sábado, 23 de agosto de 2008

:: o coração não se moderniza ::


THE BROKEN HEART
by John Donne

He is stark mad, whoever says,
That he hath been in love an hour,
Yet not that love so soon decays,
But that it can ten in less space devour ;
Who will believe me, if I swear
That I have had the plague a year?
Who would not laugh at me, if I should say
I saw a flask of powder burn a day?

Ah, what a trifle is a heart,
If once into love's hands it come !
All other griefs allow a part
To other griefs, and ask themselves but some ;
They come to us, but us love draws ;
He swallows us and never chaws ;
By him, as by chain'd shot, whole ranks do die ;
He is the tyrant pike, our hearts the fry.

If 'twere not so, what did become
Of my heart when I first saw thee?
I brought a heart into the room,
But from the room I carried none with me.
If it had gone to thee, I know
Mine would have taught thine heart to show
More pity unto me ; but Love, alas !
At one first blow did shiver it as glass.

Yet nothing can to nothing fall,
Nor any place be empty quite ;
Therefore I think my breast hath all
Those pieces still, though they be not unite ;
And now, as broken glasses show
A hundred lesser faces, so
My rags of heart can like, wish, and adore,
But after one such love, can love no more.

* * * * *

É doido varrido quem alguma vez disser
Que esteve apaixonado por uma hora;
Não que o amor tão cedo se deteriore,
Mas porque pode devorar dez em menos tempo.
Quem me acreditará se eu jurar
Que sofri dessa praga por um ano?
Quem não se riria se eu dissesse que vi
Um cantil de pólvora arder durante um dia?

Ah, que ninharia é um coração
Se alguma vez cai nas mãos do amor!
Todas as outras dores cedem lugar
A outras dores, e pouco ocupam por si próprias.
Elas chegam até nós, mas o Amor absorve-nos.
Engole-nos, e nunca mastiga:
Como fogo de metralha, mata fileiras inteiras,
Ele é a lança tirana, nossos corações a ralé.

Se assim não fosse, o que aconteceu
A meu coração da primeira vez que te vi?
Trazia um coração quando entrei na sala,
Mas da sala parti sem levar nenhum:
Se tivesse fugido para ti, sei
Que teria ensinado o teu coração a mostrar
Mais clemência para comigo: mas, infeliz!
Ao primeiro toque o Amor estilhaçou-o como vidro.

Porém, nada em nada se pode converter,
Nem qualquer lugar ficar de todo vazio,
Por isso penso que no meu peito estão ainda
Todas essas partes, embora desunidas;
E agora, como os espelhos partidos que mostram
Uma centena de faces menores, assim os cacos
Do meu coração podem gostar, desejar e adorar,
Mas, depois de tal amor, não mais podem amar.

(in: Poemas Eróticos de John Donne)

Um poema duns 500 anos de idade. Que poderia ter sido escrito ontem. Isso se hoje em dia ainda existisse um poeta tão espetacular quanto John Donne - o único cara que, em língua inglesa, me deixa achando que Shakespeare tem rivais à altura.

Darwin que me perdoe, mas acho que a lei da evolução só age em certas fatias do organismo do homo sapiens. Para dentro do tórax ela não estende seu império! O mesmo músculo estúpido cai sempre nas mesmas ciladas e nos mesmos despenhadeiros, através dos séculos, nunca aprendendo nada que preste. Como diz a Lya Luft: "o coração não se moderniza...".