“i'm good at being uncomfortable
so i can't stop changin' all the time.”
(FIONA APPLE)
Querido Diário,
Essa semana eu pedi demissão. Num tava mais dando. Ouvi as sugestões deste ótimo conselheiro que é meu Tyler Durden interior e decidi vazar antes que a coisa chegasse às raias da demência. Me perguntei: pra quê ter medo da mudança? Dificílimo que seja para pior. E não seria bom entrar num ano novo que fosse de fato LIMPO? Folha em branco onde começar a rascunhar um novo capítulo do meu destino...
Pois decidi ir atrás da minha felicidade, que por lá ela certamente não estava...
O que eu aprendi com certeza com esses 6 meses de experiência com jornalismo corporativo, feito sob encomenda para uma gigante multinacional, é que isso realmente não tem absolutamente nada a ver comigo. Minha área de interesse é radicalmente diferente e meu coração permaneceu o tempo todo gélido e sem o mínimo raio de amor frente a um trabalho tão “capitalistinha” como esse. Porque eu não gosto nem de capitalismo, nem de ambiente empresarial, nem de terno e gravata, nem de hierarquias e cadeias de poder, nem de carros e montadoras e linhas de montagem, e muito menos de marketing travestido de informação e dedicado à constante fabricação de uma boa-imagem desta Deusa Moderna que é a Corporação Transnacional, amém. Eu com certeza absoluta estava no lugar errado pra mim, peixe fora d'água total, mal conseguindo respirar após ter sido pescado e posto fora do meu habitat natural.
Me parece que a vida não tem o menor sentido se a gente a gasta trabalhando com o que não gosta, só para poder ter dinheiro que gastaremos com bugigangas que nunca nos farão felizes, numa triste resignação perpétua a um destino de ovelha consumista, vendada e amordaça. O que eu realmente gosto é de arte, de ler e de escrever, de ouvir música, de tocar com banda, de ver milhões de filmes e imaginar-me fazendo os meus, de bater papo no boteco, de ficar olhando as estrelas, de pensar sobre a vida e sobre a morte, de estar com o braço sem relógios e os pulsos sem algemas, o coração podendo se derramar naquilo que se faz e a mente flanando livre como borboleta bêbada... Sonho com uma vida boêmia e despreocupada, de poeta pulguento como um vira-latas ou de eremita em núpcias com o Cosmos no meio de um bosque... talvez um destino trágico e nobre numa Paris henry-milleriana, ou numa Amsterdam cheia de padocas com maconha à preço de banana, me entregando por inteiro à experiência da busca, da vertigem, da aventura. A Gi tem uma frase genial: “Estes testes vocacionais são tendenciosos. Sempre nos direcionam para uma profissão. Nunca dizem que a gente nasce com vocação para vagabundo”. Se eu tenho vocação pra algo, deve ser pra isso: pra vagabundo, mas aqueles vagabundos ultra-produtivos, que vagueam de estrela em estrela, de poema em poema, de idéia em idéia, borboleteando e enloucrescendo, criando seu próprio mundo, moldando sua própria história, errando pelas calçadas da galáxia como bêbados a quem ninguém aponta o caminho, vivendo em permanente estado de ebriedade e de espanto, e dizendo-se, como Baudelaire: “Sempre achei ser útil uma coisa hedionda.” , ou, como Rimbaud: "Quanto à felicidade estabelecida, doméstica ou não... não, não posso."
