terça-feira, 2 de setembro de 2008

:: shyness ::

:: coração de coelho ::


Ask

Shyness can stop you
From doing all the things in life
You'd like to

So, if there's something you'd like to try
If there's something you'd like to try
ask me, ask me, ask me
i won't say no - how could i?


os tímidos, somados, podem até ser uma multidão. mas não evitam com isso a solidão. não é seu estilo montar uma gangue, uma trupe, uma turma. assim, se sentem mais sós do que na verdade estão. insistindo em baixar os olhos quando merecem andar de cabeça erguida. teimando em pedir desculpas por coisas que não precisa. inclusive por existir. como se fosse crime. como se fosse feio.

talhados como argila por medos infantis que criaram um adulto de mentira, que esconde atrás de uma carne grande uma alminha ainda mirim. lembra? do ataque epilético quando a professora chamava para recitar a tabuada? das taquicardias tremendas quando era para ler o texto frente aos olhos cruéis da classe? ou da completa sem-gracice quando estourava um inoportuno pum? ou do acanhamento no canto, a procura pelas sombras, o desejo de anonimato e de apagamento, como se você quisesse passar pelo mundo sem ser notado, e depois sair pela porta-dos-fundos, bem de fininho?

lembra? da sua linguinha bem guardada dentro da boca, silente por excesso de ebulição mental, contida porque se se abrisse ia ser vulcão em erupção, lava e chama pra todo lado, e que sempre fazia com que algum tio babaca e ruidoso viesse te perguntar: 'mas o gato comeu sua língua'? e aquele temor supersticioso de chegar frente a qualquer das pequenas deusas por quem você se apaixonava e pra quem não conseguia a proeza de dizer um mero "oi"? quanta dificuldade para roubar o primeiro beijo. inesquecível por ter sido a coroação de uma longa e cansativa busca. o que para outros é ninharia, pra ti foi epopéia.

os tímidos? os que têm essa mania de nunca estar com os portões escancarados. sabe-se lá quem vai entrar! melhor se precaver. como o Teatro Mágico do Hermann Hesse, a alma dos introspectivos traz em sua porta uma placa que informa: ENTRADA PARA RAROS. são pouquíssimos os que recebem a chave para entrar em nossa bem-protegida cidadela interior. prezamos muito este playground que temos, lá no fundo escuro de nós mesmos, para permitir que qualquer vândalo entre e nos deprede os sonhos. um certo amor por esse refúgio de solidão onde podemos ir nos esconder e não sermos achados por ninguém. um certo gosto por um verniz de mistério, por funduras insondáveis, por abismos incognoscíveis. uma avareza espiritual que nos deixa agarrados ao que temos e não queremos compartilhar. um certo pânico de que nossa alma, vista nua, seja feia como o corpo de uma velha putrescente.

lembra? lembra dela, na sua cama, querendo descansar das avalanches de beijos com a cabeça sobre o seu peito? procurando o sono no lugar mais inadequado. "edu, você tem coração de coelho...". lembra? faltou a brincadeira de dizer: "ah, amoreco, é péssima idéia tentar dormir com os ouvidos colados no meu tórax. uma barulheira dos diabos! como ser vizinho de um baterista de hardcore. e é você, você que me põe assim, desembestado, frenético."

lembra? do que tanto costuma se repetir? pelo medo de estragar o que já é tão bom, você se furta de conseguir o que é ainda melhor. É a solução de quem não quer perder o que já tem - e fecha a mão pro que há de vir. No reino das pequenas delicadezas, das agradáveis ternuras, sem o salto para o amor total. ah, amiguinho, se você quiser embarcar no amor levando uma mala lotada de certezas, me desculpe: vais apodrecer no porto. Neste barco só se sobe sem garantias na bagagem, sem mapas no bolso. É preciso se lançar, sabendo que depois não se saberá o caminho de volta pra casa. Mas pra quê querer voltar ao familiar ao invés de se deixar arrastar?

e depois vc chora e sorri, triste e feliz, se aceitando e se odiando. contente por ser tímido, louco de raiva por ser covarde, só contando - ah, triste aritmética! - as oportunidades perdidas. é o que trás lágrimas aos olhos: tudo aquilo que ficou no horizonte, à espera do salto que não deu, do barco em que não subiu, da loucura que não ousou. a nojeira que é continuar um ser que se conjuga na primeira pessoa do singular. e a comum melancolia por aquele paraíso, imaginado, perdido, inalcançado, que ficou ali, intocado, a um beijo de distância.