃO?
Gente sugeria que todos os Curtidores de Ácido organizassem uma Religião Séria e Legalizada, mais ou menos como Timothy Leary estava tentando fazer com sua Liga da Descoberta Espiritual, trasnformando a maconha e o LSD em sacramentos legalizados. Isso, é claro, só faria o barato ficar muito mais legal com a diminuição das nóias que surgiam em muita gente que, apesar de estar descobrindo Coisas Maravilhosas através do ácido, acabavam tendo muitas bad trips onde os tiras apareciam subitamente para estragar a festa e levar todo mundo em cana...

Kesey até entra numas ondas de Messias. “Estamos agora num período igual ao que São Paulo viveu no início do cristianismo”, disse ele num momento em que aparentemente nem estava chapado. “São Paulo diz que se eles sacaneiam a gente numa cidade, a gente se muda para outra, e se sacaneiam a gente nessa outra, a gente se muda para outra...” Espalhando a boa nova para os irmãos!

“Na verdade, nenhuma das grandes religiões, cristianismo, budismo, islã, jainismo, judaísmo, zoroastrismo, hinduísmo, nenhuma delas começou partindo de um sistema filosófico ou sequer de uma idéia central. Todas começaram com uma irresistível experiência nova, aquilo que Joachim Wach chamava 'a experiência do sagrado', e Max Weber, de 'possessão da divindade', a sensação de ser um vaso no qual o divino é vertido.” (137) Não há muita diferença entre a Experiência Mística e a Experiência Psicodélica, eis o ponto.

“Dentro do círculo religioso, definir a posição de alguém era uma questão muito simples. O mundo estava sempre nitidamente dividio entre os 'cientes', aqueles que tiveram a experiência de serem taças para o divino, e uma grande massa de 'inscientes', 'os não musicais', 'os desafinados'. Ou: a gente está no ônibus ou fora do ônibus. Os Cientes nunca se mostravam conscientemente esnobes em relação aos Inscientes, mas na verdade a maior parte daqueles bundões abobolhados e suas boas almas certinhas e obedientes não podiam deixar de parecer a eles uns casos perdidos. (...) Mas esses grupos tratavam com generosa solicitude qualquer um que mostrasse possibilidades, que fosse um irmão potencial.” (139-140)

O caminho de Leary enveredava no sentido da fundação de uma nova religião, nos moldes budistas, com o LSD sendo idolatrado como um Possibilitador de Contatos com o Divino e de União com o Todo. Tom Wolfe brinca que dizendo que, para Leary, “nossa casa devia ser um lugar de pureza, um local em que o próprio Gautama Buda poderia entrar com naturalidade, vindo do ano 485 a C, e se sentir em casa. Pois vai chegar o dia em que o mato voltará a crescer nas ruas, numa pureza pastoril, pois a vida é uma merda, um cárcere de carmas ruins, uma interminável luta contra a catástrofe, a qual só se pode evitar mediante a completa purificação da alma, completa passividade, em que a pessoa se converte em nada... mas, ao mesmo tempo, um receptáculo do Todo...” (382)

Já nos Merry Pranksters de Kesey, “...não havia teologia alguma, nem filosofia, pelo menos não no sentido de um ismo. Não havia o objetivo de alcançar uma ordem moral aperfeiçoada no mundo, nem alguma ordem social mais justa, nada que dissesse respeito à salvação, e com toda certeza nada relacionado a imortalidade ou vida no além. Depois da morte! Isso era piada. Se alguma vez existiu um grupo de pessoas inteiramente dedicadas a viver o aqui e o agora, esse grupo foi o dos Festivos.” (136)

O fato é que, mesmo que Ken Kesey se recusasse a servir como um líder espiritual ou o criador de uma seita, a experiência psicodélica foi considerada por grande parte de seus adeptos como uma experiência profundamente religiosa. Não foi só a mente brilhante de Aldous Huxley que viu altas potencialidades espirituais nessas substâncias químicas de expansão da consciência - os relatos de quase todos os usuários de LSD ou mescalina concordam nesse ponto: o segredo do universo se revela quando se está sob o efeito. Mesmo que depois, ó mundo cruel, a gente esqueça qual era o segredo.