Eu não tava mais conseguindo suportar lidar com uma pessoa que, em uns 5 meses de relação profissional, NUNCA, JAMAIS, NEM UMA MÍSERA VEZ me fez qualquer tipo de elogio, incentivo, mimo ou tratamento carinhoso. Eu posso ter dado das minhas mancadas e deslizes, coisa normal para um jornalista iniciante e recém-formado, mas não acho que um chefe deva fazer suas “sugestões de melhoria” ou “exigências de modificação” com tamanha arrogância, grosseria, insensibilidade e absoluta incapacidade de reconhecer QUALQUER VALOR no ser humano que está ali à sua frente. Incrível como a pessoa tem a coragem de criticar a minha FALTA DE MOTIVAÇÃO no trabalho quando ele, texto a texto, tratava de afundar a minha moral até os subsolos profundos do planeta Terra, me fazendo sentir como se eu fosse um pedaço de lixo humano que nem sabe escrever direito. E só porque eu usava “através” ao invés de “por meio de”, “funcionários” ao invés de “empregados” e às vezes, ó crime imperdoável, errava uma letra no nome de algum engravatado super pimpão na empresa. E olha que destes 500 mil caracteres que escrevi pra ele esse tempo todo, creio jamais ter cometido sequer um erro de concordância, ter usado um verbo mau conjugado ou ter perpetrado qualquer deslize ortográfico grotesco (o único que me lembro foi ter escrito “sessão”, como em “sessão de cinema”, ao invés de “seção” tal da empresa). E ainda assim, 6 meses sem um elogio sequer. Ele nunca fazia o mais sutil esforço de reconhecimento do meu valor, que para ele deve ser completamente inexistente. Sou na verdade praticamente uma barata ou uma pulga. Quando eu fazia uma matéria absolutamente perfeita, o prêmio que eu recebia dele era esse: o silêncio completo. Nem tinha direito a um joínha ou um sorriso? Claro que não. Eu soltaria foguetórios e faria uma festa pós-expediente no dia em que ele me dissesse uma palavra que para ele parecia tão impronunciável quanto o nome do Demônio: “parabéns!” Desde o princípio, achei absolutamente desproporcional o tratamento que ele dispensava a defeitos e acertos. Quando eu acertava, ele ficava quietinho, e ponto. Eu não havia feito nada além do meu santo dever. O senhorito espera ainda por cima demonstrações de gratidão!? Ora. Quando eu errava, ele se enfurecia como um maníaco, vinha pra cima soltando palavras cruéis feito um gângster, bem do mal e com voz de ursão, com uma secura de coração e uma tão absoluta falta de ternura que me deixava a alma toda machucada por dentro.
Eu nunca sou grosseiro com ninguém, nem mesmo com pessoas que merecem uns croques ou uns socos, e mesmo com aqueles com quem eu não deveria desperdiçar um mililitro da minha gentileza, e no entanto cruzo o meu caminho com pessoas com uma personalidade que irradia grosseria como se fosse um odor natural de suas almas sombrias. Eu tento me conservar numa bowa, sem me deixar contagiar pelos ataques psicóticos e histéricos dos outros, mas confesso que tem hora que é foda conservar a serenidade, especialmente quando seu chefe parece querer esfregar seu focinho em seu cocô a cada texto que você escreve. E eu lá vou querer ficar dividindo o mesmo espaço físico e o mesmo oxigênio com uma criatura que tanto se deleita com esse prazer sombrio que é machucar o outro?
E ele queria o quê, que eu me sentisse ENTUSIASMADÍSSIMO e ULTRA MOTIVADO com um trampo desses, que além do fato de não ser registrado, não ter 13º, não ter nenhum tipo de auxílio com transporte, alimentação ou saúde e me render a mixaria dumas 700 pilas ao mês, tinha que me fazer suportar constantes baques na minha dignidade? Olha, eu já tenho suficientes problemas com a minha auto-estima e não preciso conviver dia-a-dia com uma pessoa que parece adorar a idéia de me tratar como um imprestável facilmente substituível que faz tudo errado e sobre quem podem-se despejar as broncas mais truculentas sem a mínima ternura. Incrível como as pessoas sem-coração acham que o resto do mundo é sem-coração como elas. E depois de tudo isso, ele ainda me ESTRAÇALHA com críticas furibundas por eu me mostrar APÁTICO em meu tão entusiasmante ambiente de trabalho! Curioso pedido, este dele, que se parece com dizer para uma vaquinha que está sendo enfiada viva num moedor de carne: “Ora, mas a senhorita parece tão desmotivada!”
