domingo, 17 de junho de 2007

:: dizei aos bombeiros que subam ao coração em chamas com um par de carícias ::


"Alô!
Quem fala?
Mamãe?
Mãe!
Teu filho está esplendidamente enfermo,
Tem um incêndio no coração.
Diz às manas Ludmila e Olga
que ele já não sabe pra onde ir.
Que cada palavra
até a mais leve graça
que lhe sai da boca ardente
salta como uma prostituta nua
fugindo de um bordel em chamas.

As gentes farejam:
- "Cheira a queimado!"
Chamaram a quem?
Brilham capacetes...
São inúteis essas botas gigantes...
Dizei aos bombeiros
que subam ao coração em chamas
com um par de carícias!
Eu mesmo
derramarei de meus olhos
tonéis de lágrimas.
Deixai que eu me apóie
em meu próprio peito.
Saltarei, saltarei, saltarei!
É inútil. Tudo desaba.
Jamais fugirás de teu próprio coração."

* * * * *

"...surpreendo o pulsar selvagem
do coração das capitais.

Desabotoado, o coração quase de fora,
abria-me ao sol e aos jatos d'água.
Entrai com vossas paixões!
Galgai-me com vossos amores!


Doravante não sou mais dono de meu coração!
Nos demais - eu sei,
qualquer um o sabe -
o coração tem domicílio
no peito.
Comigo
a anatomia ficou louca.
Sou todo coração -
em todas as partes palpita.

Oh! quantas são as primaveras
em vinte anos acesas nesta fornalha!"

* * * * *

"Amarra-me a um cometa,
como à cauda de um cavalo
e chicoteia!
Que meu corpo se estraçalhe
nos dentes das estrelas.
Ou então: quando minh'alma migratória
franzindo o cenho carrancudo
estiver diante de teu tribunal,
atira a Via-Láctea,
faz dela uma forca
e dependura-me se quiseres,
qual um criminoso.
Faze o que quiseres."

(MAIAKÓVSKI! - novo poeta do coração! comecei a ler há pouco, apesar de já ter ouvido falar faz muito... me atrasei no travar de relações mais íntimas com esse russo genial porque eu antes tinha preconceitos tolos: achava que era mera poesia de propaganda da Revolução Russa, que devia ser gelado como são quase todos os marxistas e livros de marxismo, que não tinha nada a ver comigo ler a poesia "engajada" de um comunista suicida, essas bobagens - mas caráculas, que grande descoberta e que grande poeta! Fazia tempo que não lia versos com tanta empolgação. Ler Maiakóvski me deixa sentindo como se eu estivesse colado a um cometa que está sendo chicoteado como um cavalo, ou como se eu pudesse ficar me esquentando com o calor dessas palavras saídas de um peito em chamas, ou como se eu também me sentisse incapaz de apontar em algum canto de mim o domicílio do coração - também aqui a anatomia entrou em pane, meu amigo, e eu... eu sou todo coração... :D)