“...a gente acaba vendo as coisas por um outro olho completamente diferente. Todos nós temos uma boa parte da mente trancada. Ficamos banidos de um mundo que nos pertence. E essas drogas parecem ser a chave que abre essas portas trancadas. Quantos? - talvez uma dúzia de pessoas no mundo todo tinham conhecimento deste incrível segredo! Uma dela era Aldous Huxley, que tomara mescalina e havia escrito a respeito no livro As Portas da Percepção. Ele comparou o cérebro a uma 'válvula de escape'. Na percepção comum, os sentidos enviam uma estonteante carga de informações para o cérebro, que as filtra muitas vezes até que por fim restam apenas ínfimas gotas, as quais ele pode manejar com segurança a fim de garantir a sobrevivência em um mundo intensamente competitivo. O homem se tornou tão racional, tão utilitário, que essas gotas se tornam cada vez mais ralas e insignificantes. Para a mera sobrevivência, o sistema é eficiente, mas aniquila a parte mais maravilhosa da experiência potencial do homem, sem que ele sequer saiba disso. Ficamos banidos de um mundo que nos pertence. O homem primitivo pôde desfrutar com plenitude a rica experiência das torrentes do fluxo sensorial. As crianças têm essa experiência por alguns meses – até que o treinamento 'normal', o condicionamento, fecha as portas para esse outro mundo, em geral para sempre. De algum modo, disse Huxley, as drogas abriram essas portas ancestrais. E, através delas, o homem moderno pode afinal descobrir em si um dom e um privilégio divinos...” (52)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

:: testando o imeem! ::


A Casey Dienel, the dearest peach on my dream-girl collection, está de volta. Ela agora atende pelo nome de White Hinterland (sexy!) e tem o lançamento de seu novo álbum previsto para Março agora. A Rabisco acabou por falir (!) depois que eu saí assinando matéria de capa (sintomático!), mas o cadáver de tão bacana revista eletrônica ainda está exposto no http://www.rabisco.com.br/, com a velha entrevista que fiz com a mocinha ainda por lá. Quem não se alembra, colem lá!

(tá funfando aí o imeem?)

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

:: defender a alegria ::

Defender a alegria como uma trincheira
defendê-la do escândalo e da rotina
da miséria e dos miseráveis
das ausências transitórias
e das definitivas
defender a alegria como um princípio
defendê-la do assombro e dos pesadelos
dos imparciais e dos neutros
das doces infâmias
e dos graves diagnósticos
defender a alegria como uma bandeira
defendê-la do raio e da melancolia
dos ingênuos e dos canalhas
da retórica e das paradas cardíacas
das endemias e das academias
defender a alegria como um destino
defendê-la do fogo e dos bombeiros
dos suicidas e dos homicidas
das férias e da angústia
da obrigação de estar alegre
defender a alegria como uma certeza
defendê-la da óxidação e da mesquinharia
da famosa pátina do tempo
do cinismo e do oportunismo
dos proxenetas do riso
defender a alegria como um direito
defendê-la de deus e do inverno
das maiúsculas e da morte
dos clamores e das mágoas
do acaso
e também da alegria.

(Defesa da alegria, Mário Benedetti)

[Mais um trecho que surrupiei do Orkut da minha miguxa Él - muito bom
o blog da guria! Certos scrapbooks são mó voyeurismo muito bem recompensado! :]

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

:: o amor acaba ::


"O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba." (paulo mendes campos)

:: verbos bonitos ::

Pequena coleção de verbos bonitos, por Paulo Mendes Campos:

“...eles se amavam, isto é, se reduziam e ampliavam, exercitavam-se, aprendiam-se, compunham-se, desvirtuavam-se, desabriam-se, sobreexcediam-se, transpunham-se, inventavam-se, pressupunham-se, imparcializavam-se, acolhiam-se, desviviam-se, pastavam-se, intercediam-se, subentendiam-se, verdeciam-se, desentristeciam-se, revertiam-se, entreconheciam-se, corrigiam-se, afluíam-se, definiam-se, consentiam-se, compungiam-se, ingeriam-se, traduziam-se, reagradeciam-se, surpreendiam-se, engrandeciam-se, resolviam-se, socorriam-se, riam-se, mordiam-se, dissolviam-se, imortalizavam-se, encapelavam-se, responsabilizavam-se, inflacionavam-se, transfiguravam-se, recuperavam-se, participavam-se, esperançavam-se, frutificavam-se, escravizavam-se, libertavam-se, animalangelizavam-se – pois o amor, visivelmente, é cego.” - in: O Amor Acaba.