Descobri também que eu tenho um sério problema, muito enraizado na minha personalidade infame, com o tal do respeito às autoridades. No fundo eu ainda sou um adolescente fã de Nirvana que despreza todos esses tolos junkies de poder que pensam que podem falar conosco do alto de seus pedestais e soltando pela boca as ordens como se fossem dragões cuspindo fogo. Eu não nasci pra ser tratado como subordinado, pra ser submisso, pra ser olhado como menos, como meio, como empregadinho. São 7 anos morando em repúblicas estudantis, com muita droga rolando e porra-louquice ao extremo, com um quarto sempre em estado de zona absoluta e falta de higiene extrema, em que eu não tive que seguir horários muito rígidos nem suportar ter meus dias escravizados pelas necessidades alheias, de modo que é uma complicação dos diabos pra mim lidar com um chefe que era um CONTROL FREAK tão extremado que beira a neurose. Os generais de campo-de-concentração deviam ser assim, com sua obsessão com regras, obedecimento de ordens, disciplina férrea, querendo exterminar com fúria tudo que não se adequa a seus pequenos caprichos.
Eu nem gosto muito de dinheiro, de verdade, apesar de ter meus pequenos sonhos de consumo: uma guitarra nova de primeira classe, caixinhas de som firmeza pro P.C. e uma viagem para Amsterdam. Mas ter passado por essa experiência só me deixa morrendo de vontade de ganhar na loteria ou assaltar um banco – não pelo prazer que me daria comprar superfluidades ou viver escrotamente afundado nos meus próprios luxos, sem nem querer saber das criancinhas raquíticas da Etiópia, mas simplesmente para não ter que trabalhar nunca mais. E com isso eu não digo que gostaria de ficar coçando as bolas, de papos pro ar, deitado na rede, ouvindo Jack Johnson e a maresia, sem fazer nada de produtivo os dias todos, apesar desta ser uma perspectiva bastante atraente. Digo que gostaria de não ter esse EMPECILHO do trabalho no caminho da minha PRODUÇÃO. Pois eu gosto muito de agir, produzir, levar uma vida ativa, estar sempre lendo tudo o que posso, conhecendo o máximo possível de arte, filosofia, ciência e tudo o mais que eu puder, e sempre escrevendo, pondo pra fora idéias, desabafos, comentários e tudo o mais – de modo algum eu gostaria de levar uma vida infrutífera, de onde não nasce planta ou flor alguma, feito um chão de deserto povoado por cactos inúteis. Mas acho que minha vida só pode ser frutífera, só pode ser prestável, se eu não estiver alugando minha mente e minha energia para objetivos alheios que eu não me sinto a fim de referendar e de cujo valor eu desconfio com um ceticismo corrosivo. Ou seja: não me importo em trabalhar, em produzir, em suar os miolos, em pôr com todo o coração a minha energia e o meu entusiasmo em algo, desde que esse algo não seja marketing capitalista para uma transnacional sedenta por lucros, vendas e uma imagem cheia de compostura.
Bom, fica aí meu desabafo, pra fechar com chave de papelão de mendigo essa minha passagem tão brochante pelo supermercado do trabalho. Infelizmente, acho que vou ter que ficar metido nesta selva mais um tempinho, principalmente pelos trocados, então 2009 começa, para este pobre desempregado que vos fala, com a busca por mais um local de martírio onde eu vou me voluntariar – como aqueles malucos que se candidatam pra ir pra guerra. Tenho alguns ideais que seduzem meu desejo – trampar na Piauí, na Rolling Stone, na BRAVO! - mas não acho que tão cedo adentro esses santuários do Jornalismo Trimmassa. Se alguém souber de algum trampo suportável que me queira, me avisem! Ou então, daqui uns meses, se pá entro no Mestrado ou vou mendigar uma esmolinha na Rio Branco, ali pertinho da Crackolândia... “tem um real, tio?”
