segunda-feira, 18 de abril de 2005

< a filosofia de woody >

"Há um mês cheguei realmente ao fundo do poço. Sabe, eu pensei, não quero mais continuar vivendo num universo sem Deus. Então peguei meu rifle, carreguei-o de munição e coloquei-o em minha testa. E eu pensei: vou me matar. Mas... e se eu estiver errado? E se houver mesmo um Deus? Quer dizer, apesar de tudo, ninguém sabe realmente a verdade. Não, não. 'Talvez' é insuficiente, eu quero a certeza ou nada. E eu lembro claramente de ouvir os tiquetaques do meu relógio, e eu estava lá, congelado, com a arma em minha testa, pensando se deveria dispará-la ou não. De repente, a arma disparou. Eu estava tão tenso que meu dedo acabou por apertar o gatilho inadvertidamente. Mas, como eu estava transpirando demais, o suor fez com que a arma escorregasse da minha testa - a bala não me acertou e deve ter ido parar em uma parede. Vizinhos bateram à minha porta querendo saber o que havia acontecido, e a casa se transformou num pandemônio. Eu não sabia o que dizer a eles, eu estava embaraçado e confuso, mil coisas passavam pela minha mente naquele momento, e eu só pensava em sair daquela casa, eu tinha que tomar ar fresco e esvaziar minha cabeça. E eu lembro muito claramente de ter andado pelas ruas a esmo, e eu andei, e andei, e andei. Eu não sabia direito o que ia pela minha cabeça, tudo soava violento e surreal para mim.

Caminhei por muito tempo pela Upper West Side. Horas se passaram, meus pés doíam e minha cabeça estava latejando. Eu tinha que descansar um pouco, então fui até um cinema. Nem vi o que estava sendo exibido, eu simplesmente precisava de uma hora para organizar meus pensamentos e voltar a encarar o mundo com uma perspectiva racional. Então fui até a platéia e sentei numa poltrona. E o filme em cartaz era um que eu já havia visto muitas vezes na vida, desde quando era pequeno. E eu sempre o amei. E então vi aquelas pessoas todas na tela, e comecei a mergulhar na história do filme.

Rá! Como fui pensar em me matar? Mas que idiotice! Olhe para todas essas pessoas na tela, como elas são engraçadas. E se o pior for verdade mesmo? E se Deus não existir? E se a gente viver uma vez só e ponto? Oras, você não quer fazer parte da experiência? Você sabe, ora diabos, nem tudo é uma droga. Eu tenho que parar de atormentar minha existência procurando respostas que não vou conseguir, e aproveitar a vida enquanto ela está aí. Depois... quem sabe? Talvez exista realmente algo, ninguém sabe realmente. Sim, eu sei que o 'talvez' é uma corda frágil para que a gente se agarre nela com unhas e dentes, mas é a melhor que nós temos, não? E então voltei à minha poltrona, e comecei a valorizar minha própria vida."
WOODY ALLEN, em Hannah e suas Irmãs.

outra clássica é aquela:
"Não há nada de errado com a vida eterna, desde que você esteja convenientemente vestido para ela."