Querido Diário,
Essa semana eu pedi demissão. Num tava mais dando. Ouvi as sugestões deste ótimo conselheiro que é meu Tyler Durden interior e decidi vazar antes que a coisa chegasse às raias da demência. Me perguntei: pra quê ter medo da mudança? Dificílimo que seja para pior. E não seria bom entrar num ano novo que fosse de fato LIMPO? Folha em branco onde começar a rascunhar um novo capítulo do meu destino...
Pois decidi ir atrás da minha felicidade, que por lá ela certamente não estava...
O que eu aprendi com certeza com esses 6 meses de experiência com jornalismo corporativo, feito sob encomenda para uma gigante multinacional, é que isso realmente não tem absolutamente nada a ver comigo. Minha área de interesse é radicalmente diferente e meu coração permaneceu o tempo todo gélido e sem o mínimo raio de amor frente a um trabalho tão “capitalistinha” como esse. Porque eu não gosto nem de capitalismo, nem de ambiente empresarial, nem de terno e gravata, nem de hierarquias e cadeias de poder, nem de carros e montadoras e linhas de montagem, e muito menos de marketing travestido de informação e dedicado à constante fabricação de uma boa-imagem desta Deusa Moderna que é a Corporação Transnacional, amém. Eu com certeza absoluta estava no lugar errado pra mim, peixe fora d'água total, mal conseguindo respirar após ter sido pescado e posto fora do meu habitat natural.
Me parece que a vida não tem o menor sentido se a gente a gasta trabalhando com o que não gosta, só para poder ter dinheiro que gastaremos com bugigangas que nunca nos farão felizes, numa triste resignação perpétua a um destino de ovelha consumista, vendada e amordaça. O que eu realmente gosto é de arte, de ler e de escrever, de ouvir música, de tocar com banda, de ver milhões de filmes e imaginar-me fazendo os meus, de bater papo no boteco, de ficar olhando as estrelas, de pensar sobre a vida e sobre a morte, de estar com o braço sem relógios e os pulsos sem algemas, o coração podendo se derramar naquilo que se faz e a mente flanando livre como borboleta bêbada... Sonho com uma vida boêmia e despreocupada, de poeta pulguento como um vira-latas ou de eremita em núpcias com o Cosmos no meio de um bosque... talvez um destino trágico e nobre numa Paris henry-milleriana, ou numa Amsterdam cheia de padocas com maconha à preço de banana, me entregando por inteiro à experiência da busca, da vertigem, da aventura. A Gi tem uma frase genial: “Estes testes vocacionais são tendenciosos. Sempre nos direcionam para uma profissão. Nunca dizem que a gente nasce com vocação para vagabundo”. Se eu tenho vocação pra algo, deve ser pra isso: pra vagabundo, mas aqueles vagabundos ultra-produtivos, que vagueam de estrela em estrela, de poema em poema, de idéia em idéia, borboleteando e enloucrescendo, criando seu próprio mundo, moldando sua própria história, errando pelas calçadas da galáxia como bêbados a quem ninguém aponta o caminho, vivendo em permanente estado de ebriedade e de espanto, e dizendo-se, como Baudelaire: “Sempre achei ser útil uma coisa hedionda.” , ou, como Rimbaud: "Quanto à felicidade estabelecida, doméstica ou não... não, não posso."
Eu não tava mais conseguindo suportar lidar com uma pessoa que, em uns 5 meses de relação profissional, NUNCA, JAMAIS, NEM UMA MÍSERA VEZ me fez qualquer tipo de elogio, incentivo, mimo ou tratamento carinhoso. Eu posso ter dado das minhas mancadas e deslizes, coisa normal para um jornalista iniciante e recém-formado, mas não acho que um chefe deva fazer suas “sugestões de melhoria” ou “exigências de modificação” com tamanha arrogância, grosseria, insensibilidade e absoluta incapacidade de reconhecer QUALQUER VALOR no ser humano que está ali à sua frente. Incrível como a pessoa tem a coragem de criticar a minha FALTA DE MOTIVAÇÃO no trabalho quando ele, texto a texto, tratava de afundar a minha moral até os subsolos profundos do planeta Terra, me fazendo sentir como se eu fosse um pedaço de lixo humano que nem sabe escrever direito. E só porque eu usava “através” ao invés de “por meio de”, “funcionários” ao invés de “empregados” e às vezes, ó crime imperdoável, errava uma letra no nome de algum engravatado super pimpão na empresa. E olha que destes 500 mil caracteres que escrevi pra ele esse tempo todo, creio jamais ter cometido sequer um erro de concordância, ter usado um verbo mau conjugado ou ter perpetrado qualquer deslize ortográfico grotesco (o único que me lembro foi ter escrito “sessão”, como em “sessão de cinema”, ao invés de “seção” tal da empresa). E ainda assim, 6 meses sem um elogio sequer. Ele nunca fazia o mais sutil esforço de reconhecimento do meu valor, que para ele deve ser completamente inexistente. Sou na verdade praticamente uma barata ou uma pulga. Quando eu fazia uma matéria absolutamente perfeita, o prêmio que eu recebia dele era esse: o silêncio completo. Nem tinha direito a um joínha ou um sorriso? Claro que não. Eu soltaria foguetórios e faria uma festa pós-expediente no dia em que ele me dissesse uma palavra que para ele parecia tão impronunciável quanto o nome do Demônio: “parabéns!” Desde o princípio, achei absolutamente desproporcional o tratamento que ele dispensava a defeitos e acertos. Quando eu acertava, ele ficava quietinho, e ponto. Eu não havia feito nada além do meu santo dever. O senhorito espera ainda por cima demonstrações de gratidão!? Ora. Quando eu errava, ele se enfurecia como um maníaco, vinha pra cima soltando palavras cruéis feito um gângster, bem do mal e com voz de ursão, com uma secura de coração e uma tão absoluta falta de ternura que me deixava a alma toda machucada por dentro.
Eu nunca sou grosseiro com ninguém, nem mesmo com pessoas que merecem uns croques ou uns socos, e mesmo com aqueles com quem eu não deveria desperdiçar um mililitro da minha gentileza, e no entanto cruzo o meu caminho com pessoas com uma personalidade que irradia grosseria como se fosse um odor natural de suas almas sombrias. Eu tento me conservar numa bowa, sem me deixar contagiar pelos ataques psicóticos e histéricos dos outros, mas confesso que tem hora que é foda conservar a serenidade, especialmente quando seu chefe parece querer esfregar seu focinho em seu cocô a cada texto que você escreve. E eu lá vou querer ficar dividindo o mesmo espaço físico e o mesmo oxigênio com uma criatura que tanto se deleita com esse prazer sombrio que é machucar o outro?
E ele queria o quê, que eu me sentisse ENTUSIASMADÍSSIMO e ULTRA MOTIVADO com um trampo desses, que além do fato de não ser registrado, não ter 13º, não ter nenhum tipo de auxílio com transporte, alimentação ou saúde e me render a mixaria dumas 700 pilas ao mês, tinha que me fazer suportar constantes baques na minha dignidade? Olha, eu já tenho suficientes problemas com a minha auto-estima e não preciso conviver dia-a-dia com uma pessoa que parece adorar a idéia de me tratar como um imprestável facilmente substituível que faz tudo errado e sobre quem podem-se despejar as broncas mais truculentas sem a mínima ternura. Incrível como as pessoas sem-coração acham que o resto do mundo é sem-coração como elas. E depois de tudo isso, ele ainda me ESTRAÇALHA com críticas furibundas por eu me mostrar APÁTICO em meu tão entusiasmante ambiente de trabalho! Curioso pedido, este dele, que se parece com dizer para uma vaquinha que está sendo enfiada viva num moedor de carne: “Ora, mas a senhorita parece tão desmotivada!”
Descobri também que eu tenho um sério problema, muito enraizado na minha personalidade infame, com o tal do respeito às autoridades. No fundo eu ainda sou um adolescente fã de Nirvana que despreza todos esses tolos junkies de poder que pensam que podem falar conosco do alto de seus pedestais e soltando pela boca as ordens como se fossem dragões cuspindo fogo. Eu não nasci pra ser tratado como subordinado, pra ser submisso, pra ser olhado como menos, como meio, como empregadinho. São 7 anos morando em repúblicas estudantis, com muita droga rolando e porra-louquice ao extremo, com um quarto sempre em estado de zona absoluta e falta de higiene extrema, em que eu não tive que seguir horários muito rígidos nem suportar ter meus dias escravizados pelas necessidades alheias, de modo que é uma complicação dos diabos pra mim lidar com um chefe que era um CONTROL FREAK tão extremado que beira a neurose. Os generais de campo-de-concentração deviam ser assim, com sua obsessão com regras, obedecimento de ordens, disciplina férrea, querendo exterminar com fúria tudo que não se adequa a seus pequenos caprichos.
Eu nem gosto muito de dinheiro, de verdade, apesar de ter meus pequenos sonhos de consumo: uma guitarra nova de primeira classe, caixinhas de som firmeza pro P.C. e uma viagem para Amsterdam. Mas ter passado por essa experiência só me deixa morrendo de vontade de ganhar na loteria ou assaltar um banco – não pelo prazer que me daria comprar superfluidades ou viver escrotamente afundado nos meus próprios luxos, sem nem querer saber das criancinhas raquíticas da Etiópia, mas simplesmente para não ter que trabalhar nunca mais. E com isso eu não digo que gostaria de ficar coçando as bolas, de papos pro ar, deitado na rede, ouvindo Jack Johnson e a maresia, sem fazer nada de produtivo os dias todos, apesar desta ser uma perspectiva bastante atraente. Digo que gostaria de não ter esse EMPECILHO do trabalho no caminho da minha PRODUÇÃO. Pois eu gosto muito de agir, produzir, levar uma vida ativa, estar sempre lendo tudo o que posso, conhecendo o máximo possível de arte, filosofia, ciência e tudo o mais que eu puder, e sempre escrevendo, pondo pra fora idéias, desabafos, comentários e tudo o mais – de modo algum eu gostaria de levar uma vida infrutífera, de onde não nasce planta ou flor alguma, feito um chão de deserto povoado por cactos inúteis. Mas acho que minha vida só pode ser frutífera, só pode ser prestável, se eu não estiver alugando minha mente e minha energia para objetivos alheios que eu não me sinto a fim de referendar e de cujo valor eu desconfio com um ceticismo corrosivo. Ou seja: não me importo em trabalhar, em produzir, em suar os miolos, em pôr com todo o coração a minha energia e o meu entusiasmo em algo, desde que esse algo não seja marketing capitalista para uma transnacional sedenta por lucros, vendas e uma imagem cheia de compostura.
Bom, fica aí meu desabafo, pra fechar com chave de papelão de mendigo essa minha passagem tão brochante pelo supermercado do trabalho. Infelizmente, acho que vou ter que ficar metido nesta selva mais um tempinho, principalmente pelos trocados, então 2009 começa, para este pobre desempregado que vos fala, com a busca por mais um local de martírio onde eu vou me voluntariar – como aqueles malucos que se candidatam pra ir pra guerra. Tenho alguns ideais que seduzem meu desejo – trampar na Piauí, na Rolling Stone, na BRAVO! - mas não acho que tão cedo adentro esses santuários do Jornalismo Trimmassa. Se alguém souber de algum trampo suportável que me queira, me avisem! Ou então, daqui uns meses, se pá entro no Mestrado ou vou mendigar uma esmolinha na Rio Branco, ali pertinho da Crackolândia... “tem um real, tio?